Aprovada MP que dá status de ministério à Secretaria-Geral da Presidência

Augusto Castro | 04/10/2017, 20h50

Mesmo com duras críticas de vários senadores, inclusive da base partidária do governo, o Plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (4) a Medida Provisória (MP) 782/2017, que atualizou a organização administrativa do Poder Executivo. O texto dá status de ministério à Secretaria-Geral da Presidência da República, hoje ocupada por Moreira Franco, e cria o Ministério dos Direitos Humanos. Foram 40 votos favoráveis, 24 contrários e uma abstenção.

Como sofreu alterações no Congresso, a medida será enviada para sanção presidencial na forma do PLV 30/2017, cujo relator foi o senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA). O projeto de lei de conversão inclui a Secretaria Especial da Aquicultura e da Pesca dentre os órgãos que integram a Presidência da República. A secretaria, por enquanto, é vinculada ao Ministério da Agricultura. Entretanto, essa mudança foi criticada por alguns senadores e há a possibilidade de o Poder Executivo não acolher esse dispositivo.

O senador Cidinho Santos (PR-MT) defendeu a permanência da Secretaria da Pesca no âmbito do Ministério da Agricultura, principalmente devido à atribuição de inspeção sanitária, que necessita de estruturas física e de pessoal especializadas.

A medida provisória também recriou o Ministério dos Direitos Humanos. Mas o texto mantém na Casa Civil a atribuição de delimitar as terras dos remanescentes das comunidades dos quilombos e determinar as suas demarcações, que devem ser homologadas por decreto. Para o relator, as mudanças promovidas dão “uma nova concepção de gestão para a administração pública federal” e aperfeiçoa a estrutura do Poder Executivo.

Concepção

Por meio de destaque apresentado pela senadora Marta Suplicy (PMDB-SP), o Plenário concordou em retirar do texto do PLV a determinação de que o Ministério dos Direitos Humanos deveria adotar como diretrizes para o exercício de suas competências os princípios estabelecidos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. A convenção estipula que o “direito à vida” deve ser protegido pela lei “e, em geral, desde o momento da concepção”.

Esse dispositivo foi retirado do texto que vai à sanção devido à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de que o Senado pode retirar dispositivos incluídos pela Câmara dos Deputados que não tenham conexão com o texto original do Executivo.

O relator Flexa Ribeiro também explicou que a medida provisória inclui na área de competência do Ministério das Relações Exteriores a supervisão da Agência de Promoção de Exportações do Brasil (Apex-Brasil) e a política de imigração. Disse ainda que o PLV devolve a competência sobre a área previdenciária ao Ministério do Trabalho e determina que o Conselho Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais integre a estrutura básica do Ministério dos Direitos Humanos.

Moreira Franco

Os senadores que se opuseram à aprovação lembraram que, desde que editada, em 31 de maio, a MP 782/2017 tem dividido opiniões. A medida confere status de ministro a Moreira Franco, atual chefe da Secretaria-Geral da Presidência e um dos investigados pela Operação Lava Jato — a mudança assegura a ele direito a foro privilegiado. Outra medida provisória sobre o assunto (MP 768/2017) foi revogada pelo governo em 31 de maio, dois dias antes do fim do prazo de vigência.

Alegando inconstitucionalidade, três partidos políticos (PT, PSOL e Rede) e o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ingressaram no Supremo Tribunal Federal (STF) com ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) contra a MP 782. Segundo os autores, a matéria fere dispositivo constitucional que proíbe a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou tenha perdido a vigência por vencimento de prazo.

Com a revogação, o governo tentou evitar a perda de vigência para viabilizar a reedição. A ação ainda não foi julgada pelo Supremo.

Moreira Franco é citado na denúncia do ex-PGR Rodrigo Janot, que envolve também o presidente da República, Michel Temer, e o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha. Eles são acusados de participar de um suposto esquema de corrupção. O Palácio do Planalto nega as acusações.

O novo status de ministro a Moreira Franco foi criticado por diversos senadores, entre eles Lindbergh Farias (PT-RJ), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Renan Calheiros (PMDB-AL), Otto Alencar (PSD-BA), Reguffe (sem partido-DF), Kátia Abreu (PMDB-TO), Alvaro Dias (Pode-PR), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Ricardo Ferraço (PSDB-ES), entre outros. Para a maioria dos senadores que votaram contra a matéria, o único objetivo do governo com a MP foi dar a Moreira Franco status ministro para lhe assegurar foro especial de julgamento no Poder Judiciário.

Alguns chegaram a apontar similaridades do caso do ministro Moreira Franco à tentativa da então presidente Dilma Rousseff de nomear o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Casa Civil da Presidência da República.

Abertura de inquérito

Renan Calheiros afirmou que a MP 782 é “uma medida provisória que assegura foro especial para o secretário-geral da Presidência da República”.

