08/09/2020

Machismo, divisão desigual de responsabilidades e pressão do sistema político ainda afastam mulheres das eleições

Pesquisa qualitativa do Instituto DataSenado, em parceria com o Senador Luiz do Carmo (MDB-GO), buscou investigar fatores que levam lideranças femininas de municípios do interior de Goiás a não se candidatarem. Dentre os motivos para a baixa representação feminina, as entrevistadas apontaram machismo, sobrecarga de atividades atribuídas às mulheres pela sociedade e empecilhos do sistema político-partidário.

A divisão desigual das responsabilidades tradicionalmente atribuídas às mulheres (que além de atuarem no mercado de trabalho, ainda acumulam a maior parte dos cuidados com a casa e com os filhos) faz com que algumas mulheres não se envolvam diretamente com as eleições. A atuação na política também pode gerar conflitos familiares pela dedicação de tempo, pela ausência das esposas e pelo desconforto com o destaque da mulher. Alguns cônjuges não conseguem lidar de forma amigável com a projeção feminina na comunidade. O conflito, segundo a pesquisa aponta, chega até mesmo a resultar em divórcio.

Outro fator que pesa na balança na hora de algumas entrevistadas optarem por concorrer ou não nas eleições é a experiência de outras mulheres que seguiram carreira política. Mulheres eleitas muitas vezes se sentem desestimuladas, porque são ‘abafadas’ pelo sistema político machista que retrai e diminui a eficácia de sua atuação. Vendo a dificuldade de mulheres que já enveredaram pela política, outras possíveis candidatas evitam se arriscar nas eleições com receio de não alcançarem seus objetivos e de não conseguirem realizar um bom trabalho durante o mandato.

A imagem negativa da política também tem seu peso. Algumas mulheres não querem atrelar suas reputações e sua participação social à atuação política e partidária, que pode ser questionada por parcelas da população. Elas preferem manter projetos e atividades como ações desinteressadas, sem objetivos políticos.

A pesquisa qualitativa do DataSenado realizou entrevistas em profundidade, numa amostra intencional de onze mulheres reconhecidas como lideranças locais pelas suas comunidades, mapeadas em 70 municípios de Goiás. Como resultado da amostragem, obteve-se perfil diversificado de entrevistadas, com diferentes estados civis, atividades profissionais, níveis de envolvimento político e tipos de atuação junto à comunidade. Na amostra, constam empresárias, educadoras, assistentes sociais, missionárias, presidentes de diretórios partidários e ex-secretárias municipais.

Trata-se de metodologia de pesquisa que permite conhecer com mais detalhe as motivações, experiências, reações e sentimentos do cotidiano das mulheres pesquisadas. A rigor os resultados são válidos apenas para o grupo pesquisado, mas indicam contextos e padrões que se repetem em nossa sociedade.

O universo de mulheres pesquisadas no interior de Goiás se justifica porque naquele contexto, ao mesmo tempo que se manifestam tendências modernizantes, atuam forças conservadoras. Para se ter ideia, nas últimas eleições, as chances de homens se elegerem em Goiás foram seis vezes maiores que as chances das mulheres.

A próxima fase da pesquisa qualitativa será com mulheres que se candidatarem efetivamente nas eleições de 2020, para conhecer suas experiências na prática da campanha e entender as dificuldades encontradas durante o processo eleitoral. Posteriormente, outra etapa de pesquisa verificará opiniões dos brasileiros sobre a atuação política de mulheres em pesquisa quantitativa com amostra nacional.

As eleições de 2018 resultaram em avanços na proporção de mulheres candidatas e de mulheres eleitas – um recorde em relação à representação feminina em eleições desde a redemocratização. Decisões recentes do STF e do TSE também têm possibilitado mais recursos para as candidaturas de mulheres. Por exemplo, a obrigatoriedade de distribuir recursos partidários e tempo de propaganda gratuita em rádio e TV de forma proporcional às candidaturas de mulheres. Para as eleições municipais, o efeito dessas decisões ainda não é conhecido, mas há expectativa de que as medidas tragam resultados favoráveis. Partidos têm até dia 16 de setembro para realizar convenções e enviar listas de candidatos à justiça eleitoral.

Como exemplo de medidas para promover a representação feminina, os partidos políticos podem acompanhar o cumprimento das cotas de candidaturas por sexo nas listas partidárias, garantir a destinação do fundo partidário para candidaturas femininas e a divisão do tempo de propaganda eleitoral gratuita de rádio e TV. Essas medidas evitarão questionamentos da distribuição dos recursos partidários junto à Justiça Eleitoral. Já as candidatas podem acompanhar a destinação dos recursos às candidaturas femininas e formalizar junto aos seus partidos a solicitação para que invistam de fato em suas candidaturas. São medidas já previstas na legislação eleitoral e partidária que poderão auxiliar na reversão do déficit de representação das mulheres.