Novo PNE: debatedores defendem investimento de 10% do PIB em educação

Da Agência Senado | 21/10/2024, 14h18

Durante audiência pública da Comissão de Educação (CE), especialistas e representantes do ensino superior sugeriram que o novo Plano Nacional de Educação (PNE 2024-2034) restabeleça a meta de investimento público na educação em 10% do Produto Interno Bruto (PIB). Além disso, defenderam a aprovação, junto com o novo PNE, o projeto que estabelece o Sistema Nacional de Educação (SNE). 

O debate, requerido e presidido pelo senador Flávio Arns (PSB-PR), foi o nono da rodada de dez audiências públicas sobre o tema. O novo PNE determinará as diretrizes para a educação nos próximos 10 anos.

O projeto do Poder Executivo para o novo PNE (PL 2.614/2024) está em tramitação na Câmara dos Deputados e contém 10 diretrizes, 18 objetivos, 58 metas e 253 estratégias a serem cumpridos até 2034. O PNE 2014-2024, em vigor, previa chegar ao final da sua vigência com a aplicação de 10% do PIB no setor da educação. Atualmente, está em 5,5%. O projeto do novo PNE estabelece uma aplicação progressiva que vai de 7% a 10%.

Mas na visão dos debatedores, o novo plano precisa ser entendido como política pública, e seus os pontos centrais, que são o financiamento e a gestão, devem ser de fato cumpridos e não alvo de desmontes ao longo dos anos. 

Efeitos do investimento

O presidente da Associação Nacional de Pesquisadores em Financiamento da Educação (Fineduca), Nelson Cardoso Amaral destacou que países que passaram a investir mais recursos públicos na educação conseguiram evoluir na qualidade de ensino e no êxito educacional, como indicam os dados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa). 

Ele citou como exemplo a Finlândia, que em 1970 investia uma média anual de US$ 2.241 em educação por pessoa. Em 2016, esse valor era de US$ 11.355, refletindo significativamente no desempenho do país, que hoje lidera o ranking dos melhores do mundo em educação. 

Já o Brasil, segundo dados apresentado por Nelson Amaral, investia em 1995 um total de US$ 979 por aluno e atualmente soma uma média de US$ 2.347 no valor aplicado por aluno, a cada ano. Para ele, o valor anual total por aluno mínimo deveria ficar em torno de US$ 6.540.

Ele também citou estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o qual indica um efeito multiplicador do crescimento de quase 2% do PIB quando se investem recursos correspondentes a 1% do PIB na educação. 

— Quando se acrescenta 1% do PIB na educação, o PIB do país aumenta 1,85%. Amplifica o valor do PIB diretamente, e é o setor que mais amplia o PIB. 

E apresentou documento da Fineduca sugerindo fontes de recursos para ampliar o investimento em educação. 

— É feito todo um levantamento de possíveis fontes para serem estudadas, além de tributos, que são os impostos, taxas e contribuições, claro. Então, a gente encontra lá muitas possibilidades, que estão lá, definidas, e elas estão também nas estratégias do documento final da Conae [Conferência Nacional de Educação]: utilizar a riqueza natural brasileira (águas, minérios, petróleo e gás); utilizar recursos recuperáveis da dívida ativa da União; diminuir o volume de renúncia de impostos da União; elevar a carga tributária brasileira a percentuais de PIB equivalentes àqueles dos países mais ricos da OCDE — enumerou. 

Agenda de desenvolvimento 

O representante do Centro de Estudos Educação & Sociedade (Cedes), Romualdo Portela de Oliveira, concordou com Nelson Amaral e defendeu a educação no centro da agenda de desenvolvimento nacional, ancorado também no estímulo à ciência, à tecnologia e à economia do meio ambiente. 

Ele considerou injusto que o Brasil exija metas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) semelhantes aos dos países da OCDE, mas não invista o mesmo recurso que eles também aplicam. 

— O nosso gasto por aluno é substantivamente inferior ao dos países da OCDE. E aí eu acho muito interessante que a gente estabeleça como meta do Ideb [...] a média dos países da OCDE. E não tenha nos nossos planos de educação a ideia de que temos que gastar a média dos países da OCDE por aluno. Você cria um desejo e não cria as condições necessárias para que ele venha a ser cumprido.

