Collor relembra sanção do Código de Defesa do Consumidor há 30 anos
Rodrigo Baptista | 11/09/2020, 11h29
Antes do Código de Defesa do Consumidor (CDC), as relações de consumo eram caso de polícia. A afirmação é do senador Fernando Collor (Pros-AL) que há 30 anos, quando ocupava a cadeira de presidente da República, sancionou a Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, do CDC. Outros senadores também comemoraram nesta sexta-feira (11) o legado do código, agora "trintão", criado para proteger consumidores de abusos de empresas.
Sem o CDC, as relações de consumo eram reguladas pelo Código Civil, que se mostrava insuficiente para atender consumidores insatisfeitos com produtos e serviços. Demanda da sociedade, a elaboração do Código de Defesa do Consumidor foi incluída na Constituição de 1988 pela Assembleia Constituinte, prevista no art. 48, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias do texto constitucional.
Em maio de 1989, o então senador Jutahy Magalhães (PMDB-BA) apresentou o Projeto de Lei do Senado (PLS) 97/1989. Aprovado em agosto do mesmo ano pelos senadores, o texto seguiu para a Câmara dos Deputados, onde tramitou como PL 3.683/1989, tendo sido aprovado em definitivo em agosto de 1990. Encaminhado à sanção, o projeto foi assinado pelo então presidente Fernando Collor em 11 de setembro daquele ano.
— O legado fundamental dessa norma é que a relação dos consumidores com fornecedores deixou de ser um caso de polícia porque, quando era regulado pelo Código Civil, entravam as questões policiais no meio nas reclamações de consumidores em relação a alguma questão não resolvida. O Código de Defesa do Consumidor representou na época sobretudo um avanço civilizatório — disse Collor à Agência Senado.
Entre outras inovações para evitar que consumidores — parte mais fraca na relação de consumo — sejam prejudicados, o CDC trouxe a obrigatoriedade de empresas estamparem o prazo de validade nas embalagens de produtos; definiu como direito do consumidor a proteção contra propaganda enganosa e consagrou o direito de arrependimento, que dá ao consumidor o prazo de sete dias para desistir da compra sem precisar se justificar. Além de trazer equilíbrio para as relações de consumo, o Código de Defesa do Consumidor ajudou a melhorar a qualidade dos produtos, avalia o senador Paulo Paim (PT-RS), que integrou entre 2012 e 2014 uma comissão do Senado para atualizar o CDC.
— Ao impor aos fornecedores o dever de informar, o CDC possibilitou aos consumidores ter conhecimento dos produtos, contribuindo para melhoria da qualidade da produção, comercialização, ofertas mais claras e combate à propaganda enganosa. O consumo é uma atividade central na sociedade contemporânea e, decorridos 30 anos, o Código de Defesa do Consumidor continua sendo uma norma fundamental — apontou Paim, que era deputado federal no período de aprovação do CDC pelo Congresso.
E a “lei pegou”, como aponta o presidente da Comissão de Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC), senador Rodrigo Cunha (PSDB-AL). Ele destaca que muitos brasileiros conhecem hoje seus direitos nas relações de consumo.
— No Brasil, dizemos que tem leis que “pegam”. O CDC é uma destas normas. A maioria dos brasileiros tem conhecimento do Código de Defesa do Consumidor e confia nos Procons, que foram por este normatizados. Dentre os principais legados práticos estão a adequação da segurança dos produtos que foi elevada aos padrões europeu e americano com a edição da norma, a adequação do modo de defesa do consumidor em juízo com o reconhecimento de sua vulnerabilidade e a adequação das ações coletivas para tutela mais célere do cidadão — disse o senador.
Desafios
Passadas três décadas de sua edição, o CDC, que colocou o Brasil em linha com as mais modernas leis de proteção aos consumidores, continua sendo importante para orientar a relação fornecedor-consumidor. Porém, como diz o cantor e compositor Cazuza, “o tempo não para” e a norma precisa de atualizações, uma “recauchutada”, como dizem alguns, ou “um tapa no visual”, como dizem outros, para se adequar aos novos tempos de crescente comércio eletrônico.
— O principal desafio que nós temos agora é o de atualizar e de aprimorar o Código de Defesa do Consumidor tento em vista as relações de consumo terem mudado bastante nos últimos 30 anos. Agora, estamos na época do e-commerce, estamos na época da internet das coisas, estamos na época do 5G, da inteligência artificial. Então, essas relações de consumo avançaram demais e para terrenos nunca antes possíveis de serem imaginados. Então, naturalmente, nós precisamos atualizá-lo para torná-lo contemporâneo — apontou Fernando Collor.
Atualização
Uma tentativa de atualizar o CDC e ajustá-lo aos tempos de vendas pela internet foi encabeçada pelo Senado a partir de 2012 quando uma comissão temporária ficou encarregada de analisar e oferecer sugestões de uma comissão de juristas. O resultado: o Plenário da Casa aprovou em 2015 os PLS 281/2012 e o PLS 283/2012, ambos assinados pelo ex-senador José Sarney. O primeiro cria um marco legal para o comércio eletrônico enquanto o segundo tenta prevenir o superendividamento das famílias. Os dois projetos de atualização do CDC foram encaminhados à Câmara, onde aguardam decisão dos deputados.
— A atualização na verdade não se concretizou. Assim como o PL do superendividamento que está pronto para ser votado na câmara, o PL do comércio eletrônico ainda está em análise por aquela casa. Temos um decreto de adequação, mas há muito a se avançar no tema: desde a segurança das transações até a alteração de normas que afetam o comércio internacional e, portanto, as leis de introdução às normas do direito brasileiro. Além disso, precisamos entender se as normas do SAC [Serviço de Atendimento ao Consumidor], por exemplo, estão adequadas para os meios de consumo online, se há segurança suficiente contra pirataria e tantos outros temas. O assunto merece avançar — disse o senador Rodrigo Cunha.
Paulo Paim (PT-RS) considera que o Código de Defesa do Consumidor carrega princípios que oferecem parâmetros e regras no ambiente online, mas não descarta novos aperfeiçoamentos diante dos desafios do mundo digital.
— Com o avanço contínuo da economia digital, das redes sociais, das plataformas de intermediação, além da possibilidade de aquisição de produtos, serviços ou conteúdos digitais por meio de aplicativos, bem como novas formas de contratação na chamada economia de compartilhamento desafia novos aperfeiçoamentos da legislação consumerista para que seja capaz de solucionar os novos conflitos daí advindos. Ainda é necessário avançar no CDC no sentido da ação de educação financeira e ambiental, na prevenção, tratamento e proteção do superendividamento dos consumidores — avalia.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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