Debate na CDH reforça necessidade de salários iguais entre homens e mulheres

Aline Guedes | 29/05/2023, 11h15 - ATUALIZADO EM 29/05/2023, 13h05

Especialistas ouvidos pela Comissão de Direitos Humanos (CDH) nesta segunda-feira (29) defenderam a continuidade da luta pela obrigatoriedade de salários iguais entre homens e mulheres. Os debatedores pediram também agilidade de discussão, pelo Senado, do PL 1.085/2023, que prevê multa de dez vezes o maior salário pago por uma empresa em caso de descumprimento da igualdade salarial. Se houver reincidência, a multa deverá ser elevada em 100%. Já aprovado pela Câmara, esse texto é de iniciativa do Poder Executivo e tramita em regime de urgência. 

A audiência pública integra um ciclo de debates que vem orientando a criação de um Estatuto do Trabalho (SUG 12/2018), relatado pelo presidente do colegiado, senador Paulo Paim (PT-PT). Ele considerou a igualdade salarial entre homens e mulheres questão de justiça e de direitos humanos, além de ser base angular para tornar o Brasil um país digno. Ao ressaltar que a luta é histórica, o parlamentar lembrou que a regra está prevista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT - Decreto Lei 5.452, de 1943) e é princípio estabelecido também na Constituição. Paim criticou o fato de a regra nunca ter sido implementada, por motivações como preconceito, discriminação, machismo e pressão da elite econômica.   

— De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres no Brasil ganham menos do que os homens em praticamente todos os setores da economia. Uma brasileira recebe, em média, 78% do que ganha um homem. No caso de mulheres pretas ou pardas, que seguem na base da desigualdade social e renda no Brasil, o cenário é ainda mais grave: elas recebem, em média, menos da metade dos salários dos homens brancos (46%). 

Conscientização

Paim considerou a conscientização e a promoção de políticas inclusivas fundamentais para combater a disparidade. Ele ressaltou que as mulheres são maioria na CDH e comemorou o fato de o PL 1.085/2023 ser relatado pela senadora Zenaide Maia (PSD-RN), no colegiado, e pela senadora Teresa Leitão (PT-PE) nas Comissões de Assuntos Sociais (CAS) e de Assuntos Econômicos (CAE). 

— É importante que empresas, governos e a sociedade como um todo trabalhem juntos para eliminar a discriminação de gênero no ambiente de trabalho e garantir salários justos e equitativos para todos, independentemente do gênero. A igualdade salarial fortalece a representação das mulheres nos espaços de poder e contribui para uma sociedade mais inclusiva e equitativa. 

Zenaide defendeu o espírito coletivo em favor da causa e disse que os debatedores enriqueceram as ideias dela a respeito do projeto. A parlamentar disse que as mulheres são mais da metade da população brasileira e elogiou a luta feminina em favor de causas “justas e corretas”. A senadora ressaltou que seres humanos têm sido contratados como se fossem máquinas, especialmente após a reforma trabalhista, e considerou necessário dar mais visibilidade à situação das trabalhadoras do país. 

— A gente precisa desse projeto do jeito que ele está. E vocês [os debatedores] vieram confirmar o que digo sempre: mulher tem de estar em tudo. Como vamos falar tudo o que foi dito e lutar pela efetivação da lei se não estivermos aqui? De qual luta posso me omitir? De nenhuma. E digo mais: temos homens parlamentares que têm esse olhar diferenciado, e de quem vamos cobrar. Todas as decisões da vida do nosso povo são políticas e temos um papel fundamental, que é participar, sim, das decisões políticas, numa maratona de obstáculos que precisamos romper todos os dias. E isso está acima de qualquer cor partidária — destacou a senadora.

Números

Segundo a subsecretária de Estudos e Estatísticas do Trabalho, Paula Montagner, além de as mulheres representarem parcela menor do que homens em todos os setores, o salário médio delas é 12% menor. A convidada mencionou que continuam baixas as parcelas de mulheres em ocupações de direção em atividades industriais e comerciais, o que explica as diferenças salariais entre os dois sexos nesse grupo ocupacional. Paula reforçou a necessidade de novas políticas públicas que ampliem a participação feminina no mercado de trabalho e pediu apoio para a política permanente de valorização do salário mínimo e para a aprovação do PL 1.085/2023 no Senado. 

— Precisamos apoiar a igualdade salarial em prol não somente das mulheres, mas por homens e mulheres, negros e não negros, a fim de sermos capazes de elevar nossa capacidade remuneratória do trabalho. Esse aspecto é fundamental e precisa de seguimento. 

União

Secretária Nacional das Mulheres da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Celina Alves Arêas defendeu a aprovação do PL 1.085/2023 e pediu a união de todos os cidadãos pela igualdade salarial e por equidade em todas as instâncias de poder. Ela considerou inadmissível as mulheres, que são maioria em vários setores, continuarem sendo tratadas com métodos machistas do ponto de vista sindical. E observou que as empregadas domésticas, por exemplo, embora representem 90% dessa categoria de trabalhadores, recebem 30% a menos que os homens em termos salariais. 

— É uma luta não só das mulheres, mas de toda a sociedade brasileira. Precisamos assumir essa mobilização, para que esse projeto [quando transformado em lei] seja aplicado na prática. Infelizmente, temos leis que não são colocadas em prática, mas vamos fazer com que essa seja. 

Representante do Ministério Público do Trabalho, a procuradora Carolina Mercante considerou necessário mudar mentalidades, tanto no setor público quanto no privado. Para ela, apesar de ser uma “gota no oceano”, o PL 1.085/2023 é um avanço. A debatedora pediu reforço na estrutura do Ministério do Trabalho, afirmando que ainda é longo o caminho rumo à equidade de gênero nas relações de trabalho. 

— Somos diferentes, mas queremos igualdade de oportunidades. As mulheres são mais vítimas de assédio moral, assédio sexual, violência, importunação, além de discriminação na contratação para determinadas funções. A gente precisa de políticas públicas e avanços na legislação. Conclamamos os senadores para que o projeto seja aprovado com a maior brevidade possível. 

Luta histórica

A representante do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit/Unucamp), Magda Barros Biavaschi, mencionou a luta histórica contra as desigualdades de tratamento, de condições de trabalho e as disparidades salariais entre mulheres e homens. Ela considerou o quadro “uma desgraça que persiste, apesar dos inúmeros decretos instituídos que asseguram tratamento isonômico no comércio e na indústria”. A debatedora destacou a busca “hercúlea” das mulheres por estabilidade e o fim de problemas como a discriminação por sexo ou mesmo demissões por gravidez. Magda considerou que aEmenda das Domésticas (EC 72) trouxe avanços, mas lamentou, no entanto, que a regulamentação da norma tenha trazido problemas como a redução de direitos das diaristas, por exemplo. 

— Aí veio a reforma trabalhista, com várias reduções de direitos, e estamos aqui hoje discutindo esse PL 1.085, quanto ao direito à igualdade substantiva. Talvez possamos aprimorar esse projeto e quero sublinhar, de maneira significativa, o ponto dos ganhos, da igualdade salarial e remuneratória, o que é importante manter porque salário é distinto de remuneração. Que nenhuma emenda supressiva venha retirar nenhum desses dois elementos. É necessário também manter o termo “obrigatoriedade” além disso, as multas são importantes, mas ainda são tímidas — afirmou. 

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)