Relator aponta crimes e vota pela continuidade do impeachment de Dilma Rousseff
Anderson Vieira | 02/08/2016, 19h43
O relator da Comissão Especial do Impeachment, senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), apresentou nesta terça-feira (2) seu relatório com voto pela procedência da acusação e pelo prosseguimento do processo contra a presidente afastada Dilma Rousseff.
Num documento de 441 páginas, Anastasia afirmou que há a presença de materialidade de crime e indício de autoria, o que o levou a votar pela pronúncia de Dilma. Ou seja, ela deve ser levada a julgamento pelos 81 senadores.
Para Anastasia, a presidente violou a Constituição ao praticar as chamadas “pedaladas fiscais”, atrasando pagamentos da União a bancos públicos para execução de despesas, e ao editar decretos de crédito suplementar sem autorização do Congresso Nacional.
Economia
Ao concluir seu voto, o relator fez considerações sobre a situação econômica, afirmando que a “expansão insustentável” do gasto público está associada à profunda crise que o Brasil vive hoje.
— Os artifícios fiscais utilizados para a expansão do gasto implicaram perda de confiança dos agentes econômicos, dos investidores, das pessoas físicas, nos números da economia e no futuro da economia e, hoje, perda do grau de investimento do Brasil pelas principais agências de classificação de risco — afirmou.
O parlamentar classificou de "grave" a conduta da chefe do Executivo, que, na opinião dele, foi conivente com um “vale-tudo orçamentário”.
— Instaurou-se um vale-tudo orçamentário e fiscal que trouxe sérias consequências negativas para o país. No âmbito das finanças públicas, o realismo deve sempre prevalecer sobre o formalismo, para não comprometer a credibilidade do governo, para não termos desequilíbrio fiscal acompanhado do aumento do desemprego, da inflação, do endividamento, e da queda de confiança dos agentes econômicos — considerou.
O relator também fez questão de ressaltar que seu voto não foi feito para contrastar o mandato de Dilma Rousseff com índices críticos de impopularidade e com o sentimento de rejeição demonstrado pela população nas redes sociais.
— Igualmente, não se cuida de uma revisão da biografia da mandatária da nação, que a história de cada qual se escreve com a pena da verdade da própria consciência, que o discurso não (des)constrói, que a mídia não pode apropriar por inteiro, que a dimensão coletiva não é capaz de testemunhar — finalizou.
Decretos
Dos seis decretos apontados inicialmente como irregulares pela denúncia que motivou o impeachment, o relator considerou em seu relatório apenas três, os quais, segundo ele, foram incompatíveis com a meta de resultado primário vigente na época.
— Na ausência de uma vinculação à meta, o orçamento se tornaria uma autêntica peça de ficção, que autorizaria despesas à revelia da efetiva disponibilidade de recursos — disse.
Pedaladas
Sobre as pedaladas, Anastasia considerou tratar-se de empréstimo de um banco público - no caso do Banco do Brasil — à União, prática vedada pelo artigo 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Segundo ele, o interesse público dessa proibição se dá porque os bancos operam não apenas com recursos próprios, mas da sociedade em geral. E operações temerárias põem em risco tanto o patrimônio de seus acionistas controladores quanto dos correntistas e investidores.
— Operações de crédito entre instituições financeiras e seus controladores são vedadas tanto no setor público quanto no setor privado. Trata-se de norma básica de regulação bancária, adotada internacionalmente. Procura-se evitar que a promiscuidade de interesses leve as instituições financeiras a atuarem temerariamente na concessão de crédito, em benefício se seus controladores — argumentou.
Defesa
Antes da leitura do relatório, senadores aliados de Dilma Rousseff tentaram ouvir o procurador da República no Distrito Federal Ivan Marx, que disse recentemente não ter visto crime nas pedaladas fiscais. Mas o pedido foi negado pelo presidente da Comissão Especial, Raimundo Lira (PMDB-RN).
Os parlamentares também apresentaram um voto em separado, rebatendo as acusações e pedindo o fim do processo de impeachment.
Calendário
O relatório vai ser discutido em reunião nesta quarta-feira (3) e tem previsão de votação na quinta-feira (4). Independentemente do resultado, o documento será levado a Plenário para análise de todos os senadores.
Temas | Posição do relator |
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Pedalada fiscal | A gravidade dos fatos constatados não deixa dúvidas quanto à existência não de meras formalidades contábeis, mas de um autêntico "atentado à Constituição". |
Decretos | Ao abrir créditos suplementares e contingenciar despesas com base em projeto de lei pendente da apreciação do Parlamento, a presidente da República revelou, portanto, não apenas desconsideração pelos mais elementares princípios de responsabilidade fiscal, mas absoluto desrespeito ao Congresso Nacional. |
Lições | Três são as lições que devem ser consideradas pela sociedade brasileira nesse processo de impeachment: o descontrole fiscal compromete a sustentabilidade das políticas públicas de serviços fundamentais para a sociedade; o desequilíbrio das contas públicas amplia o endividamento público e impacta vários indicadores econômicos; o Poder Legislativo, que é a caixa de ressonância da sociedade, não pode ter suas funções constitucionais de fiscalização e controle do orçamento usurpadas pelo Executivo. |
Gastos públicos | O que se observou foi uma política expansiva de gasto sem sustentabilidade fiscal e sem a devida transparência, com o uso de operações que passaram ao largo da legislação e das boas práticas de gestão fiscal e orçamentária, assim como a recusa em se interromper o curso danoso dos eventos pela autoridade máxima do país, que detinha o poder e as informações necessárias, em última instância, para ordenar e fazer cessar as irregularidades. |
TCU | Este processo não trata de manobras fiscais que teriam sido igualmente executadas em governos anteriores. pela primeira vez, sob a Constituição em vigor, um presidente da República teve a recomendação de rejeição de suas contas pelo TCU, e em decisão unânime de seus ministros. |
Princípios | A presidente descumpriu princípios que regem não apenas a Administração Pública, mas o Estado de Direito, tais como: Planejamento (projeções de receitas superestimadas e despesas subestimadas); Transparência (transações omitidas nas estatísticas fiscais); Moralidade (não correção de rumos, após alertas do TCU). |
Decretos considerados pelo relator | Valores |
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Decreto 14.242 |
Editado em 27/07/2015 no valor de R$ 1,7 bilhão |
Decreto 14.244 | Editado em 27/07/2015, no valor de R$ 29,9 milhões |
Decreto 14.260 | Editado em 20/08/2015 no valor de R$ 600,3 milhões |
Condutas típicas praticadas por Dilma Rousseff e consideradas pelo relator, previstas como crimes de responsabilidade na Lei 1.079/1950: |
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* Infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da Lei Orçamentária. |
* Abrir crédito sem fundamento em lei ou sem as formalidades legais. |
* Ordenar ou autorizar a abertura de crédito com inobservância de prescrição legal. |
* Contrair empréstimo ou efetuar operação de crédito sem autorização legal. |
* Deixar de promover ou de ordenar na forma da lei a amortização ou a constituição de reserva para anular os efeitos de operação de crédito realizada com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei. |
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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