Senadores avaliam venda da TAG pela Petrobras

Da Redação | 19/06/2019, 16h14

A venda de 90% da Transportadora Associada de Gás (TAG), rede de gasodutos do Norte e Nordeste, subsidiária da Petrobrás, foi debatida nesta quarta-feira (19) pela Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo (CDR). Em abril, o contrato de alienação da TAG foi anunciado ao mercado e a empresa foi arrematada pela multinacional Engie. O pagamento foi feito na quinta passada (13), num acordo de R$ 33,5 bilhões.

A TAG atua no transporte e na armazenagem de gás natural. A rede tem 4,5 mil quilômetros de gasodutos, 91 pontos de entrega, 12 estações de compressão, 75 milhões de m3/dia de capacidade instalada (100% contratada pela Petrobras), com serviços de operação e manutenção prestados pela Transpetro. A empresa tem contratos de transporte de longo prazo em vigor e faturamento líquido de R$ 4,9 bilhões/ano.

Na compra, a dívida de R$3,9 bilhões com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) foi sanada.

A audiência foi pública e interativa, ou seja, cidadãos se manifestaram contra ou favoravelmente à venda da TAG. Os favoráveis à desestatização disseram, por exemplo, que a Petrobras não precisa ser a transportadora se o seu negócio é a extração e refino.

Já os que criticam a venda dizem que a Petrobras abre mão da soberania nacional e, ao mesmo tempo, passou a depender do transporte terceirizado, que pode se tornar mais caro.

A venda da TAG foi polêmica desde o início e foi alvo de várias disputas judiciais. Uma decisão de caráter liminar do ministro Ricardo Lewandowski estabeleceu a obrigatoriedade de o Congresso autorizar e haver licitação na alienação do controle acionário de empresas estatais e suas subsidiárias (Adin 5624/DF). Para rebater a decisão liminar na Adin, há um ano, a Petrobrás usou o artigo 64 da Lei de Política Energética (Lei 9.478/1997), segundo o qual a Petrobrás é autorizada a constituir subsidiárias, as quais poderão associar-se, majoritária ou minoritariamente, a outras empresas.

Na época, acórdão do TCU ratificou esse entendimento e, mais tarde, a AGU também deu parecer favorável à Petrobrás reconhecendo a autorização para constituir e alienar subsidiárias, e deu aval ao procedimento competitivo.

Mas, para a advogada e especialista em petróleo e gás Raquel de Oliveira Souza, a venda da TAG foi “um crime para a soberania do Brasil e contra o patrimônio constuído pelo povo brasileiro”.

— A TAG é uma malha de dutos imensa, nova, construída com o dinheiro público. Teve lucro líquido, em 2016, de R$ 7 bilhões, e foi vendida por R$ 33 bilhões, valor menor que o lucro líquido de cinco anos. É eficiente vender essa empresa? — questionou.

Raquel lembrou outra desestatização: a venda da Nova Transportadora Sudeste (NTS), segundo ela, por um preço que não chega a representar o lucro líquido de cinco anos. Juntas, a NTS, no Sudeste, e a TAG, no Norte e Nordeste, compõem a malha de distribuição de gás do país.

— Do ponto de vista da soberania nacional, agora a Petrobras, que produz todo o gás do país, está na mão de duas empresas privadas. Somos reféns da Engie e da Brookfield. Colocamos a política energética brasileira nas mãos delas — lamentou.

De acordo com a advogada, os relatórios trimestrais da Petrobras já apontam os prejuízos das vendas das subsidiárias, com aumento da despesa de transporte do gás nos dutos vendidos.

— Em 18 meses, a Petrobras já vai ter pago em aluguel dos dutos à Brookfield (nova dona da NTS), o que ela recebeu pela venda desses mesmos duto — afirmou.

Os senadores que se manifestaram na audiência se posicionaram contrários à venda da TAG. Jaques Wagner (PT-BA) disse que as alienações da Petrobras não contribuem para o desenvolvimento no Brasil e as comparou às privatizações do governo FHC.

— As formalidades podem ter sido cumpridas, mas não há objetivo nesse desinvestimento — declarou.

O senador Jean Paul Prates (PT-RN) também criticou a venda da TAG, dizendo que a Petrobras está “vendendo as botas e os pés”. Para ele, é criminoso vender ativos para fazer caixa num momento em que está endividada.

— Num país que já está autossuficiente em petróleo, é impensável um movimento desses — observou.

Defesa

A Petrobras foi representada na audiência pela assessora jurídica Claudia Zacour. Ela apresentou o programa de desinvestimentos da Petrobras e defendeu a alienação dos ativos e as ações de sua titularidade, como decorrentes de um programa de desestatização condizente com a Lei Geral do Petróleo (Lei 9.478/97) e da Lei das Estatais (Lei 13.303/2016).

