Cotas para mulheres vítimas de violência doméstica e familiar: a experiência do Senado Federal

A Diretora-Geral e a Coordenadora da Procuradoria Especial da Mulher no Senado apresentaram as experiências da Casa na proteção às mulheres vítimas de violência.
29/09/2021 12h13

Na segunda palestra do II Ciclo de Palestras do Legislativo promovido pelo Senado através do Instituto Legislativo Brasileiro (ILB), o programa Interlegis, o Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento da Câmara dos Deputados (CEFOR), e com o Programa de Interação Legislativa – Prolegis, também da Câmara, a Diretora-Geral do Senado, Ilana Trombka iniciou sua apresentação contando a história de Lia, uma moradora do Distrito Federal vítima de violência doméstica e familiar desde a infância. Ao buscar ajuda para sair do ciclo de agressões em que vivia, Lia descobriu o programa de assistência do Senado Federal que estabelece cotas para mulheres vítimas de violência doméstica e familiar. O Senado Federal possui, dentro de suas diretrizes, um plano que prevê a reserva de 2% das vagas nos contratos de terceirização de mão de obra para mulheres vítimas de violência. Atualmente, mais de 30 mulheres são beneficiadas por esse programa. “Essas mulheres não só conseguem ter a independência financeira que as estimulam a sair do ciclo da violência. Eu não quero dizer que basta que você tenha um emprego, ou que tenha um salário para você sair do ciclo da violência, porque isso não é verdade, infelizmente. A violência doméstica e familiar é um tipo muito democrático de arrancar os direitos das mulheres. Porque se assim não fosse, mulheres ricas não apanhavam, o que não é verdade”, afirmou Ilana.

O programa do Senado de ajuda às mulheres vítimas de violência

O programa do Senado foi estabelecido em 2016 em parceria com o Governo do Distrito Federal (GDF). Sempre que o Senado faz uma licitação de terceirização de mão de obra, a empresa que ganha tem que estabelecer um contato com a Secretaria da Mulher do Distrito Federal que encaminha à empresa os currículos das mulheres que buscam ajuda para sair do ciclo de violência. A cada três meses o GDF tem que dar um atesto pelo cumprimento da cota. Se a cota não estiver sendo cumprida, automaticamente o pagamento da empresa é glosado. “Essa é uma experiência que já está sendo adotada por muitas prefeituras e por outros órgãos da administração pública. É uma alegria saber que ela está sendo disseminada”, afirma Ilana.

Cota na Nova Lei de Licitações

Embora a experiência do Senado esteja sendo disseminada desde 2016, muitos gestores públicos não adotavam o programa por receio de questionamentos dos órgãos de controle, por não haver um amparo legal para o estabelecimento da cota nos contratos de terceirização. A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021), sancionada e publicada em 1º de abril de 20121, veio resolver esse problema incluindo em um de seus artigos a destinação de cotas nos contratos para mulheres vítimas de violência doméstica e familiar.

Mulheres que saíram do ciclo de violência

Ilana Trombka conta exemplos de mulheres que tiveram suas vidas completamente transformadas quando passaram a fazer parte do programa de cotas do Senado Federal, como a que passou a cantar enquanto trabalhava, porque sabia que o agressor não entraria no Senado para agredi-la, e a que, com o primeiro salário, pode presentear os filhos com um pacote de pipocas ou de figurinhas. “Pode ser que pra parte de nós, seja algo muito simplório. Mas, naquele momento representava a conquista de uma mãe de ter o direito de presentear um filho”, avalia Ilana. Além de representar o direito adquirido de poder presentear um filho, a inserção no mercado de trabalho também estimula o estudo, estimula a capacitação, estimula o desenvolvimento. “Noções que são tiradas da mulher quando ela está inserida no ciclo da violência. Porque quando se está nesse processo, o agressor tenta isolar a mulher. Então, a volta à sociedade, a volta ao mundo do trabalho, significa também a volta ao estado de coisas de normalidade, de rotina. O que não é possível quando a mulher está imersa num ambiente inseguro, amedrontador”, afirma Ilana Trombka.

Depois da adoção do programa de cotas para mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, o Senado fez um amplo trabalho de conscientização sobre o assédio moral, o assédio sexual e criação de ambientes livres de qualquer tipo de assédio. “Esse programa de cotas trouxe para dentro do Senado Federal a possibilidade que nós construíssemos um ambiente muito mais adequado.  Também tivemos que falar sobre o machismo, sobre a questão da cultura, sobre a questão da objetificação da mulher”, acrescentou Ilana.

O papel da Procuradoria Especial da Mulher

Na terceira palestra do dia, a Coordenadora da Procuradoria Especial da Mulher do Senado Federal, Isis Marra, apresentou as atribuições da Procuradoria e os resultados já obtidos desde a sua criação em 2013. Isis é formada em Comunicação Social e foi idealizadora do Projeto Pautas Femininas, iniciativa que traz ao debate temas como saúde da mulher, violência de gênero, trabalho em rede, e poder feminino. Isis Marra destacou a participação da bancada feminina no Senado no empenho em agilizar a tramitação de projetos que beneficiam as mulheres, e a disponibilização do serviço “Fale com o Senado” para receber denúncias de casos de violência contra as mulheres. “Nós somos um braço forte na rede de proteção às mulheres vítimas de violência”, afirma Isis Marra. A Procuradoria Especial da Mulher faz todo um trabalho de orientação das mulheres que buscam ajuda pelo serviço Fale com o Senado. Recebe as denúncias e as encaminhas aos órgãos competentes solicitando providências e/ou informações sobre o caso e acompanha os processos instaurados. Também coopera com organismos nacionais e internacionais, públicos e privados, como a ONU Mulheres, Femama e Recomeçar, na implementação de políticas para as mulheres. Isis Marra também apresentou um gráfico mostrando o avanço nas aprovações de projetos que beneficiam as mulheres a partir da criação da Procuradoria Especial da Mulher no Senado Federal. “Quando se tem uma bancada feminina forte, nós temos um cenário de aumento significativo na aprovação de projetos que beneficiam as mulheres. De 2013 pra cá, temos uma crescente aprovação de projetos que se transformaram em leis”, afirma Isis Marra.

 

O material utilizado nas apresentações está disponível para os inscritos no Ciclo na Plataforma Saberes.