CCJ adia votação de PEC que dá autonomia ao Banco Central

Da Agência Senado | 10/07/2024, 15h29

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) deve votar na quarta-feira da próxima semana (17) a proposta de emenda à Constituição que concede autonomia orçamentária e financeira ao Banco Central (BC) e o transforma em empresa pública. A PEC 65, de 2023, estava na pauta da reunião desta quarta-feira (10), mas o presidente do colegiado, senador Davi Alcolumbre (União-AP), abriu prazo para que os parlamentares busquem um entendimento sobre a matéria.

A proposta é de autoria do senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO) e tem voto favorável do relator, senador Plínio Valério (PSDB-AM), na forma de um texto alternativo. Depois da CCJ, a matéria seguirá para dois turnos de votação no Plenário do Senado, onde precisará de 49 votos favoráveis em cada um deles para ser aprovada.

A PEC 65/2023 insere na Constituição a autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira do Banco Central, já estabelecida pela Lei Complementar 179, de 2021, e acrescenta a autonomia orçamentária. Além disso, a PEC transforma o BC, hoje autarquia de natureza especial sem vinculação com nenhum ministério nem subordinação hierárquica, em instituição de natureza especial organizada como empresa pública fiscalizada pelo Congresso Nacional com o auxílio do Tribunal de Contas da União (TCU).

O líder do governo, senador Jaques Wagner (PT-BA), disse que o governo não é contra a autonomia financeira da instituição. O ponto controverso, segundo o parlamentar, é transformar o banco em empresa. Ele sugeriu que os parlamentares construam um acordo que possibilite a autonomia financeira e administrativa do BC, sem transformar a instituição em empresa.

— [O relatório] tem figuras [servidores] como celetistas estáveis, que são "exóticas", eu diria. Segundo: há o prejuízo da administração das reservas nacionais pelo Bacen. Em 2022, esse prejuízo foi de R$ 40 bilhões, que estamos pagando este ano. Em 2023, esse prejuízo foi de R$ 125 bilhões, que o Tesouro Nacional terá de aportar no ano que vem. Dentro do sistema do governo, o Bacen entra no gasto primário do governo e contamina as contas públicas. Então, é preciso separar — ressaltou Wagner.

De acordo com Vanderlan, o Banco Central precisa de autonomia orçamentária para que possa cumprir de forma plena a sua atividade de autoridade monetária com a missão de zelar pela estabilidade do sistema financeiro e fomentar o pleno emprego. “A experiência internacional mostra que os principais bancos centrais do mundo se submetem a processos rigorosos de supervisão, tanto internos quanto externos, mesmo com elevado grau de autonomia financeira”, argumenta o autor da PEC.

Com a autonomia orçamentária, a instituição poderá, conforme explicou Plínio Valério, “elaborar, aprovar e executar seu próprio orçamento, de forma separada e independente do governo”, sem precisar dos repasses do Tesouro Nacional. Com a autonomia financeira, a instituição poderá bancar os seus custos utilizando suas próprias receitas, provenientes dos chamados “rendimentos de senhoriagem”, que são aquilo que o Banco Central ganha com os serviços de emissão e gestão da moeda. Na visão do relator, isso será positivo para o governo federal, que não precisará mais fazer transferências orçamentárias para o BC.

Poder de polícia

A PEC 65/2023 explicita que o Banco Central terá poder de polícia, incluindo poderes de regulação, supervisão e resolução, podendo fiscalizar e aplicar sanções sobre entidades sob sua supervisão, como os bancos. Para o relator da PEC, “esse poder é fundamental para o atingimento do objetivo de estabilidade financeira”. Para deixar mais clara a finalidade do Banco Central, Plínio Valério incluiu, na nova definição do seu regime jurídico, que se trata de empresa pública “que exerce atividade estatal”.

O relator inseriu na PEC, seguindo sugestão do autor, a previsão de que uma lei complementar vai estabelecer limites para o crescimento das dkkespesas de custeio e de investimento do Banco Central. As despesas de pessoal e encargos sociais serão determinadas na lei por iniciativa do Senado Federal. Também será prerrogativa do Senado, por meio da comissão temática pertinente, a análise e eventual aprovação do orçamento anual de custeio e de investimentos do Banco Central.

