Governadores e prefeitos pediram novo pacto federativo

Patrícia Oliveira | 28/12/2015, 13h59

Receber novos encargos sem o dinheiro correspondente foi a principal queixa apresentada por gestores municipais e estaduais em debate sobre o pacto federativo com os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Eduardo Cunha, realizado na metade deste ano. Os administradores pediram uma repactuação das obrigações orçamentárias, criticaram a União por reter a maior parte dos impostos recolhidos e reduzir a contrapartida no cumprimento dos serviços demandados pela população.

As discussões sobre o pacto federativo movimentaram 2015 no Senado. Na busca de um ajuste das relações entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, em maio foi criada uma comissão especial para tratar do tema, presidida pelo senador Walter Pinheiro (PT-BA). Em seguida, dois grandes encontros com governadores e prefeitos guiaram a pauta do Legislativo com temas urgentes relacionados às questões financeiras e tributárias, repasses de recursos e atribuições nos campos da saúde, educação, saneamento e segurança pública, entre outros. Até dezembro mais de uma dezena de projetos foram aprovados em busca de uma repartição mais justa de recursos e de obrigações entre os entes federados.

Primeiros passos

Sistematizadas pela Comissão Especial do Pacto Federativo as proposições ganharam prioridade de tramitação nas duas Casas legislativas. No final de 2015, os projetos relacionados ao equilíbrio fiscal entre as entidades da Federação passaram a integrar também a pauta da Agenda Brasil, um conjunto de propostas para enfrentar a crise e retomar o crescimento do país.

Os primeiros avanços ocorreram com a aprovação pelo Senado da proposta de emenda à Constituição (PEC) 84/2015, da senadora Ana Amélia (PP-RS), que proíbe a União de criar despesa para estados e municípios sem prever os recursos para seu custeio.

O Congresso Nacional ainda promulgou emenda constitucional garantindo a destinação preferencial para o Nordeste e o Centro-Oeste de recursos federais a projetos de irrigação. A mudança trazida pela PEC 78/2013 prorroga por mais 15 anos a obrigação de a União aplicar 20% dos recursos destinados à irrigação no Centro-Oeste e outros 50%, no Nordeste, de preferência no semiárido.

Também já aprovado e promulgado, o Projeto de Resolução do Senado (PRS) 26/2015 garantirá receita extra para estados e municípios ao definir que o recebimento antecipado de valores inscritos na dívida ativa não pode ser considerado operação de crédito e nem representará um descumprimento à Lei de Responsabilidade Fiscal. A proposta, da senadora Regina Sousa (PT-PI), prevê que a receita obtida nessas operações se destine exclusivamente à capitalização de fundos de previdência ou à amortização extraordinária de dívidas com a União.

O Plenário do Senado aprovou por unanimidade, em setembro, o projeto de lei  (PLS) 525/2015, que prevê a compensação dos municípios geradores de energia elétrica com aumento do valor da arrecadação do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

De autoria do senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), relator da Comissão do Pacto Federativo, o objetivo é compensar a perda de receita dos municípios com usinas hidrelétricas instaladas e que foram afetados pela Medida Provisória (MP) 579/2012, que reduziu as tarifas de energia elétrica vigentes na época.

Comércio eletrônico

Integrou a lista das proposições do pacto federativo a PEC 07/2015, que deu origem à Emenda à Constitucional 87, para garantir a repartição do ICMS não presencial — pela internet ou por telefone — entre os estados comprador e vendedor.

A emenda corrige uma distorção que permitia o recolhimento de todo o imposto somente pelo estado onde fica a sede da loja virtual. O estado de residência do comprador, ou de destino da mercadoria, não tinha qualquer participação no imposto cobrado. Assim, eram beneficiados principalmente os entes da Federação mais desenvolvidos, como São Paulo.

O texto promulgado é o que foi modificado pela Câmara dos Deputados, tornando gradual a alteração nas alíquotas e atribuindo aos estados de destino 100% da diferença de alíquotas apenas em 2019.

Paralelamente aos esforços por justiça tributária, foram aprovados outros projetos. Um deles é o PLS 425/2014 que prorroga, de forma escalonada até 2021, o prazo para as cidades se adaptarem à Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) e extinguirem os “lixões”. O limite previsto inicialmente era até agosto de 2014.

