Setor imobiliário pede redução maior nas alíquotas de IBS e CBS

Da Agência Senado | 18/11/2024, 20h32

A reforma tributária (Emenda Constitucional 132) pode trazer ganhos para o país, mas se não houver mudanças na proposta de regulamentação dos novos tributos, o setor imobiliário será prejudicado, o que trará reflexos negativos para a população. O alerta foi feito por representantes do setor durante audiência pública promovida pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) nesta segunda-feira (18). A principal reivindicação é uma redução nas alíquotas para o setor maior do que a prevista.

O debate faz parte de uma série de 11 audiências públicas da CCJ sobre o projeto de lei complementar que regulamenta os tributos criados pela reforma — o PLP 68/2024, já aprovado na Câmara dos Deputados e que está sendo analisado no Senado pela CCJ. As discussões devem subsidiar o trabalho do relator do texto, senador Eduardo Braga (MDB-AM). O foco da audiência desta segunda-feira foi ouvir as contribuições de representantes do setor imobiliário e de construção civil.

Atualmente as operações com imóveis não pagam Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), mas, de acordo com a reforma, pagarão os impostos de valor agregado: Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Para compensar o setor, a regulamentação prevê uma redução nas alíquotas gerais dos dois novos impostos de 40% para a construção e a incorporação e de 60% para a locação.

A reivindicação de um percentual maior de redução nas alíquotas foi o ponto comum nas exposições de representantes do setor. Dados de um estudo apresentado pelos participantes da audiência apontam que a carga tributária atual para a construção e incorporação é de 7,8%. Com o redutor de 40% sobre os novos impostos previsto no projeto, a carga subiria para 10,9%. O problema, de acordo com o estudo, seria corrigido com um redutor maior, de 60%, que manteria a carga tributária no mesmo índice atual, de 7,8%.

O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), Renato de Sousa Correia, afirmou que o setor imobiliário não quer benesses ou privilégios, apenas pede que a reforma não traga um aumento na carga imposta ao setor. O debatedor reforçou que para não haver aumento nos impostos pagos, há a necessidade de um redutor de 60% na alíquota no caso da incorporação e construção e de 80% na locação de imóveis.

Correia ressaltou que a reforma não pode provocar aumento de preços dos imóveis, o que poderia agravar o déficit habitacional no país — que já é de 6,5 milhões a 7 milhões de moradias, segundo ele. As mudanças no sistema tributário, porém, são positivas, ponderou.

— Nós entendemos a reforma como muito positiva para o país, em que a não cumulatividade é necessária e aumenta a competitividade da economia como um todo. Estamos dispostos a enfrentar algum sacrifício no nosso setor para que o país aumente a sua competitividade. No longo prazo, temos certeza de que o aumento da industrialização do setor, a responsabilidade social aliada ao direito constitucional da habitação e também às questões de sustentabilidade serão um ganho adicional a este momento de adaptação que teremos que viver em nosso setor.

Assim como ele, o presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras (Abrainc), Luiz França, afirmou que o setor só quer evitar prejuízos com a reforma. França reforçou os números apresentados por Renato Correia e afirmou que a intenção é fazer uma discussão técnica: se conseguirem encontrar qualquer erro nos números apresentados, os técnicos das entidades ligadas ao setor estarão à disposição para discutir novos números para os redutores.

— O PIB da construção puxa o PIB do Brasil. Sempre que você tem o PIB do Brasil subindo, você pode ver no gráfico que o PIB da construção está acima. Então, a construção é importante para o Brasil; mas não só para o Brasil, a construção é importante para qualquer país. Não é à toa que os bancos centrais de todos os países olham os índices da construção para poderem fazer os seus cálculos e as suas projeções com relação ao mercado — disse França, ao pedir atenção para o setor na análise do texto.

O gerente Nacional de Tributos da Caixa Econômica Federal (CEF), Carlos Carvalho Duarte Neto, apontou como preocupação um possível impacto sobre as operações de crédito para a habitação, caso não haja a preservação da carga tributária incidente sobre as operações relacionadas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.

— Há a possibilidade de que 181 mil famílias sejam impactadas anualmente caso a gente não tenha a preservação da carga tributária atualmente incidente sobre as operações com recursos do FGTS — alertou.

Loteamentos e informalidade

Presidente da Associação das Empresas de Loteamento Urbano (Aelo), Caio Carmona Portugal afirmou que a regulamentação, ao invés de simplificar, acaba trazendo maior complexidade aos impostos nesse tipo de atividade. Assim como outros participantes da audiência, ele reivindicou um período maior de transição para o setor, já que os loteamentos têm um ciclo produtivo mais longo.

— Eu vou produzir sob uma égide de tributação e eu vou receber as receitas sob um outro sistema de tributação. Se não existir uma transição que garanta a manutenção da previsibilidade daquilo que foi produzido sob um sistema para ser arrecadado sob outro sistema, pode haver uma decisão para o agente econômico de não investir mais nesse setor. E não investir mais no setor, seja de loteamento, seja da construção civil, seja da incorporação imobiliária, seja da locação, é perda de oferta de imóveis, que vai significar aumento dos preços — explicou.

O senador Esperidião Amin (PP-SC) concordou com a exposição e acrescentou que, na prática, quando há um excessivo encarecimento de loteamentos legais, o que ocorre como consequência é a profusão dos loteamentos ilegais.

— Quanto mais ônus houver para fazer as coisas legalmente em matéria de expansão urbana, a história recente do Brasil mostra que o resultado prático, primeiro e mais relevante é o loteamento, vamos chamar assim, a ocupação do solo ilegal em áreas mais perigosas do ponto de vista ambiental, mais sujeitas a riscos e, portanto, mais onerosas, social e economicamente, para os municípios brasileiros — advertiu.

