Repensar uso de plástico é fundamental, dizem especialistas

Da Agência Senado | 21/06/2021, 20h11

Em audiência pública remota da Comissão de Meio Ambiente (CMA) nesta segunda-feira (21) sobre a poluição por plásticos descartáveis, representantes de organizações não-governamentais e da indústria do setor concordaram com a dimensão do problema, que afeta a natureza e a economia, e declararam esperar medidas de enfrentamento que incluem políticas públicas setoriais, incentivo à reciclagem e aprimoramento no planejamento de produtos. A audiência integrou as atividades da Campanha Junho Verde e foi realizada a requerimento do senador Fabiano Contarato (Rede-ES).

O professor André Barreto, coordenador do Programa de Monitoramento de Praias (PMP) da Petrobras em Santa Catarina, sublinhou a preocupação crescente da comunidade científica com o acúmulo de lixo marinho, especialmente na forma de plástico. A pesquisa é importante, segundo ele, porque somente o conhecimento do impacto sobre os animais é possível pensar em atividades de mitigação.

— O plástico tem uma grande permanência no ambiente, e sua produção em massa a partir da década de 1940 fez com que houvesse cada vez mais quantidade no nosso ambiente, porque ele também não se degrada. Isso facilita o acúmulo desse material. 

Como exemplo do trabalho dos PMPs, Barreto mencionou que, de 265 tartarugas examinadas, 70% tinham resíduo de origem humana, e, desse resíduo, 89% eram plástico.

Roberto Rocha, representante do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis, alertou para as condições de sobrevivência “desumana” a que a categoria é submetida, e avalia que a degradação por material plástico só não é maior pelo esforço desse “exército de trabalhadores e trabalhadoras”.

— É importante também que esses trabalhadores sejam cada vez mais reconhecidos como um trabalho essencial. Os catadores e catadoras de material reciclável fazem um trabalho essencial para o planeta.

Rocha também apelou à conscientização dos fabricantes de plásticos, que, em sua opinião, poderiam ajudar os catadores ao produzir materiais de maior potencial de reciclabilidade e valor mais elevado de comercialização.

Para Marcelo Montenegro, coordenador do Programa de Justiça Socioambiental da Fundação Heinrich Böll no Brasil, há muito plástico no planeta: em 60 anos de fabricação, foram produzidos mais de 10 bilhões de toneladas, e a produção aumenta a cada ano.

— Se fossem colocados em balanças todos os seres humanos e animais juntos, eles pesariam em torno de 4 bilhões de toneladas. Ou seja: o plástico pesa duas vezes e meia mais do que todos os animais e humanos juntos — denunciou.

Montenegro observou que, em toda a sua cadeia produtiva, o plástico produz e emite gases do efeito estufa, e apontou o consumo involuntário de microplásticos como ameaça à saúde humana nos aspectos físico, químico e biológico. Ele lamentou o baixo índice de reciclagem de plástico — cerca de 1,28%, segundo levantamento do Banco Mundial — e, no caso brasileiro, de 155 praias analisadas no Atlas do Plástico, a maioria foi encontrada suja ou extremamente suja, sendo que 70% a 85% do lixo encontrado é plástico.

— O aumento da concentração de lixos em praias pode levar a uma perda anual entre US$ 880 mil a US$ 8,5 milhões para o município. Isso sem contar o impacto também econômico, social e ambiental das comunidades tradicionais que se utilizam da praia como modo de vida — avaliou, lembrando que o enfrentamento do “tsunami” plástico depende de políticas públicas, conscientização e transparência.

Pandemia

No mesmo sentido, Vitor Pinheiro, coordenador da campanha Mares Limpos no Brasil, comentou o efeito negativo da poluição plástica sobre os destinos turísticos, especialmente os que mais atraem estrangeiros, e criticou a falta de prioridade de agentes públicos e privados no enfrentamento do problema. Pinheiro, que representa o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), também associou a crise da covid-19 ao agravamento da situação do descarte de plásticos nos oceanos: máscaras cirúrgicas lançadas na natureza podem levar 450 anos para se degradarem, o aumento de uso de material descartável aumentou em 12% a coleta seletiva na cidade de São Paulo, e somente um aplicativo de entrega de refeições triplicou suas entregas desde o ano passado.

— A gente entende que esse impacto é maior, e isso envia muito plástico de uso único para o uso das pessoas — declarou, salientando que embalagens plásticas transmitem uma falsa sensação de segurança contra vírus.

De acordo com os dados apresentados por Pinheiro, em todo o mundo os plásticos matam cerca de 100 mil animais por ano, causando US$ 13 bilhões em danos, e somente no Brasil cada pessoa consome 1.280 embalagens anualmente.

Representando a Associação Brasileira da Indústria de Plástico (Abiplast), Paulo Henrique Rangel Teixeira pediu um “olhar sistêmico” sobre as questões de sustentabilidade quando se oferecem propostas de substituição de plásticos por outros produtos, alertando que não se trata de uma decisão única e simples.

— Quando eu uso um plástico para dar mais vida longa a um alimento que eu trouxe da agricultura, quando eu evito o desperdício de frutas, legumes e verduras, quando eu consigo dar maior durabilidade para uma carne, para uma proteína, que a faça chegar em comunidades que estão mais distantes dos centros urbanos, aquilo que foi tirado da natureza, você consegue dar vida longa a ele, para que aquilo seja efetivamente consumido após a sua emissão — explicou.

Para ele, qualquer política de substituição deve ser embasada em cálculos de custo-benefício para o meio ambiente, e os programas de banimento de plásticos de uso único (especialmente as embalagens de consumo) acabam sinalizando “insegurança jurídica” para as empresas que já investiram no cumprimento da logística reversa determinada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos.

No entanto, Vitor Pinheiro mencionou novas legislações nacionais voltadas para o enfrentamento da questão do plástico, que deverá ter destaque na Assembleia de Meio Ambiente da Organização das Nações Unidas.

— Sem a participação do setor privado e também do Estado, como regulador, que dê a linha de trabalho para isso, a gente não consegue endereçar essa questão.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)