O senador Flávio Arns também falou da importância de o projeto calcular de forma justa o valor a ser direcionado a cada aluno, levando em consideração a qualidade do ensino em cada região do país. 

— Ao mesmo tempo, o Custo Aluno-Qualidade, é um conceito novo também, já colocado na Constituição. [...] Temos que investir na creche, na pré-escola, no ensino médio, para que seja de qualidade: a creche, qual é o tamanho da sala, tamanho da escola, equipamentos, materiais, água, luz, professores, profissionais da educação, carreira... Nós temos que chegar a esse conceito — observou Arns.

SNE e colaboração federativa

Na opinião da vice-presidente da Região Sul da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), Angela Maria Scalabrin Coutinho, um dos desafios do novo PNE é refletir através dos objetivos, metas e estratégias as diferenças identificadas em todo território nacional, oferecendo um caminho eficaz para atender a população sob a perspectiva da justiça social e da equidade, com um sistema de cooperação entre os entes federados e métricas muito bem estabelecidas.

Para isso, ela considerou essencial que o novo PNE seja aprovado juntamente com o Projeto de Lei Complementar (PLP) 235/2019, já aprovado no Senado, que institui o Sistema Nacional de Educação (SNE). De Flávio Arns, a proposta alinha as políticas, programas e ações da União, do Distrito Federal, de estados e de municípios, em articulação colaborativa dos entes da Federação na área educacional.

— É só retomar a importância da aprovação do PNE em articulação à aprovação do Sistema Nacional de Educação; avançar mais nas políticas de cooperação entre os entes federados, reduzindo as desigualdades regionais e entre as redes; o desafio de acompanhamento, o modelo de controle social que de fato envolva a sociedade política e sociedade civil; outro ponto fundamental de nós pensarmos é a descontinuidade das políticas, portanto, retomar essa ideia de um plano de Estado e não de governo é fundamental para que a gente possa avançar na perspectiva dessa não descontinuidade. 

O presidente da Associação Nacional de Política e Administração da Educação (Anpae), Luiz Fernandes Dourado, observou que o atual PNE, apesar de ter expressado um pacto nacional para a política de estado educacional na época da sua aprovação, acabou não se efetivando e não teve um monitoramento adequado. 

Diante desse quadro, ele disse que o novo plano precisa avançar com um sistema de colaboração entre os entes federativos, com a efetiva institucionalização do Sistema Nacional de Educação, definição de metas de aplicação de recursos públicos e a criação e o fortalecimento de mecanismos legais que garantam canais efetivos e democráticos de controle e de participação social. 

— Entendemos o Plano Nacional de Educação como articulador do Sistema Nacional de Educação, daí a importância da vinculação deste plano com os demais planos decenais: estaduais, distrital e municipais. Sinalizando ações integradas e intersetoriais em um regime de colaboração interfederativa — afirmou.

Conclusão do ensino médio

Para a presidente do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp), Lúcia Maria Teixeira, é fundamental que o plano seja pensado na perspectiva de melhorar as taxas de conclusão do ensino médio, priorizar a qualidade do ensino e a valorização da carreira docente, bem como melhorar a infraestrutura das escolas. 

Segundo Lúcia Teixeira, atualmente, a cada ciclo de entrada no ensino médio, cerca de 35% a 40% não se formam. 

— É um percentual muito alto de alunos que muitas vezes acabam não estudando e não trabalhando e têm as suas limitações, inclusive no mercado de trabalho, por não terem estudo. Dos quase 3 milhões que ingressaram em 2020 no ensino médio, somente perto de 2 milhões concluíram em 2022. Então, nós deixamos no meio do caminho, desses que entraram neste período, pelo menos 1 milhão de alunos que não estudam.

