Sonia Guajajara nega ofensa aos roraimenses

Da Agência Senado | 01/06/2023, 14h48

A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, afirmou que nunca teve a intenção de ofender a população de Roraima, associando-a ao garimpo ilegal nas terras indígenas ianomâmi. A gestora, que também criticou a aprovação pela Câmara do PL 490/2007, que trata do marco temporal para demarcação das terras indígenas e que em breve poderá ser analisado pelos senadores, foi ouvida em audiência pública, nesta quinta-feira (1º), na comissão temporária externa do Senado criada para acompanhar a crise humanitária do povo ianomâmi.

Sonia Guajajara foi inicialmente convocada a partir de requerimento apresentado pelo relator da comissão, senador Dr. Hiran (PP-RR), para “prestar esclarecimentos sobre acusações públicas direcionadas à população de Roraima e ao governador do Estado, Antonio Denarium, no sentido de incentivar, apoiar e fomentar a atividade ilegal de garimpo Terras Indígenas Yanomami". Posteriormente, a convocação foi transformada em convite pelo colegiado.

— Quero afirmar que ao responder as perguntas que alguns jornalistas me fizeram durante coletiva de imprensa no dia 1º de maio, jamais tive a intenção de desacatar, desrespeitar ou menosprezar a população roraimense. Inclusive quero lembrar que os povos do território ianomâmi também fazem parte da população de Roraima. Os indígenas ianomâmis também são munícipes, cidadãos roraimenses — afirmou Sonia.

A ministra reconheceu que existem cidadãos roraimenses que se submetem ao garimpo ilegal por falta de opção e que esses também são vítimas da situação. Por isso, o ministério tem se envolvido na discussão de como estimular a migração dessas pessoas para outras atividades econômicas. Ela salientou que as empresas envolvidas com o garimpo ilegal, que nem são sediadas em Roraima estão, precisam ser responsabilizadas.

Sonia Guajajara afirmou ainda que é “público e notório que o ex-presidente [da República], Jair Bolsonaro, defendeu e incentivou o garimpo em terras indígenas" e que foi seguido, nessa mesma linha, pelo governador de Roraima.

— Essas medidas, mesmo que não aprovadas, acabam estimulando a permanência das atividades, além de estimular o aumento das invasões. (...) Sabemos que essa crise não iniciou agora, sempre houve negligenciamento para essa situação, mas certamente foram aprofundadas nos últimos quatro anos — expôs a ministra, que disse já ter se encontrado com o governador para esclarecimentos.

Garimpo ilegal

Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) apontam que entre 2016 e 2022, o garimpo ilegal em terras indígenas aumentou 787% o que intensificou, segundo a ministra, “a profunda crise” vivida pelo povo ianomâmi. Sonia enfatizou que o garimpo ilegal trouxe o uso abusivo de álcool e drogas, aliciamento de mulheres e crianças, insegurança alimentar, trabalho em condições análogas à escravidão, entre outras situações calamitosas, como o contaminação de indígenas e dos rios pelo mercúrio.

Apesar das responsabilidades da União, afirmou Sonia Guajajara, “todos os entes federativos devem ser corresponsáveis pelo bem viver dos povos originários”.

— Todo mundo sabe que os povos indígenas, ainda que originários, somos considerados estranhos em muitos espaços. Essa nossa presença ainda não é aceita por muitas pessoas, inclusive por parlamentares. Hoje, estamos aqui falando por nós mesmos. (...) Pela primeira vez na história, comemoramos o Dia dos Povos Indígenas e não mais o Dia do Índio — afirmou a ministra.

Relator da comissão externa, o senador Dr. Hiran afirmou que jamais se manifestou apoiando o garimpo ou qualquer atividade ilegal. O parlamentar discorreu sobre suas atividades médicas em prol dos indígenas, assim como defendeu as ações do estado de Roraima voltadas a essas comunidades, como concurso para mil professores indígenas atuarem em 260 escolas indígenas. Hoje, Roraima tem 32 reservas indígenas demarcadas, em 10,3 milhões de hectares.

Dr. Hiran foi enfático em dizer que “o nosso povo [roraimense] não reconhece a atividade garimpeira como a principal atividade econômica do estado”. Ele expôs, contudo, que defende a discussão do PL 490.

O senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR) também afirmou que “em Roraima, ninguém é favorável ao garimpo em terras indígenas”. O parlamentar lembrou, contudo, que o garimpo começou naquela região em 1930 e que “não há como se falar em Roraima e não se falar em tradição garimpeira”.

— Há uma tendencia generalizada de dizer que os políticos, especialmente na região Amazônica, são contra os povos indígenas. (...) Nós damos apoio para os povos indígenas, sim.

Ao responder o senador Mecias sobre a destruição do maquinário apreendido nas operações em terras ianomâmis, o secretário-executivo do ministério, Eloy Terena, explicou que as ações de queima e destruição de maquinários estão previstas em lei federal e que tal decisão não é competência da pasta.

A senadora Damares Alves (Repúblicanos-DF) questionou se já há dados sobre as ações emergenciais realizadas e se houve redução da desnutrição entre os ianomâmis. Ela lembrou que dados apontam para 126 óbitos de janeiro até agora, sendo que 44% seriam crianças.

Marcos Kaingang, do departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Fundiários Indígenas do ministério, explicou que a ação ainda não é suficiente, mas que se contata um cenário muito melhor do que o encontrado em janeiro.

Marco temporal

Para a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), está havendo uma tentativa de desconfigurar a estruturação da pasta. Ela também demonstrou preocupação com o PL 490 e disse que é preciso programação para que o ministério, criado no atual governo, tenha uma fatia orçamentária “mais robusta”.

Sonia Guajajara afirmou que muitos povos ainda não têm suas aldeias porque não possuem seus territórios garantidos.  

— O PL 490 é altamente danoso por retirar direitos já reconhecidos aos povos indígenas.

Minuto de silêncio

Em manifestação de pesar, e a pedido da ministra, a comissão fez um minuto de silêncio por Angelita Yanomami, que trabalhava na Casa de Saúde Yanomami como intérprete. No dia 1º de maio, foram encontraram as ossadas da indígena, de 35 anos, nas margens do Rio Branco, em Boa Vista (RR).

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)