Debatedores querem ampliar discussão dos limites do Parque Nacional de São Joaquim

Da Agência Senado | 20/09/2021, 19h36

Debatedores cobraram, nesta segunda-feira (20), o aprimoramento do projeto de lei que redefine o traçado do Parque Nacional (Parna) de São Joaquim e altera seu nome para "Parque Nacional da Serra Catarinense". Durante audiência pública interativa para instrução do Projeto de Lei do Senado (PLS) 208/2018, eles alegaram que a Lei 13.273, de 2016, que alterou os limites da unidade de conservação, criada em 1961, não levou em conta a participação da população local e gerou dúvidas entre os moradores da região.

O projeto foi discutido por requerimento do senador Jaques Wagner (PT-BA), que preside a CMA, e Fabiano Contarato (Rede-ES), que presidiu o debate. A Comissão fará uma nova audiência pública sobre o tema, em data a ser confirmada, na qual espera aprofundar o tema com outras autoridades ambientais. Relatado pelo senador Luís Carlos Heinze (PP-RS), o PLS 208/2018 foi apresentado por três senadores de Santa Catarina: Dalírio Beber, Paulo Bauer e Dário Berger (MDB-SC), este último integrante da atual legislatura.

Ao destacar a importância do debate, o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) lembrou que o senador Confúcio Moura apresentou o Projeto de Lei (PL) 5.174/2019. O texto altera a lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza para determinar que a desafetação, redução dos limites e recategorizações totais ou parciais de unidades de conservação serão precedidas de estudos técnicos e consulta pública. A matéria foi aprovada na CMA, em agosto de 2021, sem emendas, nos termos do relatório apresentado pelo senador Jaques Wagner (PT-BA).

 — No espirito do que prevê o projeto que agora tramita na Câmara, e esperamos que lá seja igualmente aprovado, apresentamos o requerimento que fundamenta essa audiência pública em relação ao PLS 208/2018, que define novos limites para o parque da serra catarinense. Ou seja, não especificamente em relação a esse parque [de São Joaquim], mas, na verdade, para as alterações em qualquer unidade de conservação é necessário que realizemos pelo menos uma audiência pública para debater e conhecer as motivações e impactos econômicos sociais e ambientais da mudança proposta. Esperamos que o debate nos esclareça a motivação do projeto e a redução de limites pretendida – afirmou.

Tanto Fabiano Contarato como o senador Esperidião Amin (PP-SC) lamentaram a ausência no debate do chefe do Parna São Joaquim quando da elaboração do plano de manejo da unidade, Paulo Santi Cardoso da Silva, e da coordenadora da equipe de planejamento do ICMBio, Lourdes Maria Ferreira.

— O parque ficou preservado [ao longo de 60 anos] porque é da índole do povo e da geografia, do clima e da conformação geológica da região, que não se presta para uso intensivo. Não há grandes proprietários, são famílias com atividade de subsistência e a expectativa do turismo. O governo já incluiu o parque na área de concessão. Mas, como vamos fazer a concessão se ele não tem a delimitação resolvida harmoniosamente, compreendendo a questão ambiental e social? – questionou Esperidião Amin.

Estudos técnicos

Coordenador geral de Consolidação Territorial do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Glender Soares Lopes, destacou que o Parna São Joaquim foi uma das primeiras unidades de conservação a serem criadas no Brasil, em 1961. Nos moldes atuais, o parque ocupa uma área de 49.800 hectares, dos quais 13.234 hectares já foram desapropriados pelo ICMBio por meio de indenização ou doação. Há ainda outros 5.193 hectares em tramitação, além das terras devolutas, que compõem em grande parte a região de escarpa da serra.

— Cabe ressaltar que, na elaboração de uma unidade de conservação nos moldes atuais, o ICMBio elabora estudos técnicos, realiza vistoria in loco, consultas públicas à população local, às prefeituras e ministérios, além de consulta ao governo estadual que abrange a reunião. Esse não foi o rito adotado à época da criação dessa unidade [de São Joaquim]. Na criação da unidade, o decreto trazia dificuldades na interpretação, diante disso não era possível ter uma descrição correta ou até uma descrição sensata dos limites do parque, diante disso foram realizadas diversas discussões a respeito e, em 2016, foi publicado a Lei 13.273, de 2016, de iniciativa do Legislativo, a qual trouxe de uma forma mais clara os limites da unidade de conservação - explicou.

Com relação ao PLS 208/2018, Lopes afirmou que o ICMBio ainda não desenvolveu um estudo completo a respeito da proposição. Ele disse que o órgão está disposto a reabrir um grupo de trabalho para chegar a uma decisão sobre a alteração dos limites de São Joaquim.

