Membros da Comissão Nacional da Verdade pedem que STF reveja Lei da Anistia

Rodrigo Baptista | 24/05/2018, 14h01

Membros da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos defenderam a revisão da Lei de Anistia pelo Supremo Tribunal Federal, em audiência pública nesta quinta-feira (24), presidida pela senadora Regina Sousa (PT-PI), na Comissão de Direitos Humanos do Senado (CDH).

Eles participaram de reunião para debater a divulgação do documento da Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA) que revela que o ex-presidente Ernesto Geisel (1974-1979) autorizou, em seu governo, a continuidade da política de execuções de opositores da ditadura militar (1964-1985).

Para os participantes do debate, a publicação dos documentos reforça a percepção de que o alto escalão do governo sabia e participava da política de execuções.

A legislação atual, editada em 1979, garante anistia aos crimes de tortura, homicídio e sequestro cometidos por agentes públicos e foi declarada constitucional pelos ministros do Supremo em 2010. O jurista Cláudio Fonteles, que integrou a Comissão Nacional da Verdade, pede que a presidente do STF, ministra Cármem Lúcia, coloque em pauta novamente a discussão sobre a constitucionalidade da norma. Para Fonteles, a Constituição de 1988 deixa claro que crimes como homicídio e tortura praticados por agentes do Estado não prescrevem:

— A Suprema Corte deste país já se pronunciou, mas não definitivamente. Não houve trânsito em julgado. É hora do Supremo Tribunal Federal se pronunciar – cobrou.

Para o também ex-membro da CNV Luiz Claudio Cunha, o maior mérito do documento recentemente revelado é alterar a forma como a história brasileira retratava o general Geisel, até então apontado como integrante da "ala moderada" do regime. Agora, segundo ele, fica claro que Geisel não era tão moderado como se acreditava.

— O documento mostra de forma crua que a realidade era muito pior do que a gente imaginava. Esse documento não estava entre os poucos que os Estados Unidos entregaram à CNV. Chegou ao Brasil de forma casual. O documento demonstra o cinismo. Nossos generais são cínicos e isso inclui também o Geisel – disse.

Momento oportuno

O jornalista Eumano Silva avalia que o documento ajuda a esclarecer o quão violenta foi a ditadura e dá uma injeção de ânimo para aqueles que querem saber o que de fato aconteceu:

— Esse documento é divulgado em um momento muito interessante, um momento em que um candidato defende a ditadura. É importante para os brasileiros entenderem o quanto uma ditadura é ruim – argumentou.

Iara Xavier, da Comissão de familiares de mortos e desaparecidos políticos, disse lamentar que a Lei da Anistia tenha permitido que responsáveis pelas mortes e desaparecimentos de pelo menos 434 pessoas prossigam impunes.

— Cada vez a gente vê mais distante essa possibilidade de eles responderem pelos crimes cometidos – disse, ao defender a revisão da norma.

Sugestões

Os participantes também sugeriram que o Senado solicite à CIA mais documentos que revelem outros detalhes sobre o período e propuseram a criação de um novo órgão para analisar essas informações.

— Diante do silêncio sepulcral do presidente da República sobre esse episódio, minha sugestão é que o Senado chame um membro da CDH, um membro da CRE [Comissão de Relações Exteriores] e da CCJ [Comissão de Constituição e Justiça] para que eles se dirijam aos Estados Unidos a fim de solicitar esses documentos e, assim, possamos abrir os baús que ainda existem de forma a clarear cada vez mais. Para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça – propôs Fonteles.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)