Participação da iniciativa privada é essencial para saneamento, diz ministro

Da Redação | 16/04/2019, 14h45

Trazer a iniciativa privada para investir em saneamento básico foi a principal mensagem deixada nesta terça-feira (16) pelo ministro do Desenvolvimento Regional, Gustavo Canuto, em audiência pública sobre a Medida Provisória 868/2018. A audiência foi promovida pela comissão mista que avalia a MP, editada no final do governo Temer.

Canuto mostrou que a previsão de investimento do Plano Nacional de Saneamento Básico de 2019 a 2023 é de R$ 112,3 bilhões e que, desse montante, R$ 44 bilhões virão de agentes federais. A longo prazo, a estimativa é de R$ 597,8 bilhões até 2033.

De acordo com ele, há atualmente R$ 4 bilhões disponíveis para saneamento. Para cumprir a meta de curto prazo (R$ 44 bilhões de 2019 a 2023), seria necessário mais do que o dobro dessa quantia por ano.

— Precisaríamos ter mais do que o dobro, quase R$ 9 bilhões por ano. A necessidade de investimento não pode ser obtida somente com os agentes públicos. Precisamos de parceria com a iniciativa privada — reconheceu.

Ao avaliar o texto da MP, Canuto destacou a necessidade de garantir que os pequenos municípios não atrativos economicamente sejam atendidos com água potável e esgoto nos mesmos contratos dos que são atrativos (subsídio cruzado). Ele acredita que o modelo proposto pela MP não garante isso ainda.

A sugestão para melhorar o texto é que a iniciativa privada vá ganhando o mercado à medida que as empresas públicas melhorem sua capacidade de gestão. O recurso viria, então, da eficiência da gestão pública e da ampliação da rede de contribuintes: a companhia estatal melhora sua gestão, ao mesmo tempo abrindo espaço para a iniciativa privada. Também ao mesmo tempo, seria dado estímulo à prestação regionalizada por meio de blocos sustentáveis (aliando os municípios que não têm atratividade econômica aos que são atrativos).

A comissão mista que analisa a MP é presidida pelo deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES) e tem como vice-presidente o senador Nelsinho Trad ((PSD-MS). O relator é o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).

— Não há outro caminho para o Brasil que não seja um investimento maciço, e não se faz isso sem participação da iniciativa privada. O governo tem o papel principal de regulação, fiscalização e fomento. Cabe trazer a iniciativa privada a participar. Precisamos de fato melhorar a eficiência, e há espaço para aumentar a oferta de serviço e aumentar a arrecadação. Isso é criar um novo ambiente, com uma nova capacidade.

O ministro disse que é preciso criar meios que seja atrativo para o setor privado, sem a inocência de achar que só porque é privado, é bom.

— Nem toda concessão é bem-sucedida, nem todo serviço público é bem prestado. Independentemente de ser privado ou público, o que garante a eficiência é o contrato, a gestão e a fiscalização. Somos defensores de um serviço que atenda bem ao cidadão.

Outras propostas

O ministro fez outras propostas de avanço no texto da MP, que já havia tramitado no Congresso como MP 844/2018, perdeu a validade em novembro e foi reeditada no mês seguinte.

Na avaliação de Canuto, é preciso cautela sobre a MP em relação à obrigatoriedade imediata de chamamento público, pelos municípios e pelo DF, a empresas privadas.

— A obrigatoriedade sem uma fase de transição pode causar a rejeição da MP no Congresso — previu.

Na opinião dele, também é preciso definir com mais clareza a titularidade do serviço quando há interesse comum e a gestão for associada (a MP diz que os municípios e o Distrito Federal são os titulares dos serviços públicos de saneamento básico e, na hipótese de interesse comum, o exercício da titularidade dos serviços de saneamento básico será realizado por meio de colegiado interfederativo ou de instrumentos de gestão associada, por meio de consórcios públicos ou de convênios de cooperação).

Canuto defendeu ainda a divulgação de regras claras para caso de alienação do controle acionário da estatal, ou seja, clareza sobre os contratos de cada programa, por quanto tempo valem e se o ativo da estatal passa para a companhia que assume o serviço, caso venha a ser desestatizada.

— O jogo aberto e bem definido para as companhias privadas entenderem e verificarem se vale ou não a pena entrar nessa situação.

O ministro se posicionou favorável à possibilidade de subdelegação do investimento privado (dessa forma a companhia estadual poderia delegar parte ou integralmente os serviços para a iniciativa privada, permitindo a coexistência).

