Audiência discute redução da maioridade penal

 

 Orquestra formada por menores que cumprem medidas socioeducativas em

centro de internação de Brasília executa o Hino Nacional na abertura da audiência

sobre maioridade penal

Foto: Arthur Monteiro

 

A redução da maioridade penal, prevista em projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional, foi criticada ontem em uma audiência pública da Comissão de ­Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).

 

Em lugar da redução da idade para punição criminal, os debatedores defenderam o fortalecimento das políticas públicas voltadas para crianças e adolescentes e disseram que a violência que assombra a classe média só ganha destaque devido à exploração pela mídia, que transmite à sociedade uma visão distorcida da realidade.

Para a representante do Conselho Federal de Psicologia, Cynthia Rejanne Correa Araújo Ciarallo, a violência ganha destaque não porque os atos infracionais praticados por adolescentes “tomam conta do país”, mas porque “a pauta midiática recorta e elege fatos isolados como destinação de política juvenil”.

 

Eleições


Ela apontou a proximidade de eleições de 2014 e disse que, “quando as paixões entram em cena, há risco de que as violações aconteçam”.

Cynthia afirmou que “há hoje umas dez empresas que tomam conta do país por causa do poder de informação, que deveriam estar discutindo os direitos ainda não consagrados previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente, as medidas socioeducativas em processo de implantação que não aparecem na televisão”.

— O problema real não é a quantidade de homicídios praticados por adolescentes, que não podem servir de bode expiatório para problemas mais amplos, mas outras violações que ocorrem no país. O conceito de adolescente só é discutido quando gera inquietação na sociedade — afirmou.

A psicóloga disse que a redução da maioridade penal vai reforçar a superlotação dos presídios, “locais onde não prevalece a responsabilidade, mas a vingança e o suplício”. Segundo ela, o país está na “contramão da política”, ao discutir a violência a partir do comportamento dos adolescentes.

— Estamos cometendo um equívoco constitucional. As empresas de seguro faturam com as informações da mídia, que elege de tempos em tempos de quem a gente deve ter medo. O adulto usa o adolescente [para o crime] porque o adolescente está só, à mercê do adulto. Essa é a pergunta, e não por que o adolescente vai até o adulto — afirmou.

A psicóloga também defendeu a elaboração de um marco regulatório da comunicação, “para acabar com o medo absurdo que é passado [à sociedade pela mídia] e, de fato, não é real no país”.

A audiência foi aberta com a execução do Hino Nacional por orquestra dirigida por um agente de reintegração social e composta por ­adolescentes que cumprem medidas socioeducativas na Unidade de Internação do Plano Piloto, em Brasília.

 

Mídia rebaixa tema, diz representante do governo

 

Para o representante da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República na audiência pública, Alex Reinecke de Alverga, o fenômeno da violência é complexo e tem sofrido um “empobrecimento” devido à forma como é discutido.

A redução da maioridade penal, afirmou, não pode ser uma matéria exclusivamente penal, visto que tal abordagem “realiza uma profunda e perigosa inversão em que as consequências são tornadas causas”.

— É um desserviço, como esse debate é colocado na mídia. Há um rebaixamento do tema. É preciso fortalecer a garantia de direitos e o cumprimento de medidas ­socioeducativas — disse.

Para o promotor de Justiça da Infância e Juventude do Ministério Público do Distrito Federal, Renato Barão Varalda, a atual maioridade penal é uma cláusula pétrea da Constituição e não pode ser alterada.

— A redução da maioridade não vai diminuir a violência. Temos que ter políticas públicas. Os adolescentes não são responsáveis pela maioria dos crimes. São responsáveis por menos de 20%. A internação é prisão, o viés é pedagógico, mas há redução da liberdade. A situação do adolescente é peculiar. Faltam programas pedagógicos estaduais, há escassez de servidores qualificados.

 

Sociedade é elitista, afirma Ana Rita

 

A presidente da Comissão de Direitos Humanos (CDH), Ana Rita (PT-ES), disse que a sociedade não se comove quando um jovem pobre e negro é assassinado.

— A sociedade é muito elitista, penaliza jovens pobres e negros, mas não dá o mesmo tratamento a jovens ricos que cometem ato infracional.

Para José Pimentel (PT-CE), a solução contra a criminalidade é a escola em tempo integral. Eduardo Suplicy (PT-SP) defendeu a renda básica de cidadania.

 

Senado recebe 600 manifestações por canais interativos

 

Essa foi a terceira e última audiência pública sobre a maioridade penal promovida pela CCJ. Os cidadãos participaram do debate por meio de telefone, do Portal e-Cidadania, do Twitter e do Facebook.

Computadas as duas audiências anteriores, foram 591 manifestações, enviadas de todo o país. Do total, 73% das participações chegaram pela internet e outros 27% pelo telefone do Alô Senado (0800 612211).


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