Aprovado projeto que estabelece critérios de tributação para combater concorrência desleal e sonegação

Da Redação | 19/12/2018, 18h17

A Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC) aprovou, nesta quarta-feira (19), o Projeto de Lei do Senado (PLS) 284/2017-complementar que estabelece critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, combater a sonegação, a inadimplência e a adulteração de produtos.

A proposta, aprovada pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) no início de novembro, busca punir o chamado devedor contumaz, que deixa de pagar tributos para obter vantagem concorrencial.

Apresentado pela senadora Ana Amélia (PP-RS), o projeto de lei complementar regulamenta o artigo 146-A da Constituição e tem como principal foco combater fraudes nos setores de combustíveis, cigarros e bebidas. O texto em análise é o mesmo substitutivo do relator Ricardo Ferraço (PSDB-ES) já aprovado na CAE, porém com a inclusão de alguns aprimoramentos colhidos em audiência pública realizada no início deste mês na CTFC.

Durante a discussão, Ferraço considerou essencial a aprovação da matéria para melhorar o ambiente de negócios no país.

— Há 15 anos que essa proposta foi apresentada, há 15 anos que se tenta essa regulamentação, uma regulamentação importante para aqueles que exercem a sua atividade tendo como premissa, sobretudo, os princípios éticos da igualdade de oportunidade, do equilíbrio concorrencial, e assim por diante. Portanto essa é uma proposta que dialoga com o mais elevado e absoluto interesse público não apenas da União, mas dos estados subnacionais — disse ele.

Divergência

Contrário à proposta, o senador Ciro Nogueira (PP-PI) manifestou sua preocupação com a possibilidade de criação de insegurança jurídica para as empresas por não haver, em sua visão, número suficiente de pessoas habilitadas para realizar a análise sobre devedor contumaz.

Ferraço, contraditando a avaliação de Ciro, observou que a principal causa de insegurança jurídica é a ausência de um marco nacional sobre o tema, que tem permitido aos estados editarem leis nas quais muitas vezes não observam os direitos dos contribuintes.

De acordo com a autora da proposta, a concorrência desleal pode repercutir nos preços de produtos e serviços e desequilibrar o mercado. Segundo ela, a prática é visível no setor de combustíveis.

— A utilização de liminares, por empresas detidas por “laranjas”, além de outros expedientes, provocou o ingresso no mercado de inúmeros players que se valeram de medidas aparentemente legais, mas cujo objetivo era ilícito: concorrer deslealmente no mercado. Mais recentemente, empresas têm se valido do não pagamento sistemático de tributos para fraudar a concorrência. Estima-se que apenas nos setores de cigarros e combustíveis, sujeitos a cargas tributárias elevadas em comparação com outros produtos, cerca de R$ 8 bilhões sejam sonegados anualmente — argumenta Ana Amélia.

O projeto permite que as administrações tributárias dos entes federados controlem os procedimentos de caráter tributário adotados pelos contribuintes que possam repercutir nos preços de produtos e serviços, desequilibrando o mercado. De acordo com a proposta, União, estados, Distrito Federal e municípios poderão estabelecer, por lei especifica, critérios especiais para o adequado cumprimento das obrigações tributárias.

Entre as medidas, estão a adoção de alíquota específica sobre produtos e o controle especial de recolhimento de impostos.

Além disso, as administrações públicas poderão antecipar ou postergar o fato gerador de tributos e concentrar a incidência de impostos em determinadas fases do ciclo econômico. Outras iniciativas para coibir as fraudes e combater a sonegação são a manutenção de fiscalização ininterrupta no estabelecimento de sujeito passivo; instalação compulsória de equipamentos de controle de produção, comercialização e estoque; e adoção de regime de estimativa.

Segundo Ana Amélia, os meios tradicionais de controle fiscal têm se mostrado insuficientes para combater estruturas empresariais organizadas para sonegar tributos. Ela ressalta que as medidas tomadas para proteger a livre concorrência devem ser proporcionais de forma a impedir o uso indiscriminado pelas autoridades fiscais.

Ressalta que a aprovação do projeto ensejará que não somente a União, como também os estados, o Distrito Federal e os municípios editem, no âmbito dos respectivos territórios, medidas que reforcem a capacidade de fiscalização e arrecadação tributária, de forma a combater efetivamente as estruturas empresariais que têm na inadimplência sistemática e consciente a sua principal vantagem concorrencial.

Evasão fiscal

Além de combustíveis, cigarros e bebidas, ficam sujeitos ao regime especial setores em que a estrutura da cadeia de produção ou comercialização favoreça a evasão fiscal, mediante requerimento de entidade representativa ou de órgão com competência para defesa da concorrência, desde que atendidas algumas condições.

Os critérios especiais de tributação podem ser adotados isolada ou conjuntamente. Mas não se aplicam a tributos incidentes sobre a renda, o lucro, a movimentação financeira ou ao patrimônio. Durante a vigência do regime diferenciado, o poder público pode suspender ou até mesmo cancelar o cadastro da empresa, caso se comprove que a pessoa jurídica foi constituída especificamente para a prática de fraude fiscal estruturada.

Também ficam sujeitas ao cancelamento de registro as empresas constituídas para produção, comercialização ou estocagem de mercadoria roubada, furtada, falsificada, adulterada ou em desconformidade com os padrões estabelecidos pelo agente regulador. Ou ainda, as pessoas jurídicas que utilizam insumos, comercializam ou estocam mercadorias objeto de contrabando ou descaminho.

Intimação

O relator, senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), recomendou a aprovação do projeto na forma do substitutivo apresentado. Entre as mudanças incluídas neste parecer está a exigência de que a aplicação do regime diferenciado deve ser precedida de intimação do sujeito passivo para o exercício do direito de defesa, em prazo não inferior a 30 dias.

Ele também eliminou a possibilidade de aplicação dos critérios previstos na lei complementar como meio de compelir devedores, sejam eles eventuais ou reiterados, a pagar tributos, quando disso não resultar efeitos danosos para a concorrência.

“O devedor (eventual e reiterado) atuam licitamente no mercado e devem se submeter ao procedimento normal de cobrança de dívidas, não podendo, em princípio, sofrer qualquer restrição à liberdade de iniciativa tendente a forçá-los a cumprir as suas obrigações. Absolutamente distinta é a situação do terceiro tipo de devedor, o contumaz. Este deve ser impedido de atuar “, defende.

Após a realização de audiência pública na CTFC, Ferraço incorporou ao substitutivo sugestão feita pela Receita Federal e pela Sefaz-SP, com o objetivo de autorizar a administração tributária a identificar setores com indícios de desequilíbrio concorrencial. Outra alteração foi a inclusão do setor de bebidas alcoólicas em geral, e não apenas de cervejas entre os passíveis de haver desequilíbrio concorrencial.

O projeto segue agora para votação em Plenário.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)