Servidores do BC

Com a transformação do Banco Central em empresa pública, seus atuais servidores deixarão de ser regidos pelas normas do Regime Jurídico Único e se tornarão empregados públicos regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Em razão disso, a PEC 65/2023 lhes assegura o direito de optar por permanecer no Banco Central ou deixar a instituição e migrar para carreiras semelhantes no âmbito do Poder Executivo Federal.

Plínio Valério incluiu uma emenda no texto para resguardar os direitos dos atuais servidores. Aqueles que optarem por permanecer no serviço público, mas em outra carreira, poderão contar o tempo no Banco Central como de efetivo exercício no novo cargo. Já os que quiserem permanecer no BC terão direito a compensação financeira calculada com base nas contribuições já recolhidas ao regime próprio de previdência dos servidores públicos e a aplicação dos mesmos critérios de transição para aposentadoria dos servidores. O relator aceitou uma sugestão do senador Eduardo Girão (Novo-CE) autorizando o BC a pagar a compensação financeira para os colaboradores que permanecerem na instituição e os benefícios dos seus atuais aposentados e pensionistas.

Quadro de pessoal

O relator também fez uma modificação no texto da PEC para estabelecer que os integrantes do quadro de pessoal do Banco Central só poderão ser demitidos após sentença judicial transitada em julgado, ou em caso de falta grave apurada em processo disciplinar.

Outra modificação no texto foi sugerida pelo senador Lucas Barreto (PSD-AP), a fim de dar segurança aos atuais aposentados e pensionistas do Banco Central que tiverem direito à paridade. Hoje, essas aposentadorias e pensões são reajustadas para acompanhar o salário dos servidores da ativa, mas como os cargos existentes serão extintos, a emenda determina que esses proventos passem a ser revistos com base na remuneração de cargo de carreira congênere, o que garante a manutenção da paridade.

“Deve-se levar em conta o princípio máximo de não prejuízo e de proteção aos atuais servidores que não podem sofrer perda de direitos adquiridos na sua atual situação funcional, adotando uma regra de transição no processo de mudança de regime jurídico do Banco Central”, argumenta Plínio Valério.

Para o senador, também é importante estabelecer regra clara que evite a despedida imotivada como um mecanismo de proteção dos futuros empregados da instituição.

Cartórios

Duas emendas acatadas por Plínio Valério tratam da relação entre o Banco Central e os cartórios e da delimitação de seus poderes e atribuições. Os senadores Weverton (PDT-MA) e Carlos Portinho (PL-RJ) apresentaram emendas para deixar claro que a autonomia conferida ao Banco Central não abrange, não restringe, não altera e nem acumula os serviços próprios da competência dos tabeliães e registradores atribuídos em lei.

No entanto, diante da perspectiva de que esse dispositivo pudesse inviabilizar inovações como a criação da versão digital do real, que está em fase de testes e deverá ser denominada Drex, foi também acolhida emenda do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) ressalvando que o Banco Central poderá criar e regular novos produtos financeiros, ainda que isso afete os cartórios.

Já uma emenda do senador Márcio Bittar (União-AC) esclarece que estão mantidas as atribuições do Conselho Monetário Nacional (CMN) previstas na Lei Complementar 179, de 2021, como o estabelecimento de metas da política monetária, além daquelas relacionadas à função regulatória do sistema financeiro.

Voto em separado

O senador Rogério Carvalho (PT-SE) apresentou voto contrário em separado à PEC 65, de 2023. Na reunião desta quarta-feira, ele argumentou que o substitutivo de Plínio Valério incorre em vício de iniciativa, pois trata de tema de iniciativa privativa do presidente da República, mas foi proposta por senadores.

Além disso, Carvalho disse que o texto alterou a natureza jurídica proposta para o BC, ao torná-la de “empresa pública” para “empresa pública que exerce atividade estatal”. Para o senador, o relatório trouxe inovação não relacionada a seu objeto principal.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)