A legislação brasileira que garante direitos às pessoas com deficiência se tornou um cipoal, como demonstra o levantamento realizado pela consultora do Senado, Cleide Lemos. O pleito de várias entidades é que esse conjunto de leis e decretos seja consolidado no texto do estatuto que tramita na Câmara.  

Trabalho — A Constituição federal proíbe qualquer discriminação contra o trabalhador com deficiência (art. 6º). A Lei 8.112/90 (art. 5º) e o Decreto 3.298/99 (art. 37) asseguram entre 5% e 20% das vagas de concurso destinado ao provimento de cargos e empregos públicos às pessoas com deficiência. Já a Lei 8.213/91 (art. 93) estabelece reserva de mercado no setor privado, obrigando as empresas com mais de cem funcionários a preencher entre 2% e 5% de seus cargos com pessoas reabilitadas ou com deficiência. A Lei 9.867/99 prevê a criação de cooperativas sociais destinadas a inserir as pessoas com deficiência no mercado econômico, por meio do trabalho. A Lei 8.666/93 (art. 24) dispensa os órgãos públicos de fazer licitação na hipótese de contratação de associações de pessoas com deficiência sem fins lucrativos para prestação de serviços ou fornecimento de mão de obra.

Educação — A legislação básica sobre a matéria (Constituição federal, art. 208; Lei 9.394/96, arts. 58 a 60; a Lei 7.853/89, art. 2º; Decreto 3.298/99, arts. 24 a 29; Decreto 5.626/05 e Decreto 6.571/08) garante à pessoa com deficiência atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino.[1] Ela tem direito — como qualquer outro aluno — a material escolar, transporte, merenda escolar e bolsas de estudo, além dos serviços de apoio e material especializado para atender às suas peculiaridades, tais como livros didáticos e paradidáticos em braile, áudio e Língua Brasileira de Sinais (Libras), laptops com sintetizador de voz, softwares para comunicação alternativa e outras ajudas técnicas que possibilitam o acesso ao currículo.

Saúde — Segundo a Constituição federal, cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas com deficiência é dever de todos: União, estados, Distrito Federal e municípios (art. 24). No âmbito da assistência integral à saúde da criança e do adolescente mediante, a Constituição ordena a criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas com deficiência física, sensorial ou mental (art. 227). A Lei 7.853/89 (art. 2º) garante o acesso da pessoa com deficiência aos estabelecimentos de saúde públicos e privados, bem como tratamento adequado neles. Já a Lei 9.656/98 (art. 14) proíbe que a condição de pessoa com deficiência impeça o cidadão de participar dos planos de saúde. O Decreto 3.298/99 (arts. 16 a 22) assegura-lhe atendimento domiciliar e psicológico, reabilitação e fornecimento de ajudas técnicas (próteses, órteses, equipamentos, bolsas coletoras, etc.). A Lei 8.686/93 (art. 3º) confere prioridade nesse fornecimento às vítimas da talidomida, que desfrutam de igual precedência nas intervenções cirúrgicas e na assistência médica desenvolvidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Nos termos da Lei 10.216/01 (art. 4º), as pessoas com deficiência mental só serão internadas quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes e elas nunca serão internadas em asilos, hospícios ou manicômios. Já a Lei 12.303/10 torna obrigatória a realização do exame de emissões otoacústicas evocadas para prevenir deficiências.

Transporte — A Lei 8.899/94 concede passe livre no sistema de transporte coletivo interestadual às pessoas com deficiência comprovadamente carentes, assim entendidas as que tenham renda mensal familiar per capita de até um salário mínimo. Na regulamentação da lei, o Decreto 3.691/00 manda reservar para elas dois assentos em cada veículo convencional de transporte interestadual rodoviário, ferroviário e aquaviário. A Lei 10.048/00 manda que esses assentos sejam devidamente identificados (art. 3º) e determina que os veículos de transporte coletivo sejam planejados de forma a facilitar o acesso a seu interior das pessoas com deficiência (art. 5º). Para obter a carteira de passe livre, é preciso escrever para o Ministério dos Transportes, informando endereço completo.  

Assistência — Em cumprimento ao disposto no art. 203 da Constituição federal, a Lei 8.742/93 (art. 20) garante o benefício de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência que comprove não poder se sustentar nem ser sustentada pela família. Nessa situação, segundo o Decreto 6.214/07, está a pessoa incapacitada para o trabalho e para a vida independente que pertence a família cuja renda bruta mensal, por integrante, é de menos de um quarto do salário mínimo. Por sua vez, a Lei 7.070/82 garante pensão especial vitalícia às vítimas da talidomida e a Lei 10.708/03 reconhece às pessoas com deficiência mental que tenham ficado internadas por dois anos ou mais o direito de receber auxílio-reabilitação psicossocial, no valor de R$ 240, durante um ano. Vale a pena também conferir o teor da Lei 12.101/09, que dispõe sobre a certificação das entidades beneficentes de assistência social.