— Nas circunstâncias em que nós temos um senador afastado e preso na sua casa todas as noites, nós vamos correr aqui para garantir um foro para um ministro do outro Poder? Ou seja, fazendo o que nós recusamos fazer ontem com um senador da República? Nós não podíamos deliberar sobre a questão do mandato, para que se respeitasse a Constituição, mas esta Casa pode votar atropeladamente uma medida provisória para garantir o foro especial ao senhor Moreira Franco. Isso é o fim! — afirmou Renan.

Lindbergh Farias chamou a proposta de “MP do Gato Angorá”. Ele afirmou que a medida só foi editada pelo governo após a abertura de inquérito da PGR contra Moreira Franco.

— É uma MP para salvar Moreira Franco, para que ele não seja investigado. Temos que impedir esse abuso. Seria uma vergonha o Senado aprovar essa medida provisória. É um escândalo, estão querendo impedir a investigação do ministro — afirmou Lindbergh.

Kátia Abreu também afirmou que o único objetivo da MP é “dar foro especial para o senhor Moreira Franco, assessor do presidente que está em investigação e tem risco de prisão”.

Amigo do presidente

Alvaro Dias afirmou que a edição de uma MP apenas para dar status de ministro a uma pessoa configura “ausência de escrúpulos”, além de ser “um escárnio” com a população.

— É mais uma ação do governo que afronta a inteligência nacional. Não é uma reforma administrativa, é a criação de um instrumento para proteger um amigo do presidente da República. Que tempos estamos vivendo, tempo do escárnio, do acinte, de uma desavergonhada ação de um governo antiético. Essa Casa não pode subscrever uma ação dessa natureza. É nosso dever votar contra essa medida provisória da vergonha — declarou Alvaro Dias.

Por sua vez, Randolfe Rodrigues lembrou de Leonel Brizola (1922-2004), que apelidou Moreira Franco de “Gato Angorá” em 1982, ainda durante a ditadura militar. Randolfe classificou a MP de inadequada, “indecente, escandalosa e aviltante”.

— O objetivo dessa MP não foi reestruturação administrativa, (...) foi dar status de ministro e foro ao senhor Moreira para que ele não caia nas mãos de um juiz de primeira instância, que poderia decretar sua prisão. É um crime escancarado, uma fraude no processo legislativo — disse Randolfe.

O Plenário ainda votou simbolicamente destaque do senador Lindbergh para tirar do texto o status de ministério para a Secretaria-Geral da Presidência, porém o destaque foi rejeitado e o texto mantido.

Parecer favorável

Líder em exercício do governo no Senado, o senador Fernando Bezerra Coelho (PMDB-PE) defendeu a aprovação da medida provisória e negou que a MP tivesse o objetivo de proteger Moreira Franco.

O senador salientou que o próprio STF já deu parecer favorável à nomeação ao não reconhecer a acusação de desvio de finalidade.

O senador Benedito de Lira (PP-AL) também falou favoravelmente à aprovação do texto, mencionado a mudança de status da Secretaria da Pesca.

Ministérios

O texto aprovado dispõe sobre a organização básica dos órgãos da Presidência e dos ministérios. Além da Secretaria-Geral e da Secretaria da Pesca, também integram a Presidência da República a Casa Civil, a Secretaria de Governo, o Gabinete Pessoal do Presidente e o Gabinete de Segurança Institucional.

São dez os órgãos de assessoramento imediato do presidente, entre eles o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, a Câmara de Comércio Exterior, a Advogacia-Geral da União e o Conselho Nacional de Política Energética. Já os órgãos de consulta do presidente são dois: o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional. O texto aprovado elenca as competências, atribuições e estrutura básica de cada um desses órgãos e conselhos.

Em seguida, enumeram-se os 22 ministérios, suas competências, estrutura básica (órgãos e secretarias) e atribuições: Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Cidades; Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações; Cultura; Defesa; Desenvolvimento Social; Direitos Humanos; Educação; Esporte; Fazenda; Indústria, Comércio Exterior e Serviços; Integração Nacional; Justiça e Segurança Pública; Meio Ambiente; Minas e Energia; Planejamento, Desenvolvimento e Gestão; Trabalho; Transportes, Portos e Aviação Civil; Turismo; Relações Exteriores; Transparência e Controladoria-Geral da União; Saúde.

O art. 22 do PLV elenca os membros do Executivo que têm status de Ministro de Estado e, por conseguinte, foro especial por prerrogativa de função, também conhecido como foro privilegiado: todos os titulares dos ministérios; os chefes da Casa Civil, da Secretaria de Governo, do Gabinete de Segurança Institucional e da Secretaria-Geral, além do Advogado-Geral da União e do presidente do Banco Central.

O texto que segue para sanção também faz algumas alterações na lei do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), a cargo da própria Secretaria-Geral da Presidência.

Com informações da Agência Câmara

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)