Em setembro foi aprovada a PEC 33/2014, com relatoria de Walter Pinheiro, que inclui a segurança pública entre as obrigações de competência comum entre a União, estados, Distrito Federal e municípios. Pinheiro disse que a PEC busca uma convergência de ações entre os entes federados. Ele defendeu o sistema nacional de dados criminais como forma de facilitar a circulação de informações de segurança, permitindo ações mais tempestivas.

Em novembro, senadores e deputados derrubaram o veto da presidente Dilma Rousseff ao prazo de 15 dias para que os bancos transfiram para estados e municípios o dinheiro referente a depósitos judiciais e administrativos.

O Veto 33 incidiu sobre a Lei Complementar 151, que permite a estados e municípios usarem até 70% dos depósitos judiciais e administrativos como receita.

ISS

Ainda tramita na CCJ a PEC 72/2015, que muda as regras da arrecadação do Imposto sobre Serviços (ISS). A PEC abre caminho para que lei complementar institua regime único de arrecadação do ISS sobre atividades relacionadas a cartões de crédito ou débito, a arrendamentos mercantis e a planos de saúde que se cumpram por meio de serviços de terceiros.

O imposto será devido ao município de domicílio do usuário, terá recolhimento unificado e centralizado na União e será distribuído imediatamente aos respectivos municípios.

Já o PLS 501/2013 — Complementar, que explicita a incidência do ISS nos serviços de monitoramento e rastreamento de veículos, foi aprovado no final deste ano.

ICMS

A reforma do ICMS pouco avançou e ainda é um dos maiores desafios do pacto federativo. A medida provisória 683/2015 criou dois fundos destinados a compensar os estados pelas mudanças no imposto, mas a MP perdeu a eficácia com o fim do prazo para sua votação no Congresso e aguarda apresentação de projeto de decreto legislativo.

A iniciativa, de acordo com o Executivo, foi para facilitar o comércio interestadual e estimular o investimento produtivo e o desenvolvimento regional. Articuladas com essa medida, aguardam votação no Senado duas propostas da Comissão do Pacto Federativo: o PLS 375/2015, que cria uma política de desenvolvimento regional para reduzir as desigualdades entre regiões e fortalecer a coesão social, econômica, política e territorial do país e o Projeto de Resolução do Senado (PRS) 1/2013, que fixa novas alíquotas para acabar com a guerra fiscal. As matérias dependem agora das mudanças previstas na economia em 2016 com as recentes reformas promovidas pelo governo federal.

Enquanto isso, o Plenário do Senado já aprovou calendário especial para a tramitação da PEC 154/2015, que destina parte do que for arrecadado com a repatriação de recursos para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR).

Pela proposta, do senador Walter Pinheiro, a receita virá da aplicação de Imposto de Renda e multa sobre bens e ativos de origem lícita mantidos no exterior que sejam regularizados com a Receita Federal, como previsto no Projeto de Lei da Câmara (PLC) 186/2015 — projeto também relatado por Pinheiro e aprovado no Senado em dezembro de 2015.

O FNDR deverá receber, dessa e de outras fontes, pelo menos R$ 3 bilhões por ano durante os primeiros cinco anos. Para outro fundo, o de auxílio à convergência do ICMS, deverão ser destinados R$ 1,5 bilhão anualmente em seus oito anos de vigência.

Ainda de acordo com o texto, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional deverá priorizar as regiões Nordeste, Centro-Oeste e Norte, sendo que o Nordeste receberá 50% dos recursos.  Já o segundo fundo visa garantir a cobertura, por meio do auxílio financeiro, das perdas temporárias que os estados e o Distrito Federal poderão ter em decorrência da redução das alíquotas interestaduais do ICMS. Os recursos sertão destinados na proporção das perdas verificadas em cada estado. Se encerrados os oito anos de vigência e ainda restarem perdas, o fundo deverá ser prorrogado por mais dois anos.

Segundo Pinheiro, a criação desses fundos por emenda constitucional foi uma das condições apresentadas pelos governadores na discussão das mudanças no ICMS. “Os estados queriam contar com a garantia constitucional das novas regras. No texto deixamos explícito que as dotações orçamentárias serão consignadas, sem possibilidade de contingenciamento”, explicou o senador.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)