Novo Fundeb será maior e terá caráter permanente

Da Redação | 25/08/2020, 20h20

O novo Fundeb, aprovado por unanimidade nesta terça-feira (25) por 79 senadores em dois turnos de votação, torna permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, aumenta seu alcance e amplia em 13 pontos percentuais os recursos destinados ao setor pela União. O texto será promulgado pelo Congresso Nacional nesta quarta-feira (26), às 11h, e se tornará a Emenda 108 da Constituição.

A PEC 26/2020 começou a tramitar pela Câmara dos Deputados como PEC 15/2015, tendo como primeira signatária a então deputada federal Raquel Muniz (PSD-MG) e como relatora a deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO). No Senado, a matéria foi relatada pelo senador Flávio Arns (Rede-PR) e foi aprovada da forma como veio da Câmara, com o acréscimo de apenas uma emenda supressiva.

O texto foi fruto de consenso entre os parlamentares e vem sendo debatido de forma sistemática desde o início de 2019. Foram apresentadas 9 emendas em tempo regimental no Senado, sendo que três foram retiradas. Todos os partidos apoiaram a aprovação da PEC no Senado.

Em 2019, o Fundeb distribuiu R$ 156,3 bilhões para a rede pública. Atualmente, garante dois terços dos recursos que os municípios investem em educação. Cerca de 90% dos recursos do Fundeb vêm de impostos coletados nos âmbitos estadual e municipal, e os outros 10% vêm do governo federal. Os repasses da União não entram no teto de gastos (Emenda Constitucional 95, de 2016).

A PEC torna permanente o Fundeb, que, pela legislação atual, acabaria no fim deste ano. Também aumenta dos atuais 10% para 23% a participação da União no Fundo. Essa participação será elevada de forma gradual: em 2021 começará com 12%; passando para 15% em 2022; 17% em 2023; 19% em 2024; 21% em 2025; e 23% em 2026.

Os valores alocados pelo governo federal continuarão a ser distribuídos para os entes federativos que não alcançarem o valor anual mínimo aplicado por aluno na educação. Da mesma forma, o fundo continuará recebendo o equivalente a 20% dos impostos municipais e estaduais e das transferências constitucionais de parte dos tributos federais.

Os entes federativos deverão usar os recursos do Fundeb exclusivamente em sua atuação prioritária definida na Constituição: os municípios cuidam da educação infantil e do ensino fundamental; e os estados, do ensino fundamental e médio. Assim, o dinheiro não poderá ser aplicado, por exemplo, em universidades, pois o ensino superior é de responsabilidade prioritária do governo federal.

Atual distribuição de recursos

Atualmente, o valor mínimo nacionalmente definido no Fundeb (valor anual por aluno – VAA) é calculado da seguinte forma: primeiro é estipulado o montante da complementação da União. O valor mínimo atual é de 10% do total dos fundos — a União tem repassado nos últimos anos apenas o valor mínimo.

Esse dinheiro é primeiramente destinado ao fundo de menor valor per capita até que esse valor se iguale ao de segundo menor valor; o restante da verba federal é, em seguida, destinado a esses dois fundos até que os valores se igualem ao terceiro menor fundo, e assim por diante – até o esgotamento dos recursos. 

O VAA para 2020 foi estipulado em R$ 3.643,16. Essa fórmula de cálculo fez com que 9 estados recebessem complementação: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco e Piauí.

Modelo híbrido de distribuição

A PEC estabelece um modelo híbrido de distribuição entre os fundos. Os primeiros 10 pontos percentuais do dinheiro da União serão distribuídos como no cálculo atual de distribuição.

Outros 10,5 pontos percentuais da participação da União serão destinados às redes de ensino que não alcançarem um nível de investimento mínimo por aluno, considerando-se no cálculo desse valor mínimo não apenas os recursos do Fundeb (único critério existente hoje) mas a disponibilidade total de recursos vinculados à educação na respectiva rede.

