Por causa da humilhação, familiares deixam de visitar adolescentes

Da Redação | 01/12/2015, 12h45

Raquel Lima, do projeto Justiça sem Muros, diz que vínculo afetivo é essencial. Foto: ITTC - Instituto Terra, Trabalho e CidadaniaAs revistas vexatórias são o maior obstáculo para a manutenção do vínculo afetivo dos adolescentes que cometeram atos infracionais com suas famílias. Na avaliação das entidades de direitos humanos e dos especialistas que atuam na área, a revista vexatória tem impacto direto na redução das visitas. Porque, por um lado, os parentes não querem passar pela situação considerada humilhante e, por outro lado, os próprios adolescentes pedem que eles não os visitem para não precisarem passar por ela.

 

— O primeiro impacto é a diminuição do contato com a família. Pais e irmãos, principalmente, deixam de visitar o interno. As mães são as que persistem porque, mesmo com o pedido dos adolescentes para que não apareçam, continuam indo — afirma Raquel Lima, coordenadora do projeto Justiça sem Muros, do Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC).

 

Raquel explica que o contato com a família é essencial para a manutenção do vínculo afetivo e para ressocialização dos adolescentes. Nesse estágio do desenvolvimento emocional, eles precisam do contato familiar para amadurecer e saber que têm para onde voltar depois do cumprimento da medida socioeducativa.

 

Fila de parentes

 

A subsecretária do Sistema Socioeducativo do Distrito Federal, Maria Conceição Paula, ressalta que, em sua maioria, os adolescentes que cometem atos infracionais têm relações conturbadas com a família, principalmente com o pai. Ao ter esse contato reduzido de forma significativa durante os meses ou anos de internação, as relações afetivas ficam ainda mais comprometidas.

 

— Se olharmos uma fila de parentes à espera de visitar um interno nessas unidades, veremos em sua maioria senhoras. Um ou outro homem apenas. Em geral, um avó. A família não aguenta enfrentar as revistas como elas são. Se acabassem, conseguiríamos ampliar a participação familiar [com tias, avós, primos] na ressocialização desses jovens e teríamos um resultado muito mais positivo — argumenta.

 

A advogada da ONG internacional Conectas Direitos Humanos, Vivian Calderoni, alerta ainda para outro problema das revistas íntimas. Além de os parentes passarem pelos procedimentos vexatórios, os próprios adolescentes são revistados várias vezes ao dia, a cada atividade que fazem fora dos quartos.

 

— Muitas vezes, eles não querem mais ir para as atividades para não passarem por esse constrangimento muitas vezes num mesmo dia. E isso é interpretado como se eles fossem vagabundos, que não quisessem nem sequer sair das camas — diz.

 

Outra questão das revistas íntimas é que é sempre o mesmo servidor a acompanhar o menor e revistá-lo, o que acaba criando um convívio ruim entre as duas partes. Maria Conceição admite que a situação é constrangedora também para os responsáveis pela revista, que costumam apoiar a adoção de aparelhos eletrônicos para substituí-las.

 

No final do ano passado, o Núcleo Especializado de Infância e Juventude da Defensoria Pública do Estado de São Paulo lançou uma nota de repúdio à realização de revista vexatória aos visitantes de adolescentes custodiados no Sinase. Junto à nota, foi criado um abaixo-assinado pedindo o fim da revista vexatória no sistema socioeducativo. Mais de 1,6 mil pessoas assinaram.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)