16/12/2016

28% dos policiais entrevistados acreditam que a violência pode ser justificada tanto pelo comportamento do homem quanto da mulher

Em trabalho inédito, o Instituto DataSenado, em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência (OMV) e o Alô Senado, realizou pesquisa em Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs) de todo o Brasil. Foram entrevistados 625 profissionais de 357 DEAMs brasileiras, resultando em um panorama das equipes, treinamento e dificuldades no cotidiano de trabalho nessas delegacias especializadas, que são uma das principais portas de socorro às mulheres em situação de violência. Quase metade das DEAMs pesquisadas (48%) atende exclusivamente mulheres enquanto 42% dividem atendimento com outros grupos, como crianças, adolescentes e pessoas idosas. Também 48% dessas delegacias têm mais de 10 anos de funcionamento e 79% contam com uma delegada ou um delegado exclusivo.

Delegacias insuficientes para a demanda local; falta de pessoal como principal dificuldade

Falta de pessoal foi a principal dificuldade apontada pelas pessoas entrevistadas (66%) para o atendimento às mulheres. Essa percepção é ainda mais forte entre delegadas e delegados (78%). Na região Norte, a falta de equipamentos para o trabalho foi apontada por mais de um quarto dos policiais entrevistados. Da amostra, 57% afirmaram que o número de delegacias é insuficiente para atender a demanda da população local. Este número chega a 86% na região Norte e a 63% na região Sul.

Integração com o restante da rede ainda é frágil

Em 87% das 357 delegacias que participaram da pesquisa, as pessoas entrevistadas afirmaram que há sistema informatizado para cadastro dos atendimentos. Em 66% das DEAMs pesquisadas, não há serviço de apoio psicológico para as mulheres em situação de violência e 69% afirmam haver sala reservada que garanta a privacidade das mulheres para o registro do boletim. Embora uma sugestão da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, quase a metade (45%) ainda não dispõe de salas de espera separadas para agressores e vítimas. A pesquisa revelou que em 38% das DEAMs o encaminhamento das vítimas é feito diretamente para o Serviço de Abrigamento Especializado (Casa-Abrigo) e em 24%, para o Centro Especializado de Atendimento a Mulheres (CEAM). Embora previstos na Política Nacional, em quase um quarto das delegacias foi relatado que não existe Casa-Abrigo na localidade e um sexto relatou a inexistência de CEAMs.

Policiais com alta escolarização e renda média superior a 5 salários mínimos

Sobre os policiais que trabalham no atendimento à mulher: 72% são mulheres, 70% têm de 30 a 49 anos e 83%, ensino superior completo. A maioria (58%) atua no atendimento às mulheres há cinco anos ou menos. A renda de 73% dos profissionais entrevistados é superior a cinco salários mínimos, sendo que quase um quarto de todas as pessoas entrevistadas possui remuneração maior que 10 salários mínimos.

Aproximadamente 40% dos policiais receberam treinamento há até dois anos

Quando questionadas sobre treinamento, aproximadamente a metade das pessoas entrevistadas (53%) relatou ter recebido treinamento específico para atender mulheres vítimas de violência. Dessas, 71% afirmaram ter recebido o último treinamento há dois anos ou menos. Isso significa que 38% do total da amostra receberam treinamento há dois anos ou menos, e 15% há mais de dois anos. Policiais da região Norte foram os que mais declararam ter recebido treinamento (62%) e os do Centro-Oeste, os que menos declararam ter recebido treinamento (46%).

Mulheres podem chegar a desistir de registrar ocorrência mesmo na delegacia

86% dos policiais apontaram que ainda ocorrem desistências no registro de ocorrência da violência. No entanto, a frequência com que as vítimas desistem de registrar a ocorrência é baixa: segundo 94% das pessoas entrevistadas, as desistências acontecem somente às vezes ou raramente. Sobre as causas que levam à desistência da denúncia, a dependência financeira e o medo do agressor alcançaram os percentuais mais expressivos, ficando em 37% e 24%, respectivamente. Entre as mulheres policiais, há uma maior percepção que as mulheres vítimas optam por não registrar o Boletim de Ocorrência por “acreditar ser a última vez [que a agressão ocorre]” (21%, em contraste com 11% entre os policiais homens).

Mais de ¼ das pessoas entrevistadas dizem que o comportamento da mulher contribui para justificar a violência

Embora 57% das pessoas entrevistadas tenham declarado que a violência contra as mulheres “não pode ser justificada”, 28% consideraram que a violência “pode ser justificada tanto pelo comportamento do homem quanto pelo comportamento da mulher”, e 13% afirmaram que “pode ser justificada somente pelo comportamento do homem”. Vale registrar também que a opção que culpabiliza parcialmente as mulheres chegou a 39% entre os policiais com mais de 20 anos de experiência no atendimento às mulheres em situação de violência.