Na CPI, senadores veem indícios de erros do governo; governistas reclamam de indução

Da Agência Senado | 06/05/2021, 22h13

Os senadores avaliaram de forma positiva a primeira semana de oitivas da CPI da Pandemia. Foram ouvidos os ex-ministros da Saúde Henrique Mandetta e Nelson Teich, na terça (4) e na quarta-feira (5), respectivamente. O titular da pasta, Marcelo Queiroga, também foi ouvido pela CPI na quinta-feira (6), em uma audiência que durou cerca de 10 horas.  

Na visão do vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), os depoimentos dos ex-ministros Mandetta e Teich deixaram clara a existência de um comando paralelo para tratar dos assuntos da pandemia, com atores que não tinham relação com a Saúde. Para o senador, a existência desse comando paralelo colaborou com a saída de Mandetta e Teich.

Randolfe lembrou que a CPI ainda não ouviu o ex-ministro Eduardo Pazuello, também da Saúde. De acordo com o senador, porém, tudo indica que esse comando paralelo se efetivou durante a gestão de Pazuello e terminou por agravar a pandemia no país. Com o ministro Marcelo Queiroga, ressaltou o senador, tenta-se voltar à condução sanitária devida, mas ainda sob fortes resistências — que seriam impostas pelo próprio presidente da República, Jair Bolsonaro.

— É possível perceber que tem uma coisa na cabeça do presidente e outra na cabeça de qualquer médico ou técnico que vá para o Ministério da Saúde — destacou Randolfe, lembrando que a CPI poderá fazer uma diligência sobre um possível estoque de cloroquina no governo.

Neutralidade

O senador Marcos Rogério (DEM-RO) definiu a semana da CPI como “intensa”, com depoimentos importantes. Para ele, é necessário ouvir tanto os anteriores como o atual ministro da Saúde, como forma de coletar fatos, impressões e provas. Para Marcos Rogério, a oposição tem narrativa pronta e está preocupada em criar uma peça acusatória. O senador também criticou as conduções dos depoimentos, que estariam “forçando a barra e intimidando os depoentes”.  

— Uma CPI tem que partir de um pressuposto de neutralidade. Espero que a gente possa avançar e, daqui a pouco, ir para os estados e municípios, e entregar a verdade ao Brasil — disse o senador.

Na opinião de Marcos Rogério, a CPI precisa ter uma "visão ampla", recolher informações com a maior amplitude possível e não preencher “um rascunho do relatório já previamente elaborado”. Ele disse que é fundamental que as testemunhas tenham liberdade para dizer o que sabem e não o que o relator, o senador Renan Calheiros (MDB-AL), quer que elas digam.

Na mesma linha, o senador Eduardo Girão (Podemos-CE) disse que a CPI da Pandemia "já começa parcializada e mirando apenas as ações do governo federal". Para Girão, é importante a população acompanhar os trabalhos da CPI para evitar que as investigações se limitem às ações do governo federal e, com isso, ocorra a "blindagem" de agentes públicos estaduais e municipais. Ele afirmou que não pode prosperar a tese de que as apurações só devem alcançar estados e municípios quando houver a participação de algum agente federal numa irregularidade.

— Estamos tentando evitar que a CPI vire palanque para 2022. A gente está querendo fazer o trabalho mais justo e independente possível — declarou Girão.

Bolsonaro

Para o senador Rogério Carvalho (PT-SE), a primeira semana de oitivas da CPI da Pandemia permitiu ter uma ideia da participação de Jair Bolsonaro na expansão da pandemia. O senador sublinhou que o presidente defendeu remédios sem eficácia, incentivou aglomerações, vetou o uso de máscaras para proteção contra o vírus e não buscou as vacinas para imunizar a população. Rogério Carvalho acrescentou que Bolsonaro continua a atrapalhar a entrega de insumos ao país por conta de acusações à China e segue a combater o isolamento social, necessário para conter a pandemia.

