Participantes de audiência na CDH criticam PEC que reduz maioridade penal

Da Redação | 24/10/2017, 21h35

Participantes de audiência pública realizada nesta terça-feira (24) pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) manifestaram-se contrárioa a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 33/2012 que reduz a maioridade penal.

O texto, que está em tramitação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), abre a possibilidade de julgamento de adolescentes entre 16 e 18 anos pelo Código Penal e não pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

Primeiro a discutir o tema, o advogado representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Renato da Costa Figueira, considerou inoportuno o debate. Para ele, no momento, em face da superlotação do sistema prisional brasileiro, seria mais importante discutir alternativas da pena de prisão, deixando esta apenas para os crimes mais graves e para deliquentes comprovadamente de alta periculosidade.

— Esta PEC é inoportuna. Ela é inconveniente. Ela é desaconselhável. O fulcro motivacional deste texto sabemos, é esta discussão de que a criminalidade aumentou assustadoramente e, de outro lado, o problema da insegurança da sociedade brasileira. Então se entendeu que o mais indicado, o mais simples é adotar uma PEC reduzindo a maioridade penal de 18 para 16 anos — disse Renato da Costa Figueira.

No mesmo sentido, Cezar Roberto Bitencourt, professor doutor em Direito Penal, alertou para o fato de que a redução da maioridade penal não será capaz de melhorar as condições de segurança pública no Brasil.

Segundo, ele a colocação de adolescentes junto com adultos, num sistema prisional, é uma medida absurda, sobretudo quando se sabe que nossas penitenciárias “nunca recuperaram ninguém e se transformaram em grandes escolas do crime”.

Cezar Roberto Bitencourt criticou o argumento utilizado pelos defensores da proposta de que a maioria dos crimes são praticados por menores a serviço de bandidos adultos. Em sua avaliação, em vez de se criminalizar os menores deveria antes ser dobrada a pena para adultos que utilizam menores para a prática de delitos.

— Menor não precisa de prisão, precisa de educação, precisa de escola, precisa de políticas sociais, de creches de trabalho, de lar — afirmou.

Coordenando o debate, o senador João Capiberibe (PSB-AP) criticou a "política de encarceramento”, que segundo ele, vem sendo implementada nas últimas décadas por vários governos.

— O Congresso Nacional aprovou a política do encarceramento, mas esqueceu de fazer as penitenciárias. Não imaginou que iria crescer de uma forma absurda a população carcerária do país e não destinou recursos. Nós somos irresponsáveis para com a sociedade brasileira — disse Capiberibe.

Zama Neff, diretora-executiva da Divisão de Direitos das Crianças e Adolescentes do Human Rights Watch, falou sobre o posicionamento contrário a redução da maioridade penal nos Estadops Unidos.

Segundo ela, pesquisas recentes em vários estados norte-americanos, conduzidas pelo Departamento de Justiça, demonstraram a inconveniência da medida.

— A partir da experiência da Human Rights Watch, trabalhando em vários países e examinando o tratamento de crianças  e adolescentes em conflito com a lei, nós concluímos que reduzir a maioridade penal no Brasil vai na contramão não apenas da tendência internacional, mas também da pesquisa internacional sobre o desenvolvimento do cérebro do adolescente — disse Zama Neff.

Citando um estudo realizado no Arizona, Zama Neff observou que o julgamento de adolescentes como adultos no sistema de justiça prejudicou o seu desenvolvimento psicossocial, a formação de identidade, a educação, o desenvolvimento de habilidades fundamentais e a transição para a vida adulta.

— Em conclusão: ao invés de replicar políticas fracassadas que já demonstraram prejudiciais aos adolescentes e a própria sociedade, os legisladores brasileiros deveriam considerar maneiras de investir e melhorar o atual sistema sócio-educativo no Brasil — recomendou Zama Neff.

Elisa Cruz, defensora pública da Infância do Estado do Rio de Janeiro e vice-coordenadora da Comissão da Infância da Associação Nacional dos Defensores Públicos, chamou a atenção para a falta de dados no Brasil que permitam a avaliação adequada do sistema sócio-educacional da infância.

— Não sabemos no momento quantos adolescentes são apreeendidos ou respondem a medidas  de internação ou semi-liberdade. Não sabemos sua historia de vida, cor, etnia, credo, questões sócio-econômicas, se trabalha ou não e não temos a certeza dos crimes pelos quais estão respondendo — criticou Elisa Cruz.

Já o conselheiro voluntário da Educafro e assessor do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux, Irapuã Santana, apresentou  dados demonstrando a predominância de jovens negros entre os brasileiros mortos pela polícia no país.

Juliana Coelho de Lavigne, presidente da Associação dos Defensores Públicos do Estado do Rio Grande do Sul também considerou a PEC 33/2012 como um retrocesso, sobretudo em razão da falência do sistema prisional brasileiro.

— Nós queremos  colocar um adolescente em desenvolvimento dentro deste sistema prisional falido é um paradoxo. É preciso que comecemos a refletir onde queremos chegar com esse nosso sistema de Justiça — disse ela.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)