Pauta Feminina debate violência contra a mulher em Ceilândia

Da Redação | 22/03/2018, 19h58

Cerca de 40 pessoas participaram, nesta quarta-feira (22), do projeto Pauta Feminina, promovido pela Procuradoria Especial da Mulher do Senado (Promul) e pela Procuradoria da Mulher da Câmara dos Deputados, em Ceilândia, de audiência pública para discutir e ouvir A Voz das Mulheres no Combate à Violência Doméstica. O evento, realizado em parceria com a Diretoria-Geral do Senado, se deu no Centro Especializado de Atendimento à Mulher (Ceam), um dos equipamentos da rede de atendimento à mulher em situação de violência no Distrito Federal.

A mediação do debate ficou a cargo da diretora-geral do Senado, Ilana Trombka, que destacou um dos objetivos da atividade desta quinta: aproximar o Parlamento brasileiro da sociedade, da comunidade e, principalmente dos locais onde estão as mulheres vítimas de violência

— Estamos realizando esta atividade, que traz o Parlamento para fora dos muros do Senado, sob o impacto de feminicídios recentes em Brasília, um na Asa Sul e outro em Ceilândia, e da morte da vereadora Marielle Franco, no Rio de Janeiro — disse Ilana Trombka.

A diretora do Senado também salientou o caráter inovador da iniciativa.

— Essa é a primeira vez que a Pauta Feminina ocorre fora da sede do Senado Federal, do Palácio do Congresso Nacional. Essa é a nossa missão: levar informação de uma legislação [Lei Maria da Penha] que foi aprovada e aprimorada no Congresso. E também aproximá-la [a mulher] do que são os seus direitos. Inclusive tivemos aqui hoje a delegacia móvel da mulher, para que se ela se desse conta de que sofre algum tipo de violência estaria aqui a infraestrutura à disposição dessa mulher — disse Ilana Trombka.

A coordenadora da Promul, Rita Polli, assinalou que levar a Pauta Feminina à Ceilândia é uma inovação e que a intenção foi aproximar os diversos órgãos do Poder Público das usuárias do serviço, pois o Ceam integra uma rede de proteção à mulher e deve ser valorizado. Ela acrescentou que “a luta da mulher é sempre conjunta”.

"Mulheres inspiradoras"

Detentora de 12 prêmios nacionais e internacionais em razão de seu projeto “Mulheres Inspiradoras", a professora Gina Vieira Ponte falou sobre o trabalho que idealizou e realizou no Centro de Ensino Fundamental 12, em Ceilândia.

Segundo Gina, após sofrer uma "crise de esgotamento mental',  que associou a uma frustração de seu projeto de fazer da educação uma ferramenta de transformação, começou a refletir sobre a distância existente entre a escola e os alunos e alunas.

— Temos uma escola que gera evasão, repetência e fracasso escolar porque não dialoga com seus jovens. A juventude vira as costas para a escola porque a escola virou as costas para elas — disse Gina.

De acordo com a professora, uma polêmica em torno de vídeo de conteúdo sensual produzido por uma aluna inseriu uma "discussão inovadora", para refletir com os estudantes sobre a beleza como único valor a ser cultivado pelas meninas.

Mediante a leitura de livros sobre grandes mulheres, ela procurou aumentar o repertório dos jovens, que aumentaram inclusive a sensibilidade para as “mulheres inspiradoras” presentes em suas famílias:

— Eu quis mostrar que a beleza, como único valor atribuído às mulheres e incentivado nelas, nos torna presas de um ‘dispositivo amoroso’ e de um ‘dispositivo materno’, e nos afasta de outros dispositivos, como os de poder, onde a participação feminina está brilhantemente representada pelas mulheres desta mesa — observou.

Transformação

Sandra Melo, delegada-chefe da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam), disse que sempre se dedicou à causa da mulher. Delegada há 22 anos, Sandra foi nomeada diretora do presídio feminino em 2000. Ela contou um pouco de sua experiência.

— A mulher é penalizada até na hora de cumprir a pena, pois as visitas de seus companheiros escasseiam após 2 ou 3 meses, ao passo que o homem preso sempre conta com a lealdade, apoio e constância das visitas das companheiras — denunciou.

Em 2007, Sandra foi designada para ficar à frente da Deam, a 2ª delegacia da mulher criada no Brasil, em função da lei 11.340/2006. Ela ressaltou que houve "um momento antes e um momento depois da Lei Maria da Penha” e avalia que para ela também há dois momentos na sua atuação frente a violência contra a mulher. A delegada concluiu que "passou-se de uma fase de sensibilização a uma fase de transformação".

— Hoje a Polícia Civil do Distrito Federal valoriza muito a especialização do trabalho, com o estabelecimento de protocolos de trabalho adequados à investigação de crimes associados à violência de gênero — explica.

Planos

Chefe do CEAM-Ceilândia, criado em setembro de 2014, Érika Laurindo destacou o trabalho de articulação com a rede social de Ceilândia, que permite atender às demandas diversas do público.

Érika também valorizou a importância do trabalho interdisciplinar, com a cooperação de pessoas de serviço social, psicologia, pedagogia e direito, cujos pontos de vista colaboram no fortalecimento das mulheres.

— Quando a gente fala em violência, deve considerar que há ‘fatores de risco’ e ‘fatores de proteção’. A gente conversa com as mulheres sobre coisas que podem enfraquecê-las — o isolamento social, a falta de acesso ao mercado de trabalho, etc. — ou fortalecê-las — disse.

Para Érika, é importante que as mulheres tenham um "plano de segurança", o que inclui ter consigo documentos, chaves para sair, etc. — e, acima de tudo, um ‘plano de vida’, que lhes dê uma noção do que queremos. O que nos faz levantar todos os dias é ter um projeto”.

Direitos

Lívia Gimenes Dias da Fonseca, advogada, integrante da equipe de coordenação do projeto Promotoras Legais Populares, falou sobre a iniciativa que une práticas dialógicas baseadas em Paulo Freire e do Direito Achado na Rua.

—Temos que pensar ‘mais mulheres na política’ em outros sentidos também, que contemplem a atuação social em outro sentido — afirmou.

Presente em vários estados, as promotoras legais populares ensinam as mulheres a buscar seus direitos e a se transformar em procuradoras de direitos de outras mulheres. Em Ceilândia o grupo se reúne no Núcleo de Prática Jurídica da Universidade de Brasília, e em São Sebastião, no Colégio Centrão.

Participantes

Maria do Socorro da Cruz deu um depoimento sobre a importância do Ceam.

— Esta casa é uma casa de apoio. Quando vim a esta casa, me sentia um nada. Essa casa me ensinou a acreditar que eu posso sim ter um recomeço. Eu tinha muito medo de expor a minha vida e aqui nesta casa eu consegui me abrir me enxergar, porque a gente não diz o que nós passamos pra ninguém. Nós fazemos imagem do que nós não somos: de uma mulher feliz, de um casamento ótimo — contou.

Também estiveram presentes Ana Paula Damasceno, coordenadora de Enfrentamento à Violência contra Mulheres, da Secretaria Adjunta de Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos (Samidh) do Governo de Brasília; Marília Serra, servidora do Senado e uma das fundadoras da Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas — Abrafh; Giancarlo Parra Lima, da Administração de Taguatinga; Henrique Marques Ribeiro, coordenador do Observatório da Mulher contra a Violência (OMV) do Senado; e Mara Dall’Negro, presidente da seção brasiliense do Fórum de Mulheres  do Mercosul.

Com informações da assessoria de imprensa da Procuradoria Especial da Mulher do Senado

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)