Divergências marcam debate sobre projeto que regula teleatendimento

Sergio Vieira | 16/11/2016, 15h03

A Comissão de Assuntos Sociais (CAS) realizou nesta quarta-feira (16) uma audiência pública sobre o PLC 12/2016, do ex-deputado Jorge Bittar, que regula as atividades referentes ao teleatendimento. Durante o debate não foi alcançado consenso sobre os principais pontos do projeto. Representantes dos empregados e das empresas do setor divergiram.

A proposta determina que a jornada regular de trabalho pra quem atua no setor não deverá ser superior a 6 horas diárias e 36 horas semanais. Também dispõe que a cada período de 50 minutos de trabalho, deverá haver um intervalo mínimo de 10 minutos pra descanso incluído na jornada. Determina ainda que o trabalho em tempo parcial em teleatendimento ou operação de telemarketing não excederá 4 horas diárias e 24 horas semanais, dentre outros pontos.

Representante da Federação Nacional dos Trabalhadores em Telecomunicações (Fenattel), Maria Paiva, pediu aos senadores que apoiem a proposta da forma como veio da Câmara. Deste modo ela poderá seguir para sanção presidencial sem retornar para nova análise dos deputados.

Trabalho difícil

Maria Paiva criticou o modelo de gestão conduzido hoje pelas empresas do setor, baseado no que definiu como "busca intransigente da maximização do lucro, com práticas discricionárias de terceirização, assédio moral, alta rotatividade de mão-de-obra, remuneração mínima, precarização e conseqüente adoecimento dos funcionários".

Confirmou ainda que grande parte da atividade é exercida por mulheres jovens, da região nordeste, entre 18 e 24 anos de idade, que recebem um salário mínimo nesta que, na maior parte das vezes, é a primeira oportunidade de trabalho que têm na vida.

— Grandes empresas deste setor recebem incentivos fiscais de governos e praticam uma superexploração de mão-de-obra barata, sem nenhuma contrapartida, em nome da geração de empregos. É a forma como essa atividade é organizada que tem provocado tantas doenças fruto de jornadas exaustivas e altamente estressantes — disse.

Ela ainda informou que o PLC 12/2016 não esgota as reivindicações destes trabalhadores, mas considera a proposta "perfeitamente factível de aprovação" nesse momento.

Precarização generalizada

A auditora-fiscal do trabalho Odete Reis apresentou o trabalho conduzido sobre o teleatendimento pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) entre 2013 e 2015, confirmando o quadro descrito por Maria Paiva.

— Nossa fiscalização alcançou 185.000 trabalhadores, e só aí os débitos chegam a quase R$ 2 bilhões, conseqüência da terceirização indiscriminada, salários e FGTS não pagos, além de multas — criticou.

Segundo Odete Reis a auditoria do Ministério também detectou o assédio moral como um modus operandi "naturalizado" em praticamente todas as empresas do setor, especialmente nas de grande e médio porte. Confirmou ainda que o pagamento do salário mínimo é a praxe na área, uma vez que para receber mais os funcionários tem que alcançar metas "praticamente inatingíveis".

A auditora também criticou o que chamou de "obsessão" das empresas pelo monitoramento dos funcionários, controlando idas ao banheiro, frases que são ditas durante os atendimentos e até mesmo a entonação e o sorriso dos tele-atendentes. De acordo com Odete, o trabalho mostrou que existem avaliações negativas em quesitos como "atrasos no lanche" (de cerca de 2 minutos) e até mesmo a indumentária, que geram penalizações aos empregados.

— Esse quadro de banalização do assédio moral tem gerado muitas doenças nesses trabalhadores, como as osteo-musculares, transtornos mentais e distúrbios urinários, da visão, auditivos e vocais. Repercussões de uma atividade marcada por práticas reiteradas de controle, medo e estresse — informou a auditora.

Busca de consenso

Cláudio Tartarini, da Associação Brasileira de Telesserviços (ABT), disse que a entidade apóia a busca de um consenso em torno do PLC 12/2016. Informou que o setor também tem sofrido com a crise econômica, tendo encolhido 5,3% somente no ano passado, e condenou que o projeto no seu entender "busque um regramento que vai além da CLT".

— Da forma como está, existe sim o risco de gerar ainda mais desempregados nessa área se não for alterado — disse Tartarini, ressaltando o papel do teleatendimento na geração de dezenas de milhares de empregos e renda em cidades de médio porte na região Nordeste, ou mesmo em grandes municípios como São Paulo, para jovens em busca de uma primeira oportunidade. Disse ainda que 81% dos gastos das empresas deste setor estão atreladas à folha de pagamento de seus funcionários.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)