Comissão recebe em audiência pública denúncias de más práticas trabalhistas no Mc Donald’s

Da Redação | 20/08/2015, 16h29

Sindicalistas e parlamentares do Brasil e do exterior fizeram nesta quinta-feira (20) inúmeras acusações de precarização das relações de trabalho à Rede Mc Donald’s, tanto aqui quanto no resto do mundo, em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH).

Segundo a procuradora regional do Trabalho do Paraná Margaret Matos, a empresa faz da oferta do primeiro emprego um chamariz para, na verdade, explorar mão de obra a baixo custo com uma atividade que lesiona, é mal remunerada, não qualifica, tem alta rotatividade, aliena seus empregados da proteção sindical e abusa dos jovens, principalmente os mais carentes.

A realidade, conforme a procuradora, contrasta com a imagem de uma companhia que chegou ao Brasil na década de 1980 com a promessa de inclusão de jovens no mercado de trabalho, sendo marcada pelo sofrimento e pelas más condições de trabalho impostos no país a mais de 40 mil empregados.

- Estamos falando de uma empresa que explora quase 30 mil adolescentes no país, que não têm conhecimento de seus direitos. Não é à toa que escolhem adolescentes de baixa renda e pouca escolaridade, é uma estratégia de exploração para o enriquecimento – disse Margaret Matos.

Além da exploração da mão de obra juvenil, como citou a procuradora, outras denúncias a sindicatos e ações judiciais no país inteiro demonstram infrações trabalhistas como pagamento de salários abaixo do salário mínimo nacional, irregularidades na jornada de trabalho, como a não realização dos intervalos de descanso, o acúmulo de funções não remuneradas e a dificuldade de comprovação de realização de horas extras.

Como se não bastassem os prejuízos trabalhistas, completaram participantes da audiência pública, a proteção à saúde é transgredida, expondo os funcionários a chapas e óleos quentes e a produtos de limpeza tóxicos. Também foram mencionados problemas sanitários, já que os trabalhadores se revezam na manipulação de alimentos e na limpeza de banheiros e do chão.

Moacyr Tesch, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Turismo e Hospitalidade (Contratuh) e quem propôs a realização da audiência ao presidente da comissão, senador Paulo Paim (PT-RS), revelou que a empresa troca todo o seu corpo de funcionários a cada ano, com uma taxa de rotatividade de 104%. Para ele, isso demonstra como as condições de trabalho ofertadas pela rede são massacrantes.

Francisco Calasans, presidente do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio e Serviços em Geral de São Paulo (Sintoresp), e Maximiliano Garcez, da Associação Latino-Americana de Advogados Laboralistas (Alal), denunciaram práticas antissindicais impostas pela rede de lanchonetes. Segundo Calasans, a empresa conseguiu até mesmo estimular a criação de um sindicato para o setor, mas que sofre sua influência e enfraquece os trabalhadores.

Delegação estrangeira

O presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, acusou ainda o grupo Mc Donald´s de sonegar impostos. Ele relatou ter sugerido ao Ministério Público de São Paulo que investigue indícios de sonegação de Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido pela holding do Mc Donald’s. Conforme denunciou, o grupo em enviado recursos para paraísos fiscais nas Ilhas Virgens Britânicas, disfarçados como royalties. Jutta Steinruck, integrante do Parlamento Europeu, disse que a empresa adota práticas tributárias semelhantes em países da Comunidade Europeia.

Uma delegação estrangeira, com mais de 200 pessoas, compareceu à reunião representando 20 países diferentes. Os seus componentes integram um movimento mundial contra as más práticas da empresa e falam que há um padrão global na atuação do Mc Donald’s, sempre visando ao lucro e explorando os trabalhadores.

Adriana Alvarez, funcionária há cinco anos de uma lanchonete da rede em Chicago (EUA), se emocionou ao expor as dificuldades para sustentar seu filho com o salário de cerca de 10 dólares por hora. Ela faz parte do comitê que luta pela elevação da remuneração por hora para 15 dólares.

Para Scott Courtney, diretor da Service Employees International Union (SEIU), de Washington (EUA), o Mc Donald’s é um dos pioneiros do “capitalismo canibal” no mundo. Segundo ele, em vez de ofertar bons empregos e dar bons exemplos, a rede faz o contrário, ignorando leis e explorando trabalhadores, especialmente jovens e, nos Estados Unidos, os imigrantes. Na sua opinião, tais práticas estimulam empresas concorrentes a também infringirem as leis trabalhistas em busca de lucro.

Todos os estrangeiros também se posicionaram contra a chamada jornada zero, ou jornada variável, na qual o trabalhador não tem uma carga horária diária fixa, ficando à disposição das necessidades da empresa. É uma prática corriqueira no exterior que tem sido combatida com intensidade, afirmaram os debatedores. No Brasil, uma ação do Ministério Público do Trabalho (MPT) em 2012 obrigou o Mc Donald’s a não firmar contratos com essa peculiaridade - que, na visão do procurador Leonardo Mendonça, é um modelo “perverso, indigno e deve ser extirpado do Brasil e do mundo”.

Tratado firmado entre o MPT e o Mc Donald’s impõe multa de R$ 2 mil para cada trabalhador flagrado em situação irregular. Leonardo Mendonça revelou ainda que uma força-tarefa está sendo montada para fiscalizar a empresa. Ele aproveitou para pedir ajuda aos sindicatos presentes à audiência para vigiar e denunciar as lanchonetes que infringirem a lei.

- Não tenho a intenção de executar essa empresa, mas quem vai me dizer se o Ministério Público vai executá-la ou não é a própria empresa. O acordo é muito claro – disse.

Outro lado

Apesar de convidados, os representantes do Mc Donald’s não compareceram à reunião. Em carta enviada ao presidente da CDH, eles se disseram “abertos ao diálogo”, segundo o senador. Paim pretende enviar um relato das denúncias feitas durante a audiência pública à empresa.

- A situação relatada é grave e merece uma postura firme, clara e decidida, de interagirmos junto à direção do Mc Donald’s em nível internacional e também aqui – disse.

Também participaram da reunião os senadores Regina Sousa (PT-PI) e Hélio José (PSD-DF) e os deputados Mendes Thame (PSDB-SP) e Carlos Zarattini (PT-SP).

- Trabalhei no movimento sindical e já estava cansada de ouvir sobre as mazelas do Mc Donald’s no Brasil, mas não esperava que fosse assim no mundo inteiro – lamentou a senadora Regina.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)