Política educacional deve favorecer inclusão de aluno com deficiência, aponta debate

Da Agência Senado | 10/05/2023, 20h27

Especialistas defenderam nesta quarta-feira (10) o aprimoramento da política educacional inclusiva na própria rede regular de ensino, independentemente do apoio a organizações da sociedade civil que prestam apoio a esse tipo de aprendizado.

Segundo eles, é necessário fortalecer o sistema nacional inclusivo e reforçar as dotações orçamentárias do setor, visando à formação de professores, estratégias para atender a singularidade dos estudantes, elaboração de metodologias e material de ensino específicos e transporte escolar adaptado, entre outras ações que favoreçam a superação de barreiras que ainda reforçam a discriminação, o racismo e o preconceito.

A avaliação foi feita durante a primeira audiência pública conjunta da Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) e da Comissão de Assuntos Sociais (CAS). O ciclo prevê três audiências públicas que discutirão o papel e as condições das escolas e instituições especializadas no atendimento educacional aos estudantes com deficiência, na perspectiva da inclusão social. O segundo debate será em 17 de maio. O ciclo foi proposto pelos senadores Izalci Lucas (PSDB-DF), Mara Gabrilli (PSD-SP) e Teresa Leitão (PT-PE).

Em 2022, de acordo com a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), o número de matrículas na educação especial chegou a 1,5 milhão, um aumento de 29,3% em relação a 2018. A distribuição das matrículas obedece a seguinte distribuição: 49% na rede municipal; 31,2% na rede estadual; 0,8% na rede federal; e 19% na rede privada.

Desafio na educação

Representante da Undime, Andreia Pereira da Silva ressaltou que o desafio é transformar em realidade os marcos legais e fazê-los funcionar no cotidiano das escolas brasileiras, fazendo valer o artigo 205 da Constituição, segundo o qual “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

— As crianças vêm chegando à escola em número ascendente, e temos que ter um olhar para fazer educação de qualidade e ter a inclusão nas escolas na prática, para que ela não fique no papel — afirmou.

Para a secretária de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação, Zara Figueiredo, política social precisa ter dotação orçamentária que favoreça a inclusão, o que representa uma decisão política dos governos.

— Há distorção que precisa ser objeto de exame. A educação inclusiva precisa incluir indígenas, quilombolas, negros, não temos só alunos urbanos — afirmou.

Equiparação de oportunidades

Coordenadora da Frente Jurídica Coalizão Brasileira pela Educação Inclusiva e autora da primeira dissertação em braile no país, Laís de Figueirêdo Lopes disse que “lutar pelos direitos das pessoas com deficiência é lutar pela defesa firme de estarmos todos juntos, sem exceção, com equiparação de oportunidades”. A escolarização acontece na escola e não pode ser substituída por outras formas de atendimento, como programas de saúde, que, apesar de importantes, não substituem o processo formativo ofertado na escola regular.

— Podemos coletivamente repensar política nacional inclusiva para buscar aprimorá-la no Brasil — afirmou.

Professora da Secretaria de Educação do Distrito Federal e mãe de alunos com deficiência, Elen Regina Moraes ressaltou que a implementação da educação dirigida a alunos especiais requer muitos cuidados. Ela apontou o trabalho de excelência desenvolvido pelo Instituto de Educação de Surdos e o Instituto Benjamin Constant, no Rio de Janeiro.

— Essas são escolas institucionalizadas que tratam do ensino especial destacam-se na formação de professores, estão aí para trabalhar, não só o currículo base. Todos podem aprender, mas são saberes diferentes e diferenciados. O que é consenso dos estudiosos é que somos iguais porque somos diferentes, e que devemos ser tratados com essa diferença, temos direitos agregados na Constituição, na Lei de Diretrizes e Bases [da Educação] — afirmou.

Acessibilidade

Filho da professora, o estudante Iury Moraes afirmou, por meio da linguagem de sinais, que sua luta de participar do processo educacional foi muito difícil. Mestrando da Universidade de Brasília (UnB), o jovem ressaltou ainda que é preciso ter respeito pela pessoa com deficiência. Ele também cobrou acesso à educação e continuidade no processo educacional e de acessibilidade.

