Agência Pública do Trabalhador, no DF: crise econômica gera desemprego, que gera mais crise, formando círculo vicioso. Foto: Alessandro Dantas/Agência Senado

 

A meta fiscal aprovada na madrugada de quarta-feira pelo Congresso prevê um deficit de R$ 170,5 bilhões nas contas do governo, valor superior à previsão anterior que era de R$ 96 bilhões. Mas o que isso significa? Como afeta o bolso e a vida da população?

 A meta revela a política fiscal estabelecida pelo governo com o objetivo de mostrar a sua capacidade de saldar compromissos. Ela é resultado da diferença entre dois valores: a expectativa de receita e a expectativa de despesas. Dessa conta, é possível obter um superavit (saldo positivo) ou deficit (saldo negativo).

 Quando o saldo é positivo, o governo consegue economizar para pagar os juros da dívida. Já o deficit de um país reflete que ele gasta mais do que arrecada. É como se os valores das contas de uma família fossem superiores aos ganhos de todos os que moram na casa em um determinado mês.

 É a situação que ocorreu com a família de Maria Francisca Soares. Há dois anos, ela viu o orçamento apertar quando o marido, Alessandro Silva, perdeu o emprego. Depois de pagar água, luz e fazer as compras, ficou difícil amortizar o financiamento da casa própria. Para compensar e sair do vermelho, ela teve que apelar para um empréstimo, contraindo uma nova dívida.

 Para pagar o empréstimo, Maria, que trabalha como faxineira em Brasília, foi atrás de mais serviço nos meses seguintes. Além disso, ela e Alessandro cortaram alguns gastos: tiraram a filha da escola particular e diminuíram os passeios nos fins de semana.

 — Eu tinha um planejamento, mas o desemprego do meu marido me pegou desprevenida — lamentou Maria.

 O orçamento das famílias como a de Maria é menos complexo, evidentemente, do que o Orçamento da União. Se o governo não consegue economizar o suficiente para fazer frente aos seus compromissos, ele passa a recorrer a medidas como aumentar impostos para as famílias e as empresas e cortar gastos que não são obrigatórios, como investimentos públicos.

Também pode emitir títulos públicos, que são comprados por investidores do mercado. É uma espécie de “empréstimo”: o governo põe os títulos à venda com o compromisso de resgatá-los de acordo com prazos, juros e outras condições predeterminadas. Esses títulos compõem a dívida pública.

 Assim como Maria, o governo interino de Michel Temer resolveu fazer um esforço e criar um teto para o crescimento dos gastos públicos, além de cortar algumas despesas. O pacote fiscal anunciado contém, entre outros pontos, uma proposta de emenda à Constituição (PEC), que será enviada para votação no Congresso, restringindo inclusive a expansão dos gastos com saúde e educação. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, também não descartou a possibilidade de o governo propor aumento de tributos. Segundo ele, porém, a ideia é não elevar impostos “num primeiro momento”.

 Perspectivas

 De acordo com o consultor de Orçamento do Senado José Ribamar Pereira, as despesas cresceram a tal ponto na última década que dificilmente o contingenciamento será suficiente para garantir um resultado financeiro positivo. Para ele, são grandes as chances de o governo precisar criar novas fontes de receita:

 — A arrecadação não está crescendo. Por outro lado, as despesas estão. E não tem como cortar muitas despesas. Parece que será necessário criar uma nova fonte de recursos para pagar a conta — disse.

Na opinião de Maria, a conta acaba sempre sobrando para a população. A impressão é corroborada pelo diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz. Segundo ele, momentos de crise impactam de forma mais significativa os trabalhadores.

 — O custo social é sentido por meio da taxa de desemprego alta, que desmobiliza uma série de ativos. A destruição dos postos de trabalho é a destruição do ativo que permite ao trabalhador a construção de um conjunto de elementos básicos para financiar o bem-estar e a qualidade de vida no âmbito privado — disse.

 Mesmo lamentando o arrocho, Maria acredita que a economia pode se reerguer, assim como ela e o marido. Recentemente ele voltou a trabalhar como segurança em eventos e não passa um final de semana sem serviço. As contas da casa, contou Maria, melhoraram:

 — Já está dando para economizar um pouco — disse.

 Rodrigo Baptista


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