Entrevista com Senador Raimundo Lira - Bloco 2


ENTREVISTADORA – O senhor está dizendo, então, que a Constituição manteve uma cultura paternalista, não estimulou o País a buscar o seu desenvolvimento, e o Estado, então, não incentiva a sociedade a buscar o crescimento. É isso?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Eu digo mais: não é nem um Estado paternalista; eu digo que é um Estado corporativista. As corporações tomaram conta do País. Então, você vê que o Brasil tem corporações mais fortes do que os Estados Unidos, corporações em que os membros ganham mais do que ganham nos Estados Unidos, têm muito mais privilégios, e nós não temos uma solução para esse problema.

ENTREVISTADORA – Do ponto de vista ainda da organização do Estado, Senador, e da distribuição da verba orçamentária, o senhor acha que isso também influencia e amarra o desenvolvimento do País? Porque há uma demanda permanente por reforma tributária. Isso é um complicador, Senador?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – É um complicador, porque, na década de 90, quando o Brasil implementou a reeleição para Presidente, Governador e Prefeitos, seguindo o modelo da Argentina de Menem e do Peru de Fujimori, duas pessoas, duas personalidades que não deveriam ser modelo, mas serviram de modelo naquele momento. Então, a reeleição foi uma coisa muito ruim para o País, não é?

Depois, nós tivemos aqui, pelo Supremo Tribunal Federal também, a aprovação da queda de cláusula de barreiras, que foi uma coisa muito ruim também para o País. Então, nós poderíamos ter hoje cinco ou seis ou sete partidos, não é? E, no entanto, temos trinta e tantos partidos, e isso não leva o Brasil a lugar nenhum. O Brasil não vai crescer, não vai sair do seu lugar enquanto essa questão partidária não for resolvida. Fizemos umas mudanças aqui, com muito sacrifício, mas mudanças de longo prazo, que jamais atingirão aquele patamar de 5% dos votos que a cláusula de barreiras preconizava.

ENTREVISTADORA – O senhor está defendendo uma reforma política, é isto?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Eu acho que a reforma política é absolutamente necessária. Com esse sistema político, o Brasil não vai crescer.

ENTREVISTADORA – O senhor acha que a Constituição realmente produziu um equilíbrio entre os Poderes?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Veja bem, eu acho que, como eu falei anteriormente, a Constituição teve o dom de criar essas grandes corporações que existem no País. Então, se o Brasil nunca resolver essa questão das corporações, ele não vai ter um crescimento efetivo, um crescimento de longo prazo. Ele vai, cresce dois, três anos, aí, cai. Cresce dois, três anos, e cai. Passam cinco, oito, dez... Então, eu acho que os recursos do País têm que ser direcionados, sobretudo, para a área de saúde, educação e segurança, entendeu? Então, não somente para atender às corporações que existem no País.

ENTREVISTADORA – Do ponto de vista do equilíbrio, ainda, entre os Poderes, o que a gente viu depois da Constituinte, e hoje muito fortemente, é um protagonismo, hoje, por exemplo, do Judiciário em relação aos demais Poderes. O Ministério Público cresceu muito, também, em atuação. O Ministério Público em particular, porque ganhou também e foi muito fortalecido na Constituinte, na Constituição. Como é que o senhor vê esse rearranjo que houve entre essas forças que aconteceram também muito em razão dessa nova ordem que a Constituição construiu?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Com relação ao Judiciário brasileiro, esse protagonismo que o Judiciário brasileiro tem feito com relação ao Ministério Público, eu não considero isso um fator negativo. Eu considero um fator positivo. Agora, o que eu considero negativo são corporações.

Então, o Brasil tem hoje quase 6 mil sindicatos. O sindicato é uma coisa boa? É uma coisa boa. É importante para o trabalhador? É importante para o trabalhador. E por que os Estados Unidos têm menos de 150? Por que a Inglaterra, que é a mãe, onde foram criados os sindicatos, tem menos de 150? Por quê? E o Brasil tem quase 6 mil?