Desses 10 pontos percentuais, pelo menos 5 pontos deverão ser destinados à educação básica — se for o caso, inclusive para escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas. A medida terá grande impacto, já que a educação infantil concentra a maior demanda não atendida pela rede pública no país.

Critérios de qualidade

Os outros 2,5 pontos percentuais de participação da União (totalizando os 23% da complementação deste ente) serão distribuídos às redes públicas que melhorarem a gestão educacional e seus indicadores de atendimento escolar e aprendizagem, com redução das desigualdades. Esses critérios ainda serão regulamentados por lei.

Melhoria em infraestrutura

A PEC prevê que, dentro da nova parcela da complementação federal, 15% desse dinheiro seja destinado para despesas de capital - para investimentos em infraestrutura, melhoria de equipamentos e instalações - e não somente gasto com despesas correntes.

Segundo dados do Censo Escolar 2018, 12% das escolas da rede pública não têm banheiro no prédio; 33% não têm internet; 31% não têm abastecimento de água potável; 58% não têm coleta e tratamento de esgoto; 68% não têm bibliotecas; e 67% não possuem quadra de esportes.

O Custo Aluno-Qualidade (CAQ), constante no Plano Nacional de Educação, será considerado como parâmetro para o padrão mínimo de qualidade do ensino. O relator, senador Flávio Arns, defende a adoção do CAQ como parâmetro: “Trata-se de inovação consentânea com os debates mais avançados em matéria de financiamento da educação, segundo os quais o critério básico para alocar os recursos deve ser o da garantia dos insumos indispensáveis ao processo de ensino-aprendizagem”, diz.

Valorização dos profissionais

Ainda dentro da nova parcela de complementação de recursos da União, no mínimo outros 70% serão destinados ao pagamento de salários dos profissionais da educação. Atualmente esse piso é de 60% e beneficia apenas professores.  

Flávio Arns lembra que atualmente quase todas as redes de ensino já destinam esses 70% do fundo para os salários. A intenção da norma é preservar essa destinação.

Fundos estaduais

A PEC prevê ainda que os entes federados, uma vez recebida a complementação da União, devam redistribuir os recursos entre suas unidades de ensino, para diminuir desigualdades no âmbito de uma mesma rede de ensino.

ICMS

A PEC também prevê que os estados aprovem legislação, no prazo de dois anos a partir de sua promulgação, para distribuir entre os municípios parte dos recursos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) com base em indicadores de melhoria nos resultados de aprendizagem e de aumento da equidade.

Atualmente os estados repassam parte do ICMS arrecadado (25%) às cidades. A PEC diminui o total repassado proporcionalmente às operações realizadas no território de cada município e aumenta o mesmo tanto no repasse que nova lei estadual deverá vincular às melhorias na educação.

Alterações na Constituição

A proposta altera ainda o artigo da Constituição que define os princípios do ensino, incluindo a garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida. Também foram incluídos os termos “a qualidade e a equidade” como metas a serem perseguidas pelos sistemas de ensino, atuando em regime de colaboração.

Relatório

Flávio Arns rejeitou as emendas apresentadas no Senado ao alegar que elas podem ser abarcadas na regulamentação posterior da matéria (a chamada lei do Fundeb) e também para que o texto não tenha que voltar para análise da Câmara. “Tendo em vista que muitos desses temas suscitados serão mais adequadamente tratados na lei de regulamentação, e considerando também o risco de promovermos alterações que possam descaracterizar algumas das medidas veiculadas pela PEC, redundando no retorno da matéria à Casa iniciadora — com risco de expiração do prazo do atual Fundeb e prejuízo a todo o sistema público de ensino básico —, nos manifestamos pela manutenção do texto aprovado na Câmara dos Deputados”, afirmou.

Ele só acrescentou uma emenda de sua própria autoria ao texto excluindo o inciso 4 do artigo art. 212-A da Constituição (artigo novo proposto pela PEC). O texto permitia que parcela dos recursos da complementação da União ao Fundeb fosse dirigida a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas. Flávio Arns alega que tal distribuição já consta no artigo 213 da Constituição.  