Isenções e benefícios — Conforme dispõe a Lei 11.727/08, não incide Imposto de Renda (IR) sobre a pensão especial vitalícia nem sobre outros pagos por conta da deficiência física às vítimas da talidomida. De modo semelhante, a Lei 8.687/93 isenta do pagamento de IR os benefícios auferidos pelas pessoas com deficiência mental. A Lei 8.383/91 (art. 72) isenta as pessoas com deficiência física do pagamento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incidente sobre o financiamento para a compra de automóveis de fabricação nacional com até 127 HP de potência bruta. A Lei 8.989/95, alterada pela Lei 10.754/03 e pela Lei 12.113/09, também isenta esses automóveis do pagamento do Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI), quando adquiridos por pessoas com deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante legal.[2] São dedutíveis do IR devido as despesas com próteses e aparelhos ortopédicos (por exemplo, cadeiras de rodas, pernas e braços mecânicos) e as despesas de instrução com pessoa com deficiência física ou mental (Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal 15/01, arts. 43 e 44). Essa norma igualmente isenta da cobrança de IR os proventos de aposentadoria ou reforma motivadas por acidente em serviço e recebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, osteíte deformante, contaminação por radiação, aids e fibrose cística. Registre-se, ainda, que a Lei 12.190/10 (regulamentada pelo Decreto 7.235/10) concede indenização por dano moral às pessoas com deficiência física decorrente do uso da talidomida.  

Acessibilidade — Para facilitar a locomoção das pessoas com deficiência e seu acesso a bens e serviços coletivos, a Constituição prevê a elaboração de lei específica sobre a matéria (art. 227). Trata-se da Lei 10.098/00, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida nas vias e espaços públicos, bem como nos meios de transporte e de comunicação. Ela disciplina o desenho e a localização do mobiliário urbano, o acesso aos edifícios, o uso de sinalização e de ajudas técnicas, o fomento à eliminação de barreiras e a reserva de espaço apropriado para essas pessoas nas salas de espetáculo, conferência, aula e reunião, nos museus, nas bibliotecas e em espaços de natureza similar. Já a Lei 10.048/00 obriga a autoridade competente a baixar normas de construção para os logradouros, sanitários públicos e edifícios de uso público, com o fim de facilitar o acesso e o uso desses locais. Vale a pena conferir, também, a regulamentação dessas duas leis (Decreto 5.296/04). Note-se que a Lei 7.405/85 torna obrigatória a colocação do símbolo internacional de acesso em locais e serviços utilizados pela pessoa com deficiência, enquanto a Lei 9.610/98 (art. 46) afirma não constituir ofensa aos direitos autorais a reprodução — sem fins comerciais — de obras literárias, artísticas e científicas, pelo sistema braile, para uso exclusivo de deficientes visuais. Segundo a Lei 11.982/09, os parques de diversões devem adaptar 5% de cada brinquedo ou equipamento para o uso das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. A Lei 10.436/02 reconhece a Libras como meio legal de comunicação e expressão e determina que o poder público apoie seu uso e difusão. Ao regulamentá-la, o Decreto 5.626/05 cuida da inclusão da Libras no currículo, da formação de professores e intérpretes dessa língua e dos direitos das pessoas surdas ou com deficiência auditiva à educação e a à saúde. Por fim, a Lei 11.126/05 garante à pessoa com deficiência visual o direito de ingressar e permanecer em ambientes de uso coletivo acompanhado de cão-guia.  

Outros — Conforme previsto na Lei 10.048/00, a pessoa com deficiência tem direito a atendimento prioritário nas repartições públicas, nas empresas concessionárias de serviços públicos e nas instituições financeiras, por meio de serviços individualizados que lhe assegurem tratamento diferenciado. Tem direito, ainda, à equiparação de oportunidades também nos campos da cultura, da profissionalização, do desporto, do turismo e do lazer, como regula o Decreto 3.298/99 (arts. 30 a 33 e 46 a 48). A pessoa estrangeira com deficiência, detentora de visto permanente e idosa, está dispensada de substituir periodicamente seu documento de identidade, desde que tenha participado de recadastramento anterior, nos termos da Lei 9.505/97. Os brasileiros, especificamente os eleitores com deficiência, têm a garantia legal de que os juízes eleitores serão instruídos, em cada eleição, a escolher locais de votação de mais fácil acesso (Lei 10.226/01). Os tradutores e intérpretes da Libras, por seu turno, têm sua profissão regulamentada (Lei 12.319/10).

[1] Depois de 2008, após a ratificação pelo Brasil da Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, entende-se que o atendimento educacional especializado na rede regular de ensino perdeu o caráter preferencial e passou a ser obrigatório.

[2] Até o final de abril de 2011, está em vigor o Convênio ICMS nº 3, de 2007, que concede isenção de ICMS para automóveis  destinados ao uso exclusivo de motoristas com deficiência física. É bem possível que a vigência do convênio seja estendida, como já aconteceu outras vezes.


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