Entidades temem que lei específica diminua força do movimento

Da Redação | 12/04/2011, 00h00

Pai de Daniely, caçula de três filhos, com diagnóstico de autismo grave — aos 13 anos, ela não fala e apresenta retardo mental acentuado —, o senador Wellington Dias (PT-PI) deve ser designado esta semana, na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), relator do projeto de lei que institui uma política nacional de proteção aos direitos da pessoa com transtorno do espectro autista (TEA).

Wellington Dias estará no centro de uma controvérsia que divide o movimento das PcD e que será enfrentada no Senado. ¿O TEA está dentro das deficiências tratadas pela Convenção da ONU. Leis segregadas, como uma específica para o autismo, podem enfraquecer o conjunto das reivindicações das PcD¿, afirma a presidente da rede latino-americana das organizações de PcD, Regina Atalla, ao Jornal do Senado.

Ela reconhece, no entanto, que a convenção não tratou da prevenção, uma das grandes preocupações na área do TEA: que exige o diagnóstico precoce até os três anos de idade para estabelecer as intervenções adequadas e evitar danos irremediáveis aos autistas, como por exemplo serem tratados como esquizofrênicos (veja Especial Cidadania sobre debate ocorrido em novembro de 2010: www.senado.gov.br/noticias/Jornal/noticia.asp?codEditoria=521&dataEdicaoVer=20101123&dataEdicaoAtual=20101123&nomeEditoria=Especial+Cidadania).

A Convenção da ONU, segundo Regina, cuidou apenas da reabilitação e do atendimento das PcD. Nos Estados Unidos, Canadá e outros países desenvolvidos, as pessoas com TEA são tratadas como PcD. No Brasil, o principal pleito das entidades que representam os autistas é o atendimento diferenciado no SUS, com capacitação adequada dos profissionais. Esse foi o foco da proposta encaminhada no ano passado pela Associação em Defesa do Autista (Adefa), que instituía um sistema integrado de atendimento aos autistas.

Porém, como estabelecia competências e obrigações ao Executivo, acabou sendo considerada insconstitucional, o que exigiu da senadora Ana Rita (PT-ES) a transformação do anteprojeto em uma política de atenção ao autista com diretrizes gerais (SUG1/10), votada pela Comissão de Direitos Humanos (CDH) em 31 de março último. Um dos pontos importantes do novo texto é considerar os autistas como PcD, assegurando os direitos legais já existentes aos deficientes. Além disso, há direitos específicos como diagnóstico precoce e atendimento multiprofissional.

O novo relator exemplifica cada uma dessas necessidades específicas, em entrevista ao Jornal do Senado, pela história da própria família. Sem conseguir equilibrar o pescoço, Daniely foi diagnosticada com TEA após dez meses de nascida. Só começou a caminhar entre os quatro e cinco anos de idade. Possui atualmente quatro cuidadores (duas são babás que se alternam, além de fonoaudióloga e terapeuta ocupacional). Faz ecoterapia e estuda em uma escola da rede regular em Teresina (PI), com professores e auxiliares treinados. "Eu mesmo passei por treinamento específico para cuidar e entrar em contato com o mundo dela", conta Dias.

Os custos elevados para atender os autistas impedem que as famílias carentes possam tratá-los adequadamente. O senador defende a implantação de uma rede de serviços descentralizada. No seu estado, foram instalados 40 centros de reabilitação em várias regiões, viabilizando o atendimento não só na capital quanto no interior. E deixa claro que está aberto ao debate. "Nosso interesse não é ter lei específica, mas regras que viabilizem o atendimento especial aos autistas", esclarece.

Iluminado de azul na noite de 2 de abril, em homenagem ao Dia Internacional para a Conscientização do Autismo, o Congresso mostrou sua atenção para cerca de 2 milhões de brasileiros com TEA, segundo estatísticas da Escola Paulista de Medicina. Entre outros projetos, o Senado também vai começar a discutir a aposentadoria especial aos deficientes (PLC 40/10). Wellington Dias é favorável à adequação do benefício à expectativa de vida de cada deficiência, que é de 40 anos em média para os autistas e de 42 anos para os que têm síndrome de Down.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)