Posição exigida para a mamografia impossibilita que muitas mulheres com deficiência física consigam fazer o exame, que é essencial à prevenção do câncer do mama. Foto: Milton Michida/Governo do Estado de SP

 

A mamografia é como um raio X dos seios. Para fazer o exame, a mulher fica de pé, sem roupa na parte de cima e as mamas são, uma a uma, comprimidas pelo mamógrafo. Incomoda? Sim, incomoda, mas é, segundo a Sociedade Brasileira de Mamografia, o caminho mais seguro para a detecção precoce do câncer de mama.

 A estudante Carla Karine Oliveira nem se aborreceu muito com o mal-estar causado pelo exame. O que a deixou revoltada foi descobrir, na prática, que, para as mulheres com deficiência motora, fazer a mamografia é quase impossível. Como ficar em pé, conforme exigido?

 Carla faz parte de um universo de mais de 8 milhões de brasileiras com deficiência física, segundo o Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

 As dificuldades de as mulheres deficientes fazerem a mamografia foram tema de um debate promovido pela Procuradoria da Mulher do Senado, como parte da programação do Outubro Rosa. Foi lá que Carla contou sua história.

 Depois de uma cirurgia bari- átrica, a estudante de 32 anos decidiu tentar na rede pública de saúde do Distrito Federal as operações plásticas reparadoras. Em uma das consultas pré-operatórias, informou à médica que tinha sentido um caroço no seio.

 — Foi quando começou a minha saga para fazer a mamografia e a ecografia. A ecografia eu consegui fazer no hospital, mas aí começou a grande dificuldade — desabafou a moça.

 Um dos significados do substantivo feminino saga, de acordo com o Dicionário Houaiss, é: “sequência de acontecimentos fecunda em incidentes”. A história de Carla se encaixa bem nessa definição.

 Além de deficiente, a estudante não tem condições financeiras para pagar pelos exames nas clínicas particulares. O jeito é fazer pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Só que, apesar de estar na região com a maior renda per capita do Brasil, também é difícil marcar os exames de detecção do câncer de mama em Brasília.

Preparo físico

 Nas comemorações do Outubro Rosa de 2016, as mulheres reclamaram que a espera para a mamografia é de até dois anos. Além disso, dos 12 mamógrafos da rede pública do Distrito Federal, apenas 4 estavam funcionando no começo de outubro, segundo a Secretaria de Saúde. Até que, para Carla, o exame de ecografia mamária foi marcado facilmente. Mas como se deslocar da cadeira de rodas para a maca, como exigido para o ultrassom?

 — Ainda bem que eu faço exercícios físicos e, por isso, tive força para sair da cadeira e me deitar na maca — contou a estudante, ciente das dificuldades ainda maiores das deficientes sem o mesmo preparo físico.

 Marcar a mamografia foi mais complicado. Demorou bastante, mas chegou o dia. Foi quando Carla entendeu que sem adaptações de acessibilidade é praticamente impossível para as paraplégicas ou tetraplégicas fazer o preventivo.

 — Como fazer a mamografia em pé? Infelizmente, eles não estão preparados para os exames. Eles perguntam assim: mas você não consegue ficar em pé nem um pouquinho? A gente não fica em pé nem um pouquinho, então não tem como fazer — contou Carla.

 Mais uma vez devido aos exercícios físicos, ela conseguiu erguer o corpo para ficar um pouco mais alta e fazer a mamografia. Apesar do esfor- ço, a imagem não ficou boa e a médica mandou repetir. Mais espera, mais aborrecimentos, mais complicações. Entre o primeiro exame e o segundo, o caroço dobrou de tamanho. O nódulo no seio de Carla Karine era benigno. Não era câncer.

 — Os equipamentos não são adequados. Não só para mim, que sou cadeirante. E uma mulher que tem nanismo? Uma mulher anã. Ela também é uma mulher. Ela precisa fazer o exame. Não são apenas as cadeirantes. Há outras mulheres que têm uma dificuldade. Precisamos de macas que sobem e descem — reivindica Carla.

 Larissa Bortoni


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