Isenção do IR para ganhos de até R$ 5 mil pode pressionar inflação, alerta IFI
“Não haverá agravamento da situação fiscal que é muito delicada, mas a possibilidade de aumento do consumo, com a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil, pode se refletir na inflação.” O alerta é do diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente, Marcus Pestana, em entrevista à CNN Brasil Money.
O Projeto de Lei 1.087/25 aprovado, por unanimidade, na Câmara dos Deputados ainda depende de aprovação do Senado. O texto propõe isenção total de tributação de quem ganha entre R$2.900,00 e R$5.000,00, aqueles que recebem entre R$5.000,00 e R$7.000,00 serão parcialmente beneficiados, e o projeto prevê cobrança adicional para quem tem rendimento acima de R$600 mil ao ano. A expectativa seja aprovado rapidamente e possa valer já no próximo ano.
Leia os principais trechos da entrevista à jornalista Débora Oliveira.
Marcus, eu quero entender qual é essa estimativa do IFI sobre esse impacto fiscal dessa medida já em 2025 e, sobretudo, 2027. Por que é considerado uma "bomba-relógio"? não seria então suficiente a compensação aprovada? O que vocês, exatamente, veem nessa estimativa?
Na verdade, o governo tem procurado responder ao desequilíbrio fiscal, gasta mais do que arrecada, com sucessivas medidas de aumento de arrecadação, do aumento de impostos. Foi assim em 2023, com um pacote que tinha a tributação de fundos exclusivos, fundos off shore, e, recentemente, em 2025, a Medida Provisória que está tributando determinadas aplicações financeiras que eram isentas, ligadas ao financiamento do agronegócio e do setor imobiliário, tributando fintechs, bets e mudando algumas regras, inclusive para resgate de créditos tributários na mão de contribuintes.
Essas iniciativas, visavam ajuste fiscal, aumentar a receita para superar a situação deficitária. O do imposto de renda, não. Ele tem, não o foco em ajuste fiscal, mas em justiça tributária. Isentar aqueles setores de classe média baixa que pagam imposto de renda. Aqueles que ganham entre R$2.900,00 e R$5.000,00, serão totalmente isentos. Quem ganha entre R$5.000,00 e R$7.000,00 será parcialmente beneficiado. Então, a lógica desse projeto não visa nenhum impacto fiscal.
O que se espera, é que as compensações previstas, tributando os mais ricos, compense integralmente a renúncia fiscal, a abertura de mão de receitas que está sendo feita ao isentar as faixas de menor renda. Então, desse ponto de vista, esse projeto, ele é neutro, do ponto de vista fiscal. Ele não alimenta, ele não agrava o desequilíbrio fiscal.

O senhor acredita que analistas têm chamado essa medida de "bomba-relógio" em 2027?
Na verdade, eu li essas entrevistas, acompanhei esses pronunciamentos de alguns especialistas, particularmente aqui na CNN, mas eles se referem mais à situação global de desequilíbrio fiscal que é muito preocupante. O país vai fechar 2025 novamente no vermelho, com um déficit que a IFI estima em torno de 0,7% do PIB. E, ano que vem, o orçamento que está sendo apreciado pelo Congresso, enviado pelo Governo Federal, é cheio de interrogações. Uma série de receitas que são computadas ali, pra zerar o déficit que é a banda inferior da meta para 2026, são, ainda, interrogações, são incertezas. E há uma subestimação de despesas, particularmente na previdência e na assistência social.
Os parâmetros utilizados para o orçamento do ano que vem, são muito otimistas. O mercado aponta um crescimento do PIB em torno de 1,8%, a IFI aponta 1,7% e o governo arquitetou o orçamento com um crescimento mais otimista de 2,4%. A inflação também está subestimada; a estimativa geral é de uma inflação superior a 4%. O governo colocou o orçamento ancorado em uma inflação de 3,6% e isso repercute em todas aquelas despesas vinculadas ao salário mínimo.
A "bomba fiscal" é essa deterioração das finanças públicas federais que é uma marcha lenta, gradual. Não é uma crise aguda, como a Argentina, por exemplo. Não é um infarto, não é um AVC, é tipo a diabetes. Aquela doença que vai minando, lenta, gradualmente e que tende a comprometer a saúde do paciente. Então, quando se fala de bomba de efeito retardado, não está se referindo especificamente a esse projeto do imposto de renda, com objetivo de efeito neutro do ponto de vista fiscal. Ou seja: aquilo que se perder de receita para o governo, isentando totalmente aqueles que ganham até R$5.000,00 por mês e parcialmente aqueles que ganham de R$5.000,00 até R$7.000,00, isso será compensado com o aumento de tributação sobre os mais ricos. Não haverá agravamento da situação fiscal, que é muito delicada, com esse projeto.
E sobre essa questão também da pressão sobre inflação e juros? Porque a gente tem, também depois da aprovação, com unanimidade e trazendo essa também aprovação da compensação, começou-se a ampliar uma preocupação em relação a pressão inflacionária, do quanto que isso poderia representar um maior consumo e, portanto, maior pressão na inflação, forçando o Banco Central a ter que tomar medidas mais duras. O senhor concorda com esse ponto de vista? realmente, esse projeto tem um potencial inflacionário representativo?
O governo introduzir renda através de políticas públicas não é um problema quando o país está em depressão ou está com grande capacidade ociosa. Mas não é o caso da economia brasileira. O nosso nível de desemprego é o mais baixo da série histórica, a economia está aquecida. Então, quando você injeta renda e propicia um aumento do consumo, há uma pressão natural sobre os preços. Há que se acompanhar porque, como você está isentando exatamente faixas menores de renda, a propensão para o consumo é maior. Os mais ricos têm uma propensão maior a poupar. Nas faixas de baixa renda, há uma grande propensão ao consumo. Então, essa liberação de recursos, essa renda que será injetada, se transformará quase que absolutamente em consumo e isso certamente vai pressionar a inflação. Mas o Banco Central, independente, dentro do sistema de metas inflacionárias, que dá solidez ao nosso regime de política monetária, está atento, sustentado, há algum tempo, taxas de juro muito elevadas e a inflação já começou a ceder. É uma questão que será acompanhada pela autoridade monetária, a quem cabe defender o valor da moeda, quem cabe combater a inflação.