— Hoje, a Petrobras precisa diminuir sua dívida para ter financiamentos mais baratos e se alinhar aos seus pares internacionais, por isso essa desalavancagem é muito necessária — completou.

Ela explicou que a política de desinvestimentos da Petrobras condiz com a atual gestão ativa do portfólio, o qual a empresa seleciona os ativos que a companhia está mais vocacionada, concentra os investimentos nesses negócios e abre mão da titularidade de outros.

— Isso não significa que a empresa deixará de atuar nos segmentos dos quais ela abriu mão da titularidade. A Petrobras não pretende, por exemplo, sair do segmento de refino. O que nós vamos fazer é um reposicionamento da empresa nessa área.

Novo mercado

A venda da TAG reflete a tentativa de abertura do setor, batizada pelo governo como “Novo Mercado de Gás”. O programa foi criado para melhorar a competitividade no setor de energia. Seus quatro pilares básicos são: promover a concorrência; integrar o gás natural aos setores elétrico e industrial; harmonizar regulações estaduais e federal; e remover barreiras tributárias.

Na audiência, o secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia, Márcio Bezerra, explicou que o gás mundialmente é o combustível da transição energética.

— O gás ajuda a aumentar a capacidade de energias renováveis no Brasil, porque as térmicas a gás suprem a variação das outras fontes de energia, como hidráulica — que passa por momento de estiagem — e eólica e solar, que têm variação diária porque dependem de condições climáticas.

Bezerra afirmou que o país tem vivido uma desindustrialização em áreas que dependem de gás para serem mais competitivas. Ele lamentou o fechamento de fábricas no Brasil e a perda de mercado para outros países, como o Paraguai, que oferece energia mais barata. Exemplo disso, são os setores de celulose, fertilizantes hidrogenados, petroquímica, siderurgia, entre outros.

A mudança nas bases do mercado de gás também foi abordada pelo representante da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Hélio Bisaggio. Superintendente de Infraestrutura, ele avaliou que o Programa "Gás para Crescer” estabeleceu um novo desenho de mercado para a indústria do gás natural e representou uma evolução para a Lei do Gás (Lei 11.909/2009), mas não proporcionou a abertura de mercado que era esperada. Isso pode acontecer no programa Novo Mercado de Gás.

Bisaggio explicou que ele pressupõe atos normativos que separam atividades de transporte das atividades potencialmente concorrenciais. Ele lembrou que dezenas de empresas já fazem a produção e exploração no Brasil, mas, na comercialização, a Petrobras continua dominante.

— O Novo Mercado de Gás traz regras de independência do transportador, reserva da capacidade de entrada e saída, tarifas de transporte aprovadas pela ANP, coordenação dos transportadores, códigos comuns de rede (network codes), e transparência no oferecimento e contratação dos serviços.

De acordo com o representante da ANP, o objetivo do Novo Mercado de Gás é fazer surgir um mercado líquido e competitivo com transparência na formação dos preços e liquidez de curto prazo.

Ele comentou que tradicionalmente os contratos pressupõem a exclusividade do duto e por muito longo prazo. Exemplo disso, é o contrato de fornecimento com a Bolívia, de 20 anos, e o transporte dele, na TVG, por exemplo, vai até 2041.

— O novo modelo tem contratos padronizados e de menor prazo, dando maior liquidez e mais garantias para quem compra e quem vende.

Independência

O superintendente destacou a criação de HUBs (pontos virtuais) de negociação e disse que o acesso ao sistema de transporte é pré-condição para o desenvolvimento de um mercado concorrencial de gás natural.

— A experiência mundial mostra que a independência do transportador é fundamental para o setor.

Segundo Bisaggio, o Brasil estaria atrasado nesse sentido: nos EUA, a independência de transporte aconteceu por volta de 1930 e, na Europa, entre os anos 1990 e 2010.

Na reunião, Marcelo Lima Mendonça, da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás (Abegás), destacou que hoje o sistema não dá acesso para se comprar o gás de vários ofertantes. Ele esclareceu que o Brasil tem potencial de dobrar a produção de gás nos próximos dez anos.

— Mas hoje ele não gera royalties, não gera empregos, não gera impostos e muitas vezes o gás é reinjetado. Esse ciclo a gente precisa quebrar, desenvolver a infraestrutura e monetizar o gás.

Ele apontou a ociosidade do sistema como alta, onerando o usuário final do sistema, o consumidor. Ele também comentou que a infraestrutura da TAG, apesar de robusta, ainda se concentra no litoral e seria preciso desenvolver a infraestrutura no território como um todo.

Marcelo, contudo, acredita que a venda da TAG não mudará de maneira significativa o mercado.

— Os dutos permanecem 100% contratados e a Petrobras segue responsável pela operação desses dutos — concluiu.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)