Na opinião do senador Humberto Costa (PT-PE), a primeira semana de CPI foi "muito boa". Para ele, os depoimentos dos ex-ministros da Saúde mostraram que, na prática, Bolsonaro tentava mudar as orientações técnicas de enfrentamento à pandemia, ignorando princípios científicos adotados ao redor do mundo.

— O tempo inteiro os depoentes corroboraram a visão de que Bolsonaro atuou intencionalmente para que houvesse uma transmissão ampla do vírus, para que fosse atingida o que se chama de imunidade coletiva de rebanho. Isso, na pratica, é um grande crime, se for verdade, pois ele assumiu o risco de muita gente morrer, o que efetivamente aconteceu — lamentou.  

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) definiu a semana como “produtiva”. Ele disse que ficou clara a responsabilidade direta de Bolsonaro na definição da política de saúde. Ele ressaltou que os ex-ministros Mandetta e Teich deixaram a pasta por não concordarem com as interferências do presidente. A senadora Simone Tebet (MDB-MS) disse que o depoimento de Mandetta deixou claro que sua saída se deu por tentar alertar o governo dos perigos da pandemia. Ela disse que é muito grave a informação de que o governo ventilou mudar a bula da cloroquina para que o remédio fosse considerado indicado para a covid-19.

— Esta CPI vai buscar a verdade dos fatos. Houve omissão? De quem? Quem são os responsáveis? Essa pandemia não caiu do céu. Alguma coisa aconteceu e alguém tem que ser responsabilizado por isso — declarou a senadora.

Relações Exteriores

Quanto aos próximos convocados, Humberto Costa disse que o depoimento do ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo se justifica pelo fato de ele ter tido um papel importante na criação de dificuldades para a negociação de vacinas contra a covid-19. Rogério Carvalho também destacou a convocação do ex-chanceler. De acordo com o senador, Araújo tem muito a esclarecer sobre o que não fez e porque não se mobilizou para salvar vidas, com parcerias internacionais e busca de tecnologia, fechando as portas em várias partes do mundo que poderiam estar ajudando o país neste momento.

— Se a CPI focar no crime contra a vida que vem sendo cometido, a gente vai chegar à responsabilização de agentes públicos da República, que agiram para garantir a expansão da pandemia e não pelo seu controle — afirmou o senador.

Para o senador Alessandro Vieira, a oitiva de Araújo é relevante. Ele disse que é importante ouvir o ex-ministro para entender o relacionamento do Brasil com outros países que são grandes fornecedores de insumos ou de vacinas já prontas. Segundo Vieira, as decisões da pasta tiveram um impacto claro na baixa disponibilidade de vacinas para os brasileiros. Também para Randolfe Rodrigues, o ex-ministro Ernesto Araújo tem responsabilidade direta na política de aquisição internacional de vacinas.

— Hoje temos apenas 7% dos brasileiros vacinados. Esse atraso me parece ter uma responsabilidade direta do MRE durante a gestão do ex-chanceler — apontou o senador.  

Anvisa

Randolfe confirmou que a audiência com diretor-presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres, que também seria realizada nesta quinta, foi transferida para a próxima terça-feira (11). Na quarta-feira (12), será ouvido o advogado Fabio Wajngarten, ex-chefe da Secretaria Especial de Comunicação Social do Governo. A CPI ouvirá na quinta-feira (13) o ex-chanceler Ernesto Araújo e representantes do laboratório Pfizer.

De acordo com Randolfe, CPI vai avaliar a realização de uma reunião na sexta (14). Representantes de Butantan, Fiocruz, Sputnik, e o ex-ministro Eduardo Pazuello devem ficar para a semana seguinte. O senador confirmou a intenção de protocolar um pedido de teste de coronavírus para o ex-ministro — que alegou ter tido contato com pessoas com covid para não comparecer esta semana à CPI. Randolfe lembrou que a possível convocação de Carlos Bolsonaro, vereador do Rio de Janeiro (RJ) e filho do presidente Bolsonaro, ainda será decidida.

— Não faremos investigação para saciar nosso fígado, mas para responder aos milhões de brasileiros — declarou o senador.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)