Internação

Quem disse que comida de hospital precisa ser ruim? Culinária de ponta no tratamento pode antecipar alta.
06/11/2023 20h12

Antigamente, quando uma comida estava sem gosto as pessoas diziam que parecia “comida de hospital”. A expressão, no entanto, vem caindo em desuso à medida que as cozinhas hospitalares se transformaram em verdadeiros laboratórios que aliam temperos e sabores aos tratamentos médicos com o objetivo de fazer os pacientes se recuperarem melhor e mais rapidamente.

A rejeição aos alimentos durante a internação pode ter efeitos devastadores.  Uma pesquisa liderada pelo gastroenterologista Dan Waitzberg, professor da Faculdade de Medicina da USP, revisou 49 estudos sobre desnutrição hospitalar produzidos em 19 países. Os dados, divulgados pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (Braspen), mostram que a escassez de nutrientes atingiu a metade (de 40% a 60%) dos pacientes que dão entrada em hospitais da América Latina.

A desnutrição hospitalar impacta diretamente a taxa de infecções e más cicatrizações, eleva o tempo de internação e aumenta o risco de morte. É por isso que o nutricionista Adelino Vieira, supervisor de nutrição do Hospital DF Star, referência também por sua hotelaria e alimentação, passa o dia balanceando calorias, proteínas, fibras alimentares e micronutrientes (vitaminas e minerais).

– O paciente precisa saber que o que ele come impacta no tratamento e aceitar as modificações da sua alimentação como parte integrante desse processo. A alta oferta de proteínas influencia diretamente a recuperação, do início ao final do tratamento – ensina.

Adelino explica que na fase inicial da doença, o organismo acelera o metabolismo na tentativa de combater o mal, o que aumenta a demanda de aminoácidos. Além disso, há mais necessidade de proteínas de fase aguda e de células imunes. Num segundo momento, afirma o nutricionista, o maior aporte proteico se justifica pela tentativa de vencer a resistência anabólica e para minimizar perda de massa muscular, lesões de pele e infecções hospitalares.

– A alimentação adequada e em quantidade e qualidade nutricional mantém ou recupera o estado nutricional do paciente. A terapia nutricional bem aplicada reduz a morbidade e a mortalidade, refletindo em redução do tempo de internação e menores custos hospitalares – destaca.

Por outro lado, combinações de dietas modificadas e restrições múltiplas são como a receita do fracasso: a comida fica ruim, o paciente rejeita o prato, aumenta o déficit calórico-proteico e o quadro de saúde piora.

É por isso que Adelino gosta da ideia de tornar a experiência da internação prazerosa, dentro do possível, e isso pode começar pela visão de um prato bonito e, claro, pelo paladar.

Oncologia

Gastronomia hospitalar como a conduzida por Adelino não é exclusividade das grandes metrópoles nem dos hospitais de notória especialização. No interior de Goiás, a nutricionista Raphaela Albanez diz que a meta é o paciente deixar a obrigação de comer para esperar pelo almoço ou jantar como o ponto alto do dia de internação.

– Dieta pastosa não é mais sinônimo de todos os alimentos batidos no liquidificador, porque essa sopa tem sabor, cheiro e cor sempre iguais. Nos primeiros dias, o paciente até toma, até que ele passa a enjoar e recusar. Por que não servir cremes, purês, patês com alimentos combinados de forma a agradar o paladar?

Nutricionista da Unimed, empresa parceira do Saúde Caixa em Goiás, Raphaela conta que pacientes oncológicos, por exemplo, beneficiam-se da alimentação saudável. Além de deixá-los mais dispostos, a comida pode ser o melhor remédio para combater efeitos colaterais desgastantes, como os da quimioterapia ou radioterapia.

– Quem está sendo tratado de câncer recebe uma alimentação saudável e balanceada, mas quando o paciente apresenta sintomas relacionados ao tratamento, alteramos a dieta para contrapor esses efeitos

Uma dica importante é ficar longe de frutas e verduras com agrotóxicos, já que eles agem para iniciar, promover ou acelerar as mutações que geram tumores. Além dos orgânicos, sugere Raphaela, é aconselhável observar a época de colheita das safras, porque eles recebem menos agrotóxicos durante a maturação.

Os lanchinhos “contrabandeados” nas bolsas das visitas, apesar do carinho e do cuidado, podem ser perigosos: precisam estar de acordo com a dieta do paciente, serem frescos e, de preferência, preparados em casa.

– É bom evitar alimentos perecíveis como salgados, bolos, doces, pães. Mas se forem levados, melhor que não sejam comprados em bares, lanchonetes e restaurantes, pelo risco de expor a pessoa a uma infecção, por exemplo – alerta Raphaela. 

O Instituto Nacional do Câncer (Inca) aconselha os pacientes oncológicos a:

  • Manter uma rotina alimentar, respeitando os horários de realização das refeições. Evitar pular refeições e longos períodos em jejum.
  • Comer devagar e mastigar bem os alimentos.
  • Beber, no mínimo, 2 litros (ou 8 copos de 250ml) de água ou água aromatizada por dia. É importante observar os sinais de desidratação, como boca seca, lábio ressecado e intestino preso.
  • Incluir diariamente frutas, verduras e legumes na alimentação. Eles são ricos em nutrientes, como fibras, vitaminas e minerais, e vão contribuir para o bom funcionamento do intestino.
  • Excluir os alimentos ultraprocessados prontos para o consumo que não necessitam de preparo, como biscoitos recheados, embutidos, salgadinhos de pacote, refrigerantes, macarrão instantâneo, mistura para bolos, barra de cereal, refrigerantes, temperos prontos e produtos congelados.

 

 Por Milena Galdino