Então, você vê que existe uma coisa errada aí nessa questão. Muito dinheiro está sendo carreado para essas instituições, e isso não deveria existir. Deveria haver situações em que esses sindicatos fossem em menor quantidade e mais concentrados.

ENTREVISTADORA – Senador, a gente ouve muito, sem entrar numa questão muito técnica, que o Brasil está quebrado. Existe uma realidade de muitos subsídios, a economia precisa de incentivos, naturalmente, e existe também uma necessidade de crescimento. O senhor, como empresário, sabe muito mais do que nós que, se a economia não funciona, não há educação, não há saúde, não há desenvolvimento, não há nada disso.

Uma reforma constitucional, limitada que seja, poderia ajudar em que sentido, em que pontos? Ou não se precisa de reforma, bastando leis ordinárias? Ou não passa pela Constituição mesmo, não passa pelo ordenamento jurídico? A Constituição ajuda nesse sentido, Senador?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Veja bem, a Constituição brasileira, de qualquer maneira, está sendo aperfeiçoada. Eu sou contra um novo processo constituinte, porque nós vamos entrar num imbróglio semelhante ao primeiro.

Hoje, existem, eu diria, centenas de correntes no País que iriam levar a Constituição a uma questão muito mais difícil da que hoje tem o País. Então, eu sou a favor de se continuarem fazendo reformas pontuais. Por exemplo: precisamos fazer a mãe de todas as reformas, que é a reforma política; essa reforma política tem que ser feita. Nós temos que acabar com a reeleição permitida pela Constituição Federal; temos que acabar com a reeleição. Temos que reduzir o número de partidos de forma significativa. Agora, acontece o seguinte: quem tem um partido na mão hoje? Os partidos, hoje, não estão mais na mão dos líderes, estão na mão dos donos dos partidos. Então, eles vão querer fazer essa reforma na Constituição? Não, não vão querer, mas é preciso fazê-la. São questões pontuais.

O sistema tributário precisa ser modificado, porque existem muitos subsídios na economia. Esse subsídio faz com que as pessoas paguem mais impostos. E aí eu quero dizer o seguinte: o que foi que aconteceu? Na proporção em que veio a reeleição, as eleições começaram a ficar mais caras, e os Governadores e o Presidente da República foram em cima dos contribuintes, tirando destes a sua capacidade de investir na economia, de gastar o dinheiro na economia. A maior participação, hoje, do bolo do PIB é exatamente o consumo. Então, na medida em que os contribuintes brasileiros começaram a perder a sua renda, a passar a sua renda para o Governo, a passar a sua renda para o Governo do Estado, para o Governo Federal, para os Governos municipais, o País perdeu a sua capacidade de crescer, de formar um PIB consistente, por conta dessa política que considero errada, equivocada, que foi consequência da reeleição no País.

ENTREVISTADORA – O senhor, agora, foi absolutamente preciso nos pontos que o senhor defende. Eu ia fazer a pergunta, e o senhor respondeu antes. Então, eu queria fazer uma pergunta mais leve para o senhor.

O senhor disse que, quando chegou aqui, viu um grupo de estudantes. Mas houve algum momento de grande emoção para o senhor na Constituinte ou de grande tristeza ou alguma lembrança memorável, referente a uma noite de votação? Haveria alguma coisa que o senhor pudesse contar para a gente dessa memória de Constituinte?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Eu disse o seguinte, que parecia um Congresso de estudantes, mas havia pessoas aqui de muito boa cabeça, pessoas que tinham sido Governadores, que tinham sido Deputados, que tinham essa cabeça no sentido de levar o País para um lugar seguro. Agora, o momento que posso dizer que mais me impressionou foi o referente exatamente à capacidade do Presidente da Constituinte, o Deputado Ulysses Guimarães. Ele cumpriu o seu papel de forma fenomenal, com uma capacidade de trabalho incrível. Portanto, acho que o Deputado Ulysses Guimarães representou o momento mais expressivo da elaboração da Constituição Federal.