— Minha mãe luta bastante pela acessibilidade. Nós conversamos muito pelo direito das pessoas especiais. Não foi fácil o processo de procura de escola e orientação. Tive professores que me ensinaram meus direitos e estratégias para minha vida acadêmica e pesquisas, e tudo isso foi muito demorado. Quero ser protagonista, já sofri muito com preconceito. Temos que evoluir — afirmou.

Autodefensor (representante) nacional do Movimento Pestalozziano, Carlos Henrique Viana falou das dificuldades encontradas no sistema regular de ensino.

— Estudei na rede regular, não fui bem aceito, bem inserido, tive muitas dificuldades, tive professores de apoio, mas mesmo assim não consegui chegar ao objetivo final, que era ler, aprender, escrever com domínio e aprender as quatro operações matemáticas. Fui humilhado, maltratado, machucado por colegas que não tinham nenhum tipo de deficiência. Não sendo aceito pelos alunos, decidi estudar na Pestalozzi. Na rede regular, os professores não tinham paciência. Hoje me sinto muito mais acolhido, muito mais amado. Os professores da Pestalozzi têm um amor fora do limite, fora do normal, amor que ultrapassa o carinho, tratam os alunos como se fossem os próprios filhos, nos dão o direito de aprender e escrever, a autonomia de ser um ser humano. É uma vitória muito grande — ressaltou.

Autonomia e conhecimento

Vice-presidente do Movimento Orgulho Autista (Moab) e membro do Conselho dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Distrito Federal (Coddece), Viviani Guimarães destacou que o cérebro de todas as crianças está apto para aprender, sobretudo no período da primeira infância, que vai do zero aos seis anos de idade. Ela ressaltou ainda que a estimulação precoce é fundamental para o desenvolvimento educacional, das possibilidades cognitivas e autonomia futura dos estudantes.

O defensor público e membro do Conselho dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Distrito Federal Wemer Hesbon Borges da Silva esclareceu que a escola especializada faz parte da rede regular de ensino, e que o sistema inclusivo pode ter dentro dele uma escola comum, com classes especializadas que permitirão o desenvolvimento e o potencial de habilidades físicas e intelectuais por parte de alunos portadores de deficiência.

Avaliação dos senadores

Durante o debate, a senadora Mara Gabrilli (PSD-SP) condenou a segregação entre alunos com deficiência. Ao defender a inclusão de todas as crianças, com ou sem deficiência, ela ressaltou que “a diversidade é a riqueza maravilhosa e o colorido real da nossa vida”.

— Quando a gente fala de educação inclusiva, a gente imagina uma educação que conceba o fato de que não existe nenhum ser humano que não tenha capacidade de aprender. Todo ser humano tem capacidade de aprender, até intrauterinamente ele está recebendo estímulo. Ninguém vai retirar do ser humano a capacidade de aprender. Esse é um tema bastante desafiador para todos os países do mundo. Queremos fazer a inclusão de todos. Ninguém quer ter ensino massificado. Podemos ter professores tentando aprender como cada um aprende. As crianças sem deficiência não podem ser furtadas de conviver com as crianças com deficiência — afirmou.

Mara Gabrilli defendeu ainda que a educação especial seja oferecida no mesmo sistema educacional geral, “com as devidas adaptações e com respeito à preferência de cada aluno, respeitando a diversidade e sem buscar a homogeneização do ensino, sem a massificação do aprendizado.

— A educação inclusiva deve ser entendida como um direito humano fundamental a todos os alunos, sem segregação, enclausuramento e exclusão de alunos, para que as pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema sob alegação de que não têm capacidade de aprender. O “não” é uma palavrinha que deveria ser menos utilizada, é uma barreira destruidora para a família inteira.

A senadora Teresa Leitão (PT-PE) citou sua experiência de 30 anos como professora e disse que a política de inclusão deve levar em conta “um ambiente escolar de muita riqueza”.

— Defendemos a política de inclusão, que é tão complexa, multifacetada, nós sozinhos não podemos resolver. Temos que ter outros aportes, outros olhares referenciados pela inclusão, pelas experiências de todas as áreas — afirmou.

O senador Izalci Lucas (PSDB-DF), por sua vez, afirmou que as distorções da política nacional sobre educação inclusiva podem ser discutidas e defendeu a promoção de debate sobre o tema na Comissão Mista de Orçamento (CMO).

— Temos que evoluir, temos que saber — concluiu.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)