A escritora Lucília Garcez, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) e a pesquisadora Zoara Failla concordam: a baixa qualidade do ensino no país pode estar contribuindo para que os alunos leiam pouco e não criem uma relação duradoura com a literatura. Gerente-executiva de projetos do Instituto Pró-Livro, formado pelas principais associações de livreiros nacionais, Zoara coordenou a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, último levantamento de peso feito no país sobre o assunto.

A sondagem, encomendada ao Ibope e lançada no início de 2012, ouviu cerca de 5 mil pessoas em 315 municípios e concluiu que a parcela de não leitores aumentou de 45%, em 2007, para 50%, em 2011. A pesquisa considerou como leitores as pessoas que declararam ter lido, inteiro ou em partes, pelo menos um livro nos últimos três meses.

— Tem se investido muito em livros e o que se esperava é que tivesse melhorado — diz a pesquisadora

 

Para a escritora Lucília Garcez, doutora em linguística aplicada pela Universidade de Brasília (UnB), o interesse dos jovens e adultos pela literatura começa na escola, que não cumpre seu papel.

 

— A escola funciona mal como formadora de leitores. Ela não é capaz de desenvolver na criança uma leitura proficiente, a criança não sai da escola dominando a leitura e os professores não são bons formadores de leitores. Eles não levam a criança a descobrir a leitura como uma fonte de prazer, a descobrir a leitura como uma fonte de conhecimento, como uma fonte de crescimento. Então, a escola falha — diz a escritora, que possui 17 livros publicados, entre eles Técnica de Redação.

 

Auto Ajuda

 

Um dado que chama a atenção é a queda no índice de leitura a partir dos 25 anos de idade. Na faixa até 24 anos, 49% dos entrevistados disseram ser leitores, mas, dos 25 aos 70, o percentual de não leitores foi de 75%.

 

— Outra falha da nossa escola é essa: por que ela estimula a leitura durante a escolarização e essa leitura não é duradoura? Não permanece? A pessoa não cria o hábito de ler duradouro, para o resto da vida — questiona Lucília Garcez.

 

O senador Cristovam Buarque, que tem um mandato fortemente ligado à educação, aprofunda a crítica à qualidade do ensino.

 

— Dizem por aí que nós temos 95% das crianças na escola. Não são escolas. São uns prediozinhos muito ruins, feios e sujos, com algumas pessoas dedicadíssimas, que a gente chama de professor — aponta.

A pesquisadora Zoara Failla tem opinião semelhante:

 

— O perfil do professor é muito parecido com o da população como um todo. Se perguntado sobre o último livro que leu, geralmente é de autoajuda, religioso. Ele tem um repertório muito limitado e isso dificulta a indicação de livros de acordo com os interesses das crianças e jovens, que são diferentes em diferentes regiões.

 

Redes Sociais

 

Lucília Garcez também aponta o Facebook como uma possível causa da queda no número de leitores no Brasil.

 

— A pesquisa não investigou isso, mas eu conheço pessoas que passam um tempo enorme na frente do computador — avalia.

 

Para Zoara Failla, o uso de novas tecnologias pode dificultar a aproximação dos livros por quem ainda não foi despertado pelo gosto da leitura. Ela até admite que as pessoas que passam muito tempo na internet têm, por exemplo, o acessso facilitado aos e-books, os livros eletrônicos. Mas, na opinião da pesquisadora, essa facilidade não leva obrigatoriamente à leitura.

 

Já o senador Cristovam Buarque acredita que a internet e as redes sociais não devem ser consideradas vilãs.

 

— Se a gente tem uma boa escola, o Facebook vai ajudar as pessoas a ler. Porque você passa a ler pelo computador. A gente tem que colocar mais livros dentro do IPad, mais livros dentro do Kindle e mais formas de educar as crianças a usarem a internet — alerta.

 

O jornalista e escritor José Godoy, que responde pela 2345678 Clube do Livro, na Rádio CBN, avalia que as redes sociais ajudam na divulgação dos autores e livros.

 

— Não podemos tratar de forma rasa, culpando a internet e as redes sociais, pois o indivíduo tem múltiplos interesses e consome a cultura de forma individual — argumenta.

 

Godoy lembra que, nos Estados Unidos, um levantamento feito pela empresa Nielsen, em dezembro do ano passado, mostrou que, mesmo sob forte influência das redes sociais, os jovens e as crianças leem mais por lá.

 

A pesquisa Children´s Book Summit revelou que o mercado norte-americano de livros infanto-juvenis aumentou 44% na última década. Também apontou que 67% dos entrevistados disseram ler por prazer e que metade afirmou preferir o livro de papel ao e-book.

 

Ainda de acordo com o levantamento, na faixa etária entre zero a 10 anos de idade, a principal fonte de lazer é o livro. A partir dos 11 anos, a TV e os games começam a dominar o tempo livre da criança. Godoy compara com o Brasil:

 

— Infelizmente, estamos num país no qual o livro não faz parte do nosso horizonte cultural. Todo mundo tem uma ligação com a música, já teve uma experiência com o cinema, mas o livro não faz parte desse horizonte — destaca.


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