Em Manaus, Pauta Feminina discute raízes do assédio

A dimensão social e cultural do assédio sexual e do assédio moral dominou o debate dirigido pela senadora Vanessa Grazziotin, na tarde desta sexta-feira, 16 de março, em Manaus.
16/03/2018 21h10

A dimensão social e cultural do assédio sexual e do assédio moral dominou o debate dirigido pela senadora Vanessa Grazziotin, na tarde desta sexta-feira, 16 de março, em Manaus.

A discussão sobre “Assédio Moral e Assédio Sexual: suas consequências na vida mulher”, no auditório do Ministério Público do Trabalho, levou ao Amazonas uma edição especial do Projeto Pauta Feminina, realizado mensalmente pela Procuradoria Especial da Mulher do Senado.

Segundo Vanessa, “muitas vezes o assédio começa de forma tão velada que a mulher acha que aquilo não terá consequência nenhuma e depois se agrava”. O problema afeta a todos, inclusive homens, vítimas também de assédio principalmente moral, mas afeta principalmente as mulheres, as jovens e as mais vulneráveis.

Patriarcado

A raiz do problema, para a senadora Vanessa, está no patriarcado, que explica também porque as mulheres têm ais escolaridade que os homens, mas ganham menos no geral; porque são preteridas ou têm dificuldades de ascender na carreira; e porque precisam de criar uma legislação – a Lei  13.104/2015, Lei do Feminicídio – para punir a morte de mulher pelo fato de ser mulher.

“Nós vivemos num mundo capitalista. O capitalismo explora a mão de obra, não tenham dúvida. Mas não pode ser dessa forma desigual. Isso acontece porque o mundo capitalista é dominado pelo patriarcado. É isso que explica a dominação da mulher no capitalismo. A mulher, no fundo, é penalizada pela função mais nobre da humanidade, que é a maternidade”, disse Vanessa.

Procuradora Especial da Mulher do Senado, senadora considera que mulheres têm grandes desafios políticos na conjuntura brasileira. “Infelizmente, nós mulheres não estamos num momento de “lutar por”, mas de “lutar contra”. Não estamos lutando por conquistar, mas para não perder conquistas”, lamentou.

Preconceitos

Fabíola Bessa, procuradora do Ministério Público do Trabalho, fez o papel de exceção que confirma a regra, no que diz respeito à discriminação que as mulheres sofrem por ter filhos.

Grávida de seis meses da quarta filha, que já se chama Sofia, ela lembrou os preconceitos que enfrentou quando aceitou trabalhar durante a semana em outra cidade, após dar à luz a trigêmeos.

“As pessoas me questionavam: – E seus filhos, quem vai cuidar deles? Eu lhes dizia: – Ora, o pai cuida. Ele sobreviverá!”, contou. “Tenho muitas amigas que acham que o pai não sabe fazer nada. Eles podem fazer tudo, do jeito deles, que a gente não precisa cobrar que seja igual ao nosso”, disse.

O assédio, segundo a procuradora, se materializa numa aflição que não tem explicação.  “Acontece no Ministério Público do Trabalho? O assédio acontece onde há pessoas e onde há gestores que não têm uma visão humanística e solidária”, disse.

Para ela, o primeiro caminho é prevenir, por meio de códigos de ética, de abertura de canais de ouvidoria e de corregedoria; e, depois, punir a conduta.

PLC 4/2016

O Juiz Ben-Hur Viza, do Tribunal de Justiça do distrito Federal e Territórios (TJDFT), idealizador e um coordenadores do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Distrito Federal, inaugurado em 2012, saudou a importância da aprovação do PLC 4/2016, relatado pela senadora Vanessa, no dia 7 de março.

“A criminalização da desobediência às medidas protetivas de urgência é uma ferramenta que dará um impulso muito grande ao combate da violência contra a mulher”, destacou.

Iniciativas

Ao abordar o que tem feito no Distrito Federal para enfrentar o assédio sexual e o assédio moral, o juiz Ben-Hur falou sobre a experiência de trabalhar com homens autores de violência, com metroviários que discutem como coibir o assédio no transporte e o projeto Maria da Penha Vai às Escolas, que, diferente dos anteriores, tem uma lógica de trabalhar primeiro com as crianças.

“Ao trabalhar só com o público adulto que enfrenta um problema, a gente corre o perigo de ‘enxugar o gelo’. Quando a prioriza o público que vai se tornar adulto, tem chance maior de mudar a cultura. Dentro de três gerações, a última geração que envelheceu não estará mais repetindo modelos terríveis de nossa sociedade”, argumentou.

Papéis

O projeto Maria da Penha Vai às Escolas leva às crianças  uma informação sobre gênero – categoria que a Lei 11.340/2006 introduziu –, focando a importância do gênero na definição do papel social do homem e da mulher e também na violência contra a mulher.

“Quando nós vamos num aniversário, o que levamos? Bonequinha (para a menina apender a lidar com neném), panelinha (para a aprender a cozinhar para o marido marido), ferrinho de passar roupa, vassourinha (para ela aprender a cuidar de casa)”, disse o Juiz.

Para ele, tudo isso contribui para uma socialização baseada em gênero que leva a educar as meninas para assimilar que seui espaço é “em casa” e que dá aos meninos a noção de que “são do mundo”.

Presenças

Também abordaram o tema: Gláucia Soares, presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB-AM; Isis Tavares, presidente da Central de Trabalhadores do Brasil; Laíde Barros, coordenadora Estadual da União Brasileira de Mulheres (UBM-AM); e Dora Brasil, presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher (CEDIM-AM).

Estiveram presentes, a deputada Alessandra Campello (MDB-AM), a vereadora Vanessa Gonçalves (PROS-AM), do município de Parintins, a ex-vereadora Lúcia Antony, presidente do PCdoB em Manaus, Luciana Verçosa, da Secretaria Municipal da Mulher, e um grande público que lotou o auditório do Ministério Público do Trabalho.