Cidadãos fiscalizam pela internet como prefeitos aplicam dinheiro público
simone-franco | 04/10/2016, 09h54
No domingo , os eleitores foram às urnas para escolher os prefeitos e os vereadores que cuidarão dos municípios pelos próximos quatro anos. O compromisso dos cidadãos com o seu município, porém, não se resume ao voto na urna eletrônica. Eles podem e devem também fiscalizar as contas do administradores municipais e a execução das políticas públicas.
Qualquer pessoa é capaz de exercer esse papel fiscalizador. O ponto de partida são os portais de transparência das prefeituras. São sites que oferecem tanto um catálogo das receitas e das despesas públicas quanto um canal de denúncia de desvios praticados por agentes públicos.
Trata-se de uma ferramenta que precisa ser oferecida por todo o poder público. O governo federal e os governos estaduais também têm seus portais de transparência
Repasses federais
Foi o senador João Capiberibe (PSB-AP) que apresentou o projeto que se transformou na Lei Complementar 131/2009, que tornou obrigatória a divulgação pela internet, em tempo real, de informações detalhadas sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos estados e dos municípios.
O processo de transparência nas contas públicas começou antes, com a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000). Os dispositivos das leis de 2000 e 2009 foram reforçados pela Lei de Acesso à Informação (Lei 12.257/2011). As três normas dão esteio ao funcionamento do Portal da Transparência do Governo Federal, uma ferramenta operada pelo Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria- -Geral da União que permite ao cidadão fiscalizar a aplicação das verbas públicas.
O Portal da Transparência não reúne só a movimentação federal. O cidadão também encontra informações sobre recursos da União repassados para os estados e os municípios, seja via transferências obrigatórias (Fundo de Participação dos Estados e Fundo de Participação dos Municípios), seja por meio de convênios. Essas informações estão no espaço “Transparência nos Estados e Municípios”, onde há links para os portais de transparência dos estados e dos municípios.
Cursos gratuitos
Preocupado em incentivar os cidadãos a fiscalizar as finanças dos municípios, o Ministério da Transparência criou o programa Olho Vivo no Dinheiro Público, que oferece atividades presenciais e à distância.
O ministério também promove cursos gratuitos on-line sobre controle interno, licitações, contratos administrativos e controle social do Fundeb. Os interessados podem acessar o site da Escola Virtual do Ministério da Transparência.
Os cidadãos devem denunciar desvios ou irregularidades em seu município. Se a malversação envolver verbas federais, a denúncia pode ser feita ao Ministério da Transparência (veja link no final da página ao lado). Os fatos devem ser descritos de forma clara, simples e objetiva, se possível com nomes, locais, datas e documentos, de forma a viabilizar a investigação.
Na cidade, a fiscalização é feita pela Câmara Municipal, pelo Ministério Público Estadual, pelo Tribunal de Contas do Estado — ou pelo Tribunal de Contas do Município, se houver.
Cartilha do Senado incentiva proximidade entre vereador e povo
A Consultoria Legislativa do Senado e o Instituto Legislativo Brasileiro (ILB) devem editar em breve o Manual do Vereador. A publicação se baseia num estudo elaborado pelo consultor legislativo Victor Marcel Pinheiro e aborda, entre outras questões, as formas de participação popular nas atividades do Poder Legislativo municipal.
— O Manual do Vereador tem os objetivos de esclarecer o papel de cada ator político dentro do município e de incentivar o vereador a aceitar uma maior aproximação do cidadão aos trabalhos da Câmara Municipal — explica Pinheiro.
De acordo com o consultor legislativo, a publicação pretende reforçar a consciência parlamentar sobre o direito de petição do cidadão — seu direito de buscar informações, dar sugestões e exigir providências dos agentes públicos municipais.
Essa prerrogativa foi reforçada com o advento da Lei de Acesso à Informação (LAI), de 2011, que estabeleceu dois tipos de transparência: a ativa, quando o poder público disponibiliza os dados aos cidadãos em seu portal na internet, e a passiva, quando o cidadão não encontra o que procura e precisa apresentar uma petição para ter acesso à informação desejada.
Pinheiro reconhece as dificuldades enfrentadas pelos municípios para cumprir a LAI e estruturar os seus portais de transparência. Uma saída possível, assinalou, é recorrer à capacitação oferecida pelo programa federal Brasil Transparente.
Direito de petição
Ele observou que a carência de suporte técnico na área é tão grande que a LAI dispensou os municípios com menos de 10 mil habitantes de publicar a movimentação de suas receitas e despesas na internet. Pinheiro acredita, entretanto, que essa flexibilidade deverá ser revista em breve, considerando que a ideia da lei é justamente cobrar dos municípios que se estruturem para dar publicidade irrestrita a suas contas.
— Tenho batido cada vez mais na tecla do direito de petição, ainda pouco conhecido da população. Os órgãos públicos têm o dever de responder ao questionamento ou à sugestão feita, apresentando as razões pelas quais acolhe ou não a solicitação. Se eu estou com um problema na minha rua e levo isso ao conhecimento da prefeitura, ela precisa dizer que recebeu a solicitação de informações e tem de fazer a avaliação de seu conteúdo — sustenta o consultor legislativo.
Após pressão popular, verba de câmara municipal é cortada à metade
Os avanços no controle social de gastos públicos ainda são lentos, mas experiências inovadoras têm surgido. Na semana passada, o Observatório Social do Brasil (OSB) marcou “um grande gol”, nas palavras de sua diretora-executiva, Roni Enara Rodrigues. O episódio celebrado foi a aprovação de um projeto de iniciativa popular que cortou 50% nos recursos transferidos pela prefeitura para a Câmara Municipal de Tubarão (SC). Com isso, o repasse mensal de 6% do orçamento municipal despencou para 3%.
— Isso é um fato inédito. Do conhecimento que temos, nenhuma câmara havia feito isso — diz Roni, que espera que o exemplo seja levado a outros municípios.
Custo exagerado
Para a diretora-executiva da OSB, não adianta a sociedade brigar pela redução do número de vereadores ou dos salários deles. A mudança nos gastos do Poder Legislativo municipal só vai acontecer com a diminuição nas verbas repassadas pela prefeitura.
— Isso foi provado em Tubarão. O custo da câmara municipal era muito maior do que o de outras cidades da região de mesmo porte, então era possível trabalhar com um valor menor. Ficou provado ainda que era exagerado o número de cargos comissionados: três vezes maior que o de efetivos, totalmente fora do que manda a lei — explica Roni.
Consciência e atitude
O feito obtido em Tubarão foi gestado por mais de um ano e resultou da parceria entre o OSB e entidades locais empresariais e de serviços.
— Os cidadãos foram para a câmara municipal e se posicionaram. A mídia também se posicionou. Foi assim que a coisa aconteceu. Se não houvesse essa união e essa pressão, provavelmente a coisa não teria saído. Isso mostra que a consciência aliada à atitude faz as mudanças de que a gente precisa — ela afirma.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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