Por fim, insistiu na adoção de um licenciamento mais simplificado e prioritário e o alargamento do prazo para os municípios instalarem seus aterros e se adequarem às normas de destinação correta dos resíduos sólidos.

Pontos fortes

Canuto classificou alguns pontos da MP 868/2018 que considera como avanços em relação à atual legislação. Um deles é a prerrogativa da Agência Nacional de Águas (ANA) de instituir referências,  normas e modelos, além da competência para decretar situação de escassez hídrica, fiscalização do cumprimento das regras e mediação arbitral no caso de conflito entre os entes federados.

— A ANA vai atuar para que os municípios e estados sejam pautados pelas melhores práticas de governança com o objetivo de criarmos programas com indicadores e metas que possam ser de fato fiscalizados, para alterar a realidade do saneamento no médio e longo prazo.

Ele também enumerou como pontos favoráveis da MP a criação de comitê interministerial para gestão do saneamento. O ministro destacou o benefício dos planos simplificados de saneamento para municípios abaixo de 20 mil habitantes e apoiou a obrigatoriedade de pagamento da tarifa da rede de esgoto quando disponível, mesmo que não seja usada. Por fim, defendeu a participação da União nos fundos de universalização.

Fragilidades

Apesar dos avanços, a Secretaria de Saneamento, vinculada ao ministério de Canuto, entendeu que a MP desconstrói “abruptamente o modelo atual de serviços”, ocasionando “sérios prejuízos às companhias estaduais”.

Canuto também apontou o problema dos municípios de menor porte com piores IDHs. Segundo ele, o texto não soluciona os principais entraves à universalização dos serviços de saneamento.

— Não há um modelo de gestão regionalizada e integrada, ou seja, a lei precisa colocar os municípios mais atrativos economicamente com aqueles menos atrativos, possibilitando o atendimento universal.

Além disso, o ministro apontou falha no texto por não tratar da indenização de ativos não amortizados (nos casos de alienação e mudança da estatal) e disse que a MP mantém o texto sobre licenciamento ambiental da Lei 11.445, de 2007.

— É importante que o licenciamento seja simplificado e mais ágil — defendeu.

Situação sanitária

No encontro com os senadores e deputados da comissão mista que estuda a MP 868/2018, o ministro mostrou um gráfico sobre a evolução do atendimento urbano de água de 2007 a 2017 e de esgotamento sanitário. O mapa mostra que pouco mudou no abastecimento de água e de esgoto em dez anos.

Dados do Ministério do Desenvolvimento Regional apontam que 160 milhões de brasileiros têm abastecimento de água, mas há uma concentração no Centro-Oeste, Sul e Sudeste. A Região Norte tem 70% de abastecimento, contra 98,4% da Região Sul.

— E em esgotamento sanitário é muito pior: a Região Norte tem apenas 13% de serviço de esgotamento nas áreas urbanas, e menos de 10% na área rural — completou o ministro.

Canuto defendeu o olhar sobre a realidade regional e políticas diferenciadas principalmente para Norte e Nordeste, tendo, como exemplo, o uso de aterros sanitários.

— O Brasil envia 37% dos resíduos sólidos para aterros sanitários e 63% do lixo tem destinação inadequada, ou nem mesmo há informação. Aqui também é notória a desigualdade entre as regiões: enquanto no Sul os aterros são o destino de 80% dos resíduos, no Nordeste apenas 9% vão para os aterros; 91% do volume têm destinação inadequada.

Privatização

Entre os deputados e senadores que debateram o assunto com o ministro Gustavo Canuto, a maior preocupação foi a privatização do sistema e a garantia do subsídio cruzado. O deputado Edmilson Rodrigues (PSOL-PA) classificou a MP como “perversa”.

— A MP entrega de mãos beijadas o princípio da universalidade do saneamento básico. Em Manaus, privatizar não deu certo.

Também contrário à MP, o deputado Afonso Florence (PT-BA) acredita que a MP seja inconstitucional. Ele reconheceu, contudo, um avanço no posicionamento do governo ao suprimir a obrigatoriedade de que os municípios façam o chamamento para empresas privadas.

— Isso retira uma contradição que inviabilizava qualquer discussão sobre a MP. Considero que há um avanço na posição do governo.

Joice Hasselmann (PSL-SP), líder do governo no Congresso, ressaltou que a entrada das empresas privadas pode trazer eficiência e maior alcance dos serviços. Ela comparou o saneamento com a abertura do mercado de telefonia, que se abriu para a iniciativa privada e, por causa disso, conseguiu popularizar o serviço.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)