Maior desafio do Congresso em 2019, reforma da Previdência ainda tem pontos pendentes

Anderson Vieira | 02/01/2020, 10h15

Selo_ReformaPrevidencia2.jpgO ano de 2019 foi marcado por um dos desafios mais difíceis já enfrentados pelo Congresso Nacional: votar a mais profunda reforma da Previdência feita no país desde a Constituição de 1988. No dia 12 de novembro, a Emenda 103/2019 foi finalmente promulgada, alterando o sistema previdenciário e trazendo regras de transição. Com base no texto aprovado pelos parlamentares, o governo estimou economia de R$ 855 bilhões aos cofres públicos para os próximos dez anos.

Entre outros pontos, a reforma adotou uma idade mínima de aposentadoria tanto para quem trabalha na iniciativa privada como para servidores públicos: 65 anos para homens e 62 para mulheres. Além disso, mudou regras de cálculo para o valor do benefício, instituiu normas de transição para os trabalhadores da ativa e alterou o sistema de pensões (veja aqui as principais mudanças).

Os regramentos estão valendo desde a publicação no Diário Oficial da União, em 13 de novembro, com exceção das mudanças nas alíquotas de contribuição. Os novos percentuais começarão a ser aplicados sobre o salário de março de 2020. Na iniciativa privada, a alíquota vai variar de 7,5% a 14%. Para os servidores públicos, começará em 7,5%, podendo chegar a 22% sobre o que ultrapassar o teto constitucional do serviço público. A incidência da contribuição será por faixas de renda e, portanto, serão necessários cálculos individualizados para se saber quanto será descontado do contracheque do trabalhador. 

Editada em 4 de dezembro, uma portaria da Secretaria Especial da Previdência e Trabalho do Ministério da Economia deu prazo até 31 de julho para que prefeituras e governos estaduais ajustem as alíquotas de seus servidores locais ao novo regime previdenciário de modo que elas não sejam inferiores ao cobrado pela União, salvo se o ente não tiver deficit atuarial a ser equacionado.

PEC Paralela

Também ficou para o ano que vem a proposta de emenda à Constituição conhecida como PEC Paralela (PEC 133/2019), que possibilita a extensão das regras de servidores federais para os estaduais e municipais. Só que a tarefa caberá aos deputados, visto que o texto já passou pelo Senado.

Entre os senadores, há quem diga que há o risco de a PEC Paralela ser abandonada na Câmara. O líder do Bloco Parlamentar Senado Independente, Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB), é um dos que acreditam que a proposta não vai prosperar e já falou sobre isso em Plenário:

— Continuo convencido de que esse ardil construído pelo governo não vai ser levado adiante. Se ela for adiante e voltar ao Senado, eu sou o primeiro a dizer: errei quando projetei algo diferente e assim votarei. Mas não creio, não acredito, absolutamente. Foi um jogo de cena tentar transmitir à opinião pública que as maldades plantadas e que não foram, de forma lamentável, retiradas na PEC 6, poderiam estar sendo consertadas na PEC Paralela. E nós sabemos que isso não acontecerá — afirmou.

Um dos vice-líderes do governo no Senado, Elmano Férrer (Podemos-PI), pensa diferente e está otimista no trabalho da Câmara. Ele também ressaltou que alguns governadores já se anteciparam à discussão: 

— É imprescindível a inclusão de estados e municípios. Aliás, vários governos já iniciaram as discussões em suas assembleias legislativas. No Piauí, por exemplo, foi aprovada em dois turnos, no último dia 11 de dezembro, a emenda à Constituição estadual. A Câmara dos Deputados e seus dirigentes saberão o melhor momento para a tramitação e aprovação da PEC 133/2019 — avaliou.

Além do Piauí, outros seis estados já saíram na frente e decidiram não esperar uma definição da Câmara: Alagoas, Acre, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Maranhão e Espírito Santo aprovaram reformas próprias para a Previdência dos servidores locais.

Na sessão de promulgação da reforma, em 12 de novembro, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, lembrou que, para que a tramitação das mudanças na Previdência fosse célere, acordos foram feitos, os quais incluíram a PEC Paralela:

— Foi sugestão do Senado uma PEC Paralela. Essa proposição, cujo maior impacto reside na questão previdenciária de estados e municípios, permitiu a aprovação do texto principal sem demora. Cabe destacar que, se aprovada como está, pode vir a poupar R$ 350 bilhões, melhorando ainda mais o resultado fiscal do setor público, além de evitar que estados e municípios sejam paralisados por falta de recursos. Acordos foram feitos e mantidos para que esta emenda à Constituição esteja sendo promulgada agora. Essa é a essência da política, da qual não podemos nos afastar — afirmou Davi na ocasião.

A principal mudança da PEC Paralela é a inclusão de estados e municípios no novo sistema de aposentadorias. Por meio de leis ordinárias aprovadas pelas assembleias estaduais, eles poderão adotar integralmente as mesmas regras aplicáveis ao regime próprio da Previdência Social para os servidores públicos civis da União.

O texto também prevê regras diferenciadas para servidores da área de segurança pública; isenta as entidades beneficentes de contribuição para a seguridade social, desde que elas sejam certificadas pela União e prestem serviços nas áreas de assistência social, saúde e educação; e ainda traz a possibilidade de criação de um benefício de caráter universal para crianças em situação de pobreza. O auxílio mensal deve complementar os gastos com “nutrição e desenvolvimento” de meninos e meninas até 5 anos de idade.

Capitalização

Outra questão que ficou para 2019 é o regime de capitalização, um sistema semelhante à ideia da poupança, em que o trabalhador contribui para a formação do seu próprio montante individualmente para ser usado no futuro.

O tema enfrentou grande resistência no Congresso Nacional, e há senadores que não acreditam na retomada do assunto. O líder do PT, Humberto Costa (PE), é um deles. O representante de Pernambuco acredita que o governo pode até tentar novamente, mas acha muito difícil a aprovação do tema:

— Acredito que o governo não desistiu, mas não vejo muita possibilidade de aprovação dessa medida, até porque temos o exemplo do Chile, que conseguiu produzir uma quantidade de miseráveis aposentados que se tornaram parte importante desse processo de insatisfação naquele país. Acredito que da mesma forma que não foi aceito nesse ano, dificilmente será no ano que vem, até porque é um ano de eleição — opinou.

O assunto é visto com cautela até por governistas. O vice-líder Elmano Férrer lembrou que a capitalização já foi rechaçada pelo Congresso Nacional e, no momento, há outras reformas estruturantes mais importantes, como a reforma tributária, as propostas de emenda à Constituição do Pacto Federativo e o Marco Legal do Saneamento Básico.

— Não é oportuna a reedição de projeto de lei que vise a impor o sistema de capitalização. Acredito que o debate em torno da capitalização deve ser feito em momento posterior, diante da necessidade de o governo enfrentar reformas essenciais ao Brasil. 

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)