O relator disse concordar com o alerta e lembrou que as ocupações irregulares nos centros urbanos estão sendo exploradas e financiadas pelo crime organizado, que inclusive usam essa atividade para lavar dinheiro de facções e de criminosos.

Locação

Eduardo Braga apontou números que mostram uma “mudança sociológica” no que diz respeito à habitação no país. De acordo com o relator, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que, entre 2016 e 2022, o percentual da população que vive em imóveis alugados passou de 18,5% para 21,1%s. O movimento, de acordo com o senador, ocorre especialmente entre os jovens, que perderam o interesse ou não podem comprar um imóvel e preferem ter os seus recursos para investir de outra forma.

Ely Wertheim, presidente do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação ou Administração de Imóveis Residenciais ou Comerciais (Secovi/SP), elogiou a fala do relator e argumentou que a compra de imóveis para investimento e aluguel pode ficar ainda mais desvantajosa após a reforma. Ele afirmou que atualmente o imposto pago por quem compra um imóvel para ganhar com a locação é de quase 12%. Com o regime previsto no projeto em análise (redutor de 60% na alíquota de locações), essa carga subirá para 20%, de acordo com o debatedor. Com o redutor reivindicado pelo setor (de 80%), o índice é estimado em 15%, ainda maior que a carga atual.

— E aqui nós temos uma injustiça muito grande e perigosa: haverá o aumento de inflação do aluguel. É óbvio: se as pessoas vão parar de investir em locação, vai faltar locação. Já vimos esse filme. (...). Vai prejudicar a locação como forma de solução habitacional. Para se combater o déficit habitacional, não é só fazer o cidadão comprar o apartamento; a locação também funciona, e funciona em vários países do mundo como solução habitacional — alertou.

Ao corroborar o que disse Wertheim, o representante Associação Brasileira do Mercado Imobiliário (ABMI), Pedro Fernandes, defendeu a aplicação do regime de caixa na locação para a continuidade da atividade. Para ele, não é possível exigir que o locador tenha que pagar o imposto sem antes receber o valor da locação.

— O investidor só paga o tributo no investimento bancário quando liquida o investimento. Então, de novo, aqui, como os nossos colegas falaram mais cedo: o que a gente defende é a neutralidade. A gente não quer pagar menos imposto, a gente quer continuar pagando o que a gente paga hoje. Essa é uma grave distorção que precisa ser corrigida — alertou.

O relator afirmou que a questão do regime de caixa encontrou um apoio grande no Senado e até mesmo no governo. Segundo Braga, há encaminhamento para que o texto seja modificado nesse sentido.  

— Imagine você assinar um contrato por cinco anos, você paga o imposto desse contrato antecipado, e daqui a seis meses o locador simplesmente não paga o seu aluguel. Você vai levar não sei quanto tempo para desalojá-lo, para despejá-lo? E enquanto isso há uma penalização de quem investe, de quem gera emprego, de quem faz a economia rodar. (...) Eu acho que nós estamos encaminhando bem uma solução nessa direção — disse Braga, ao informar que ainda trabalha com técnicos, senadores e governo na busca de um consenso sobre a questão da redução da alíquota para o setor.

Minha Casa, Minha Vida

Ely Wertheim, do Secovi, também estimou o impacto no Programa Minha Casa, Minha Vida. Segundo ele, os imóveis do programa teriam aumento de 15%, se não for revisto o redutor de 40% previsto na proposta.

Ele observou ainda que, pelo texto, as alíquotas crescem progressivamente de acordo com o valor do imóvel, o que representaria em média 40% de aumento na carga tributária, afirmou. Já com o redutor de 60% proposto pelo setor, haveria redução de preços de unidades do Minha Casa e de apartamentos menores.

Outra sugestão de vários participantes foi a alteração na regra que veda a apropriação e utilização de créditos de IBS e CBS pelo fornecedor de serviços de construção civil nas aquisições de material de construção aplicadas às obras contratadas. Para a advogada Fernanda Foizer, embaixadora do projeto "Mulheres no Tributário" em Brasília, é um tratamento injusto, e os senadores precisam aprovar emenda já apresentada ao texto para corrigir a distorção.

— O que se pleiteia é que, de fato, seja considerada essa emenda. Nós estamos com um setor que não vai ter direito à utilização de crédito de IBS e CBS pelo fornecedor de serviços. Isso é importante.

Turismo

A audiência também abordou os impactos na atividade turística. O Presidente do Conselho da Associação das Operadoras de Turismo (Braztoa), Fabiano Camargo, alertou para a competição com empresas outros países que apresentam tributação mais vantajosa para o setor, como é o caso da Argentina, que tem isenção do Imposto sobre Valor Agregado (equivalente ao CDB e IBS brasileiros). Ele citou ainda o caso de empresas on-line de agenciamento de hotéis situadas no exterior.

— A competição internacional com empresas on-line sem sede no Brasil faz com que o ajuste tributário seja crítico. Porque se nós aumentarmos a nossa alíquota no agenciamento e competirmos, por exemplo, com um destino cuja alíquota seja de 5%, 6%, o passageiro vai poder comprar um hotel no Nordeste através de algum site on-line, com uma tributação menor e podendo trabalhar com um custo melhor, em vez de comprar aqui no Brasil. E todo o recurso, os impostos e a parte de valores e empregabilidade iria para o exterior — lamentou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)