Especialistas cobram mudança em leis para incentivar doação de alimentos
iara-guimaraes-altafin | 19/05/2016, 13h41
Especialistas reunidos nesta quinta-feira (19) em debate na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) defenderam o fim da responsabilização civil e penal de doador de alimentos por dano causado ao beneficiário, pelo consumo do bem doado, desde que não se caracterize dolo ou negligência.
Conforme explicou Paulo Renê Bernhard, presidente do Banco de Alimentos do Rio Grande do Sul, essa responsabilização, prevista nos Códigos Civil (Lei 3.071/1916) e Penal (Decreto-Lei 2.848/1940), dificulta as doações e contribui para o desperdício de alimentos.
— Um empresário será civil e criminalmente responsabilizado se doar alimento e esse alimento causar dano à saúde humana. Precisamos de uma pequeníssima alteração na legislação, que diga que ele será civil e criminalmente responsabilizado se for comprovado que houve dolo ou má-fé — defendeu.
Para Kathleen Sousa de Oliveira, do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), a medida é positiva, pois reduzirá o receio da doação por parte de fabricantes de alimentos, donos de supermercados e de restaurantes.
No entanto, ele apontou a necessidade de alertar doador e beneficiário sobre os riscos sanitários envolvidos.
— Não adianta isentar de responsabilidade e não ter uma atividade educativa com esse doador, porque ele nem sempre sabe em que condição o alimento tem que estar para poder ser doado. Isso é extremamente importante.
Por esse motivo, Kathleen Oliveira sugeriu que as doações não sejam feitas diretamente aos beneficiários, mas a instituições responsáveis pela distribuição dos alimentos.
— [A instituição] tem que seguir as normas da vigilância sanitária, ela é fiscalizada. Então, a gente consegue assegurar que, quando o alimento chegar ao beneficiário, alguém estará olhando para os riscos envolvidos nessa doação e no recebimento desse alimento — observou.
Projetos
O fim da responsabilidade civil e criminal do doador é um aspecto comum a três projetos de lei que visam reduzir o desperdício de alimentos e tramitam na Comissão de Agricultura: PLS 672/2015, de Ataídes Oliveira (PSDB-TO); PLS 675/2015, de Maria do Carmo Alves (DEM-SE); e PLS 738/2015, de Jorge Viana (PT-AC).
O debate desta quinta-feira, como destacou a presidente da CRA, senadora Ana Amélia (PP-RS), ajudará no exame dessas matérias.
— Estamos consolidando uma legislação para dar segurança a doadores e beneficiários, segurança jurídica e, sobretudo, segurança alimentar. O alimento que a pessoa vai receber deve estar em condição de sanidade e com valor nutricional — resumiu a parlamentar.
O relator das proposições, Lasier Martins (PDT-RS), apresentará substitutivo reunindo sugestões de especialistas e dos colegas da comissão.
— Teremos ainda mais um debate, com a presença de proprietários de restaurantes e bares. Pretendo fazer esse relatório em conjunto, consultando os colegas à medida que formos aprontando determinados pontos, principalmente os três autores dos projetos — disse.
Alimentos preparados
Na audiência pública, Ana Amélia e Waldemir Moka (PMDB-MS) manifestaram preocupação com o desperdício de alimentos preparados, especialmente em refeições servidas nos refeitórios de grandes empresas, nos presídios e escolas.
— Há uma "quebra" estimada de 10 a 12% no sistema de produção de refeições coletivas. Num país que passa fome, é uma injustiça muito grande. Vamos modificar a lei para criar condição de doação — frisou Ana Amélia.
Para a senadora, já existem no país soluções para o acondicionamento da comida já preparada e seu transporte até as instituições beneficentes, sem o risco de contaminação ou deterioração.
— Há 15 anos, o sistema adotado no Rio Grande do Sul leva a comida dos refeitórios coletivos para as instituições e, em 15 anos, não aconteceu um caso sequer de contaminação — disse.
Aprendizado
O Banco de Alimentos do Rio Grande do Sul, como contou Paulo Renê Bernhard, é liderado pela Federação das Indústrias do estado e interliga uma rede que coleta, armazena e distribui alimentos doados a 331 entidades, beneficiando 21 mil famílias.
No Brasil, informou Kathleen Oliveira, existem 220 bancos de alimentos, dos quais 80 são públicos. Mensalmente, são distribuídos alimentos a dez mil instituições beneficentes, que ajudam na alimentação de quatro milhões de pessoas.
Os senadores conheceram ainda a experiência do Sesc, que contabilizou a distribuição de 45 milhões de quilos de alimentos em 2015, complementando a refeição de 1,6 milhão de pessoas, como relatou Ana Cristina Barros, representante do órgão no debate.
— O trabalho do banco de alimentos pressupõe necessariamente o combate ao desperdício, fazendo que o alimento ainda saudável, que teria como destino o lixo, seja distribuindo a pessoas em situação de vulnerabilidade — frisou, dizendo ser imprescindível o engajamento da sociedade no trabalho.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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