Para ele, os limites e o alcance dessa questão devem ser definidos na lei do Fundeb, sem a necessidade de qualquer acréscimo sobre esse tema no texto constitucional. “Assim, evitamos insegurança jurídica quanto à possibilidade de interpretações diversas sobre o assunto, e prevenimos que haja dispositivo prescindível na Carta Magna”, defendeu.

Importância

O senador ressalta a atual importância do Fundeb: “Trata-se de um dos principais instrumentos de redistribuição de recursos do país, realocando valores no âmbito de cada estado, entre o governo estadual e as prefeituras, para tornar o sistema educacional mais equitativo e menos desigual”.

O Fundeb atualmente representa 63% do investimento público em educação básica. Ele diz que, se o fundo não existisse, estima-se que os valores mínimos de aplicação em educação girariam em torno de R$ 500 por aluno/ano nos municípios mais pobres do Brasil. Com o Fundeb atual esse investimento é de cerca de R$ 3.600.

Com a PEC, estima-se que esse valor aumente cerca de 50% até 2026, passando para cerca de R$ 5.500.

De acordo com Arns, o Fundeb, cujo principal mérito já é a distribuição regional de recursos, será ainda mais equitativo com a PEC: “Esse modelo permitirá maior capilaridade na distribuição dos recursos, fazendo com que eles cheguem às redes de ensino que mais necessitam, independentemente do estado da Federação onde elas se encontrem”.

Ele cita estudo realizado pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados que aponta que a adoção desse novo critério trará aumento estimado, até 2026, de 54% das redes de ensino beneficiadas pela complementação da União (que passarão a ser 2.618 em comparação com cerca de 1.700 redes hoje atendidas). O número de alunos contemplados pelo aporte federal subirá para 17,5 milhões. Essa ampliação da cobertura beneficiará estudantes de redes de 24 estados da Federação, 15 a mais do que os 9 estados abarcados atualmente.

De acordo com o senador, o “novo Fundeb” traz a inovação “de criar um mecanismo de distribuição dos recursos já vinculados à educação, a partir do número de matrículas efetivadas na rede estadual e nas redes municipais, de modo que o recurso vá para onde o aluno está”.

 — Cuidemos de nossas crianças, cuidemos de nosso futuro, instituindo um novo Fundeb permanente, financeiramente robusto e com um compromisso solidário dos três níveis federativos no sentido de garantir educação de qualidade a todos — disse Arns.

Financiamento

A cesta de recursos do Fundeb é composta de 20% das receitas provenientes das seguintes fontes, as quais foram mantidas pela PEC: Fundo de Participação dos Estados (FPE); Fundo de Participação dos Municípios (FPM); Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS); Imposto sobre Produtos Industrializados, proporcional às exportações (IPIexp); Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD); Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA); e cota-parte de 50% do Imposto Territorial Rural (ITR) devida aos municípios.

Ficam de fora do fundo 5% dos referidos impostos e transferências, embora continuem vinculados à educação, além de 25% dos impostos municipais próprios (Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e Imposto sobre Serviços (ISS), bem como o Imposto de Renda retido na fonte de servidores públicos estaduais e municipais.

Proposta de Emenda à Constituição

Uma PEC pode ser apresentada pelo presidente da República, por um terço dos deputados federais ou dos senadores ou por mais da metade das assembleias legislativas, desde que cada uma delas se manifeste pela maioria relativa de seus componentes. Não podem ser apresentadas PECs para suprimir as chamadas cláusulas pétreas da Constituição (forma federativa de Estado; voto direto, secreto, universal e periódico; separação dos poderes e direitos e garantias individuais).

A PEC é discutida e votada em dois turnos, em cada Casa do Congresso, e é aprovada se obtiver, na Câmara e no Senado, três quintos dos votos dos deputados (308) e dos senadores (49) em cada turno.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)