Para especialistas, redes sociais reforçam 'bullying' e risco de suicídio de adolescentes
Da Redação | 21/09/2017, 18h04
Automutilação e suicídio entre crianças e adolescentes foram os temas abordados na audiência pública realizada pela CPI dos Maus-tratos, nesta quinta-feira (21). Os especialistas deixaram claro que não há explicações simples para atos tão severos, cujas causas mais comuns seriam transtornos mentais ou psicológicos, inclusive os resultantes de situações de violência e abusos na infância. Foi também citada a questão do bullying, com dimensão ampliada na era da internet e das redes sociais e grande potencial para levar crianças e jovens a condutas extremas.
Como observou o psiquiatra André de Mattos Salles, de Brasília, há 20 anos o bullying e os problemas que um adolescente enfrentava ao longo da vida eram restritos a determinados contextos. Poderia ocorrer um desentendimento com colegas da escolas mas ao chegar em casa essa criança ou jovem encontrava uma “zona de conforto”. Mas hoje, por causa das redes sociais na rede de computadores, ele pode receber ameaças e ser exposto a conteúdos vexatórios ao longo das 24 horas do dia, sem trégua.
— A gente tem que lembrar também da velocidade da informação e facilidade filmam tudo que acontece. Alguma situação constrangedora que acontece com o adolescente, isso é filmado e colocado nas redes sociais, e em algumas horas e dias o mundo inteiro está vendo. O impacto disso para uma personalidade em formação é avassalador — comentou Salles.
A audiência foi proposta pelo presidente da CPI, senador Magno Malta (PR-ES), que também dirigiu os trabalhos. Antes de encerrar os trabalhos, ele solicitou aos convidados sugestões de conteúdo para a elaboração de cartilha que possa servir como material de apoio na prevenção da automutilação e suicídio entre crianças e jovens.
Contágio
As diferenças entre a automutilação e tentativas de suicídio foram bem determinadas pelos três especialistas convidados, entre eles o psicólogo Carlos Henrique Aragão Neto, também de Brasília. Sobre a automutilação, ele explicou que são atos de agressão ao próprio corpo praticados de modo frequente e com métodos variados. A intenção principal do gesto de automutilar-se é obter alívio para uma situação angustiante com a qual o adolescente não saber lidar, ressaltou Aragão.
Segundo o psicólogo, estudos também apontam que, nesses atos, estão presentes a ideia de autopunição, de vingança contra alguém e até mesmo de responder a pensamentos suicidas sem necessariamente fazer uma tentativa, entre outras. Apesar de serem normalmente práticas de baixa letalidade, observou, a automutilação se relaciona com o aumento do risco para o suicídio.
Aragão mencionou estudo feito em 2007, nos Estados Unidos, em que 47% dos jovens relataram atos de automutilação pelo menos uma vez no ano anterior. Entre os métodos mais frequentes, estão o corte ou raspagem da pele; bater, contundir ou golpear o corpo e provocar queimaduras. Ele lamentou a falta de estatísticas no Brasil, mas afirmou que há indicações de aumento de ocorrências. Citou caso fora do comum, numa escola em Garanhuns (PE), em que 50 de 53 alunos de uma mesma sala estavam se automutilando.
— O efeito do contágio e de propagação na automutilação é importante — destacou.
Prevenção ao suicídio
No caso do suicídio, os especialistas explicaram que são atos mais raros e métodos menos variados, em que há de fato a intenção de morrer. De acordo com Fernanda Benquerer Costa, psiquiatra da Secretaria de Saúde de Brasília, o suicídio é a 13ª causa de morte no mundo, com prevalência ainda maior no caso de jovens dos 15 aos 19 anos, em que é o segundo motivo de mortes.
Assim como seus colegas, ela chamou a atenção para a necessidade de políticas públicas intersetoriais de prevenção da automutilação e do suicídio entre crianças e adolescentes, com envolvimento dos setores de educação e saúde, com garantia de acesso aos serviços especializados. Cobrou o envolvimento de toda a sociedade e, em especial, da mídia e dos legisladores, para uma melhora nas ações de prevenção.
— A gente precisar agir para fortalecer os fatores de proteção. São os vínculos sociais, a habilidade de resolução de problemas, trabalhar a autoestima dos adolescentes, trabalhar a expressão emocional e a busca de alternativas. Isso é como se fosse uma vacina para que o adolescente, em momento de crise, não desenvolva para o lado da automutilação e do suicídio — disse Fernanda Costa.
CVV
Participou também da audiência Antonio Carlos Braga, como representante do Centro de Valorização da Vida (CVV), entidade fundada há 55 anos que presta serviço voluntário e gratuito de apoio emocional e prevenção do suicídio. Há 72 postos de atendimento no país e, é possível falar com o CVV por telefone (141) e, mais recentemente, por chat na internet.
Braga informou que, somente por telefone, cerca de 2 mil voluntários atendem mais de um milhão de ligações por ano. Os voluntários atendem pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo, dando apoio emocional em momentos difíceis desses indivíduos. Ele destacou o rápido crescimento dos atendimentos por chat, que chegou a 30 mil pessoas no ano passado.
Disse ainda que impressionou o fato de que mais da metade desses contatos foram de jovens entre 13 e 19 anos de idade, e um terço deles falando em suicídio e em ferir a si próprios. Braga observou que a depressão infantil é uma realidade e que o CVV está disponível para debater o tema.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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