Alunos e professores fazem parte do Círculo da Paz, com foco na prevenção do bullying e outros tipos de conflito, no Centro de Ensino Fundamental 20, em Ceilândia (DF). Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

 

A palavra inglesa bullying, pela primeira vez, recebe uma definição oficial em língua portuguesa: sequência de episódios de violência física ou psicológica, intencionais e repetitivos, praticados em uma relação de desequilíbrio de poder entre as partes, causando prejuízos físicos, morais ou psicológicos às vítimas.

 

O assunto não é novo, mas voltou a ser debatido no Congresso Nacional a partir da aprovação, em março, do substitutivo do Senado ao Projeto de Lei da Câmara (PLC) 68/2013 (5.369/2009, na Casa de origem), que institui o Programa de Combate à Violência Sistemática (bullying).

 

A principal alteração no texto feita pelo Senado foi retirar a palavra “intimidação” e substituí-la por “violência”. Roberta Viegas, consultora de direitos humanos da Consultoria Legislativa do Senado (Conleg), lembra que a alteração foi proposital, porque a relatora na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), a ex-senadora Ana Rita, considerou na época que as condutas descritas no projeto “extrapolavam a mera intimidação”.

 

— O projeto dá ênfase nesta questão da violência, que é muito menos aceitável que a mera intimidação. Ele não tem o caráter penal, ele é realmente um programa educacional, criado para as escolas, para os educadores, mas é mais enfático nas situações descritas, como situações de violência — explica. A proposta também faz uma categorização sobre os diversos tipos de violência que poderão ser considerados bullying, desde verbal e moral até física e sexual.

 

Conceito

 

Ao todo, oito itens explicitam os atos que serão considerados violência sistemática. Para a presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Cleuza Repulho, o detalhamento será importante para o trabalho da comunidade escolar.

 

— Com o projeto, ficou bem mais claro e ficará muito mais fácil para as escolas lidarem com essa questão, já que agora você consegue definir muito bem como é que isso vai ser tratado e, principalmente, quais as consequências — destacou.

 

Outra prerrogativa do projeto de lei será o envio de relatórios anuais com ocorrências sobre a violência nos estabelecimentos de ensino. Cleuza informa que será um desafio para a Undime, entidade que congrega 5.570 secretários de Educação municipais.

 

A juíza Gláucia Foley defende que o diálogo dê lugar à violência nas escolas. Foto: Ana Volpe/Senado Federal

— Não é muito simples, até porque cada um vai entender de alguma forma a questão do bullying. Esse registro é importante, mas nós temos que ver o que será feito desses dados: vai ser só uma pesquisa? Nós temos a questão dos professores e a questão das famílias. Como lidar com esse contexto todo? Nas escolas as coisas afloram mais. Vamos conversar com os dirigentes e tirar uma decisão nas audiências públicas — disse.

 

O projeto foi enviado de volta à Câmara dos Deputados e está em análise na Comissão de Segurança Pública e Crime Organizado e, logo após, passará pelas Comissões de Educação e de Constituição e Justiça e de Cidadania e pelo Plenário daquela Casa. Se for aprovado, ainda deverá ser sancionado pela Presidência da República.

 

Projeto pedagógico

 

A titular do Juizado Especial Criminal de Taguatinga, Gláucia Falsarella Foley, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), vê com cautela a discussão do projeto na Comissão de Segurança Pública da Câmara. Para ela, o bullying não se trata de um crime passível de punição, mas sim de responsabilização.

 

— Eu acho que esse projeto, como um programa, um pacote de combate à violência, é muito bom nesse sentido, porque ele é pedagógico, ele traz essa previsão de responsabilização que não passa necessariamente por uma penalização, portanto, ele não tem nenhum caráter de direito penal. A matéria aqui não é de direito penal, porque não penaliza — frisou.

 

A juíza, que há 15 anos está à frente do Programa Justiça Comunitária — que atua na democratização do acesso à Justiça no Distrito Federal —, alerta sobre a escolha de um caminho mais fácil para resolver os problemas de conflitos no ambiente escolar.

 

— Eu tenho muito medo que, por oportunismo político e populismo criminal, a gente transforme algo tão sério que é a violência no ambiente escolar em mera penalização. Porque penalizar é a última das razões que uma sociedade, que um Estado tem para resolver um conflito — argumentou.

 

Marina Domingos


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