— Temos estudos anteriores dos limites, temos internamente alguma proposta de redefinição desse limite, mas o PLS 208, de fato, não foi discutido pela parte técnica do ICMBio. Foi criado, no passado, um grupo de trabalho para tratar dos limites de São Joaquim. Porém, o grupo de trabalho foi suspenso. O ICMBio está disposto a reabrir o grupo de trabalho, a fim de chegarmos a um consenso quanto o que precisa ser conservado, o que está sobreposto e pode ser desafetado. O ICMBio está disposto a conversar e a gente progredir para um limite adequado tanto para o meio ambiente como para a população local. Quanto à alteração de nome, a gente não tem nada a se opor quanto ao nome atual ou qualquer outra nomenclatura proposta para o parque – afirmou.

Respeito à legislação

Presidente do Conselho da Cidade de Lauro Muller/SC, o engenheiro agrimensor Marcelo Salvador disse que o município não é contrário ao parque nacional, mas cobrou respeito à legislação ambiental.

— Não foi feita consulta pública ao município pela redefinição do parque e sobreposição do Eco Museu Serra do Rio do Rastro. A lei prevê essa consulta e estudos. O desejo do povo de Lauro Muller é que os limites voltem ao seu traçado original ou que o PLS 208 retire as áreas de conflito de cima do Eco Museu. Hoje, nós temos um forte trabalho nas áreas do Eco Museu, em cima da agroecologia e da produção de sustentabilidade de pequenos produtores engajados na preservação ambiental, que é a atração principal de Lauro Muller. Dentro do Eco Museu temos hoje uma grande descarga do Aquífero Guarani. Sabemos das nossas questões hídricas e cuidados. Nossa população está ciente e trabalhamos a cada dia mais e mais em cima disso daí – afirmou.

Salvador reiterou a necessidade de realização de consulta pública e de mais discussões em torno da alteração dos limites do Parna São Joaquim.

— Lauro Muller nunca esteve dentro das áreas do parque. Com a nova lei de 2016, sem consulta pública, houve sobreposição das áreas do Eco Museu Serra do Rio do Rastro, de Lauro Muller, e Lauro Muller não aceita isso, a gente não quer isso. Queremos que a nossa comunidade tenha controle e os cuidados da preservação ambiental, histórica, cultural, artística dentro de nossas áreas. Outra preservação principal é a geológica. Como todos sabem, temos a Coluna White [formação rochosa] dentro do município de Lauro Muller, que está à disposição para novos trabalhos e uma nova audiência pública, para trazermos mais informações a vocês e dialogar o que for preciso – concluiu.

Áreas periféricas

Presidente da Associação dos Vizinhos do Morro da Igreja (AMI) e representante de proprietários e moradores do interior e entorno do Parna de São Joaquim, Erionei Mathias lamentou que o projeto não tenha avançado, após mais de um ano de reuniões em Brasília e Florianópolis com autoridades do meio ambiente. Ele destacou que os conflitos estão localizados nas áreas periféricas do parque, que abrigam diversos empreendimentos.

— Nossas áreas são extremamente preservadas, temos zero de depredação, e não há histórico na região de desmatamento. Nosso povo sabe da importância de preservar. Não somos contra nenhuma unidade de conservação, mas acreditamos que os modelos de unidades precisam ser revistos. A nossa cultura é de um povo que cuida do meio ambiente. Importantes áreas de recarga do aquífero continuam sendo mantidas, assim como estão sendo preservados todos os objetivos do parque nacional, diferente da lei de 2016 quando o ICMBio mudou a lei, e as nascentes da maior reserva de agua doce do parque foram tiradas dos limites da unidade de conservação. Todas essas discussões estão nas zonas periféricas dos contornos das limitações – afirmou.

Negociação

Professor da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) e representante da entidade no Conselho Consultivo do Parna São Joaquim, Pedro Volkmer Castilho disse que a discussão que envolve a regularização fundiária e os limites do parque é antiga, tendo sido moldada e melhorada a partir de demandas da população local.

— O parque abriu oportunidades a muitos pesquisadores, que começaram a estudar sob laboratório a céu aberto. Temos investimentos grandes de pesquisa de longa duração, novas espécies ameaçadas, ocorrência de espécies e redefinição de formações florestais. Do ponto de vista biológico, a preocupação é quando se faz um limite que não considera atributos biológicos e sensíveis para as tomadas de decisão. Cabe ajuste, não há necessidade de brigar por pequenos ajustes. É necessária negociação, avaliar situações e quais são os riscos e ameaças reais para a unidade de conservação, é possível haver negociação – concluiu.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)