Ela disse ser essencial o apoio e a valorização das instituições privadas de ensino superior, ampliando tanto o programa de financiamento estudantil, o Fies, como o Prouni. Uma das metas do projeto do novo PNE é elevar o percentual da população de 18 a 24 anos com acesso à graduação a 40% de modo a reduzir as desigualdades entre os diversos grupos sociais. De acordo com o último Censo da Educação Superior, publicado em 2023, atualmente o Brasil registra 20,2% frequentam o ensino superior dentro dessa faixa etária. 

Segundo Lúcia Maria Teixeira, enquanto que 80% da formação na educação básica é feita na escola pública, no ensino superior a rede pública atende apenas 20% de formação dos estudantes. 

— A gente tem, aqui no Instituto Semesp, diversas pesquisas que atestam que a evasão do aluno que tem esse apoio de financiamento ou de bolsa é mínima, é de 8%, em comparação com a evasão inclusive das universidades públicas e das privadas. Então, apoiar com bolsas e com financiamentos é importantíssimo para que a gente possa acolher este aluno que sai do ensino médio, porque 40% da população do ensino médio têm renda per capita até R$1,45 mil e 81% têm renda per capita até R$3,135 mil. Se não tiverem auxílio com bolsas gratuitas e financiamento subsidiado, o Brasil não vai conseguir aumentar essa meta, não vai conseguir.

58 metas

O PNE em vigor atualmente é composto por 20 metas e foi aprovado pela Lei 13.005, de 2014. De acordo com o texto, o Poder Executivo deveria enviar ao Congresso Nacional uma nova proposta até junho de 2023. Como isso não ocorreu, a senadora Professora Dorinha Seabra (União-TO) apresentou o Projeto de Lei (PL) 5.665/2023, para prorrogar o plano atual até 2025. Aprovada pelo Congresso, a prorrogação resultou na Lei 14.934, de 2024.

Em junho deste ano o Executivo encaminhou a proposta do novo PNE (PL 2.614/2024). Ela foi elaborada pelo Ministério da Educação a partir das contribuições de um grupo de trabalho, da sociedade, do Congresso Nacional, de estados, municípios e conselhos de educação. O texto também incluiu sugestões da Conferência Nacional de Educação, realizada em janeiro.

Meta PNE 2014/2024

Meta PNE 2024/2034

Icone alfabetizaçãoAlfabetização
Alfabetizar todas as crianças até o final do 3º ano do ensino fundamental. Alfabetizar 80% das crianças até o final do 2º ano do ensino fundamental, em cinco anos, e alcançar 100% de alfabetização em até dez anos.
Icone educação infantilEducação Infantil
Universalizar, até 2016, a educação infantil na pré-escola para as crianças de 4 a 5 anos de idade. Universalizar a pré-escola para as crianças de quatro e cinco anos e ampliar a oferta para 60% das crianças de até três anos.
Icone ensino fundamental e médioEnsino Fundamental e Médio
Universalizar o acesso ao ensino fundamental e elevar a taxa de matrícula do ensino médio até 2016. Universalizar o acesso ao ensino fundamental e médio para crianças de seis a 17 anos.
Icone educação integralEducação Integral
Oferecer educação integral em 50% das escolas públicas, atendendo 25% dos estudantes. Garantir matrículas de tempo integral em 55% das escolas, atendendo 40% dos estudantes.
Icone ensino médioEnsino Médio
Elevar a escolaridade média da população de 18 a 29 anos para 12 anos de estudo. Reduzir as desigualdades de aprendizagem no ensino médio entre diferentes grupos sociais.
Icone educação profissionalEducação Profissional
Triplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível médio até 2024. Expandir as matrículas para atender 50% dos estudantes, com 45% no setor público.
Icone educação superiorEducação Superior
Elevar a taxa de matrícula para 33% da população de 18 a 24 anos. Elevar para 40% o percentual de acesso à graduação e ampliar o número de mestres e doutores.
Icone diversidadeDiversidade e Inclusão
Universalizar o acesso à educação para a população com deficiência, transtornos ou altas habilidades. Ampliar a permanência desses estudantes em todos os níveis educacionais.
Icone conectividadeConectividade e Tecnologias
Inexistente. Assegurar conectividade à internet para 50% das escolas e educação digital para 60% dos estudantes.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)