Marcio Maturana

Novidades e expectativas marcaram este ano o Dia do Servidor Público, comemorado em 28 de outubro. Entre as novidades, estão o fim da aposentadoria integral e a divulgação nominal dos salários. As principais expectativas são a regulamentação do direito de greve e as cotas raciais em concursos. Há ainda projetos antigos, como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 36/07, de Paulo Paim (PT-RS), proibindo vencimento menor que um salário mínimo.

— O Estado só se materializa no trabalho do servidor. Não cabe, na atual fase de desenvolvimento do Brasil, ganhando liderança continental e mundial, ter avareza com os servidores. É preciso pagar pelo menos o salário de mercado, senão a pessoa aprende no serviço público e vai trabalhar na iniciativa privada — disse o presidente da Confederação dos Servidores Públicos do Brasil, João Domingos.

Os debates sobre serviço público vão além da remuneração, como atesta Ana Amélia (PP-RS), que integra a Frente Parlamentar Mista para o Fortalecimento da Gestão Pública, lançada em junho deste ano.

— Só no Senado, temos 466 projetos sobre gestão pública.

Um dos objetivos da frente é discutir assuntos que se tornam projetos de lei sem diálogo prévio. A senadora cita como exemplo a proposta de cotas, que o governo planeja enviar ao Congresso ainda este mês, definindo reserva de 30% das vagas para negros.

Para Alvaro Dias (PSDB-PR), a proposta pode reduzir a qualidade do serviço público.

— Cotas são uma manifestação de preconceito, subestimam a inteligência dos negros. O servidor deve ter talento, competência e preparo, independentemente da cor da pele — afirmou Alvaro.

Paim, autor do Estatuto da Igualdade Racial, defende que cotas permitirão construir uma sociedade mais igualitária.

— Meu texto original para o Estatuto já previa cotas raciais de 20% em concursos. Acho muito bom que o governo retome esse tema agora, pois os negros estão claramente sub-representados no serviço público — disse o senador.

Paim é autor também de um dos projetos sobre direito de greve. O PLS 84/07 deve ser votado ainda este ano através de substitutivo da relatora, Ana Amélia. O texto estabelece que pelo menos 30% devem trabalhar na greve e amplia os serviços considerados essenciais, em áreas como saúde e segurança. Já o PLS 710/11, de Aloysio Nunes (PSDB-SP), determina que de 50% a 80% trabalhem durante a greve.

Aposentadoria

O fim da aposentadoria integral deve valer para quem ingressar no serviço público federal a partir de fevereiro, segundo a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, ou para atuais servidores que desejarem aderir. Quem quiser receber mais que o teto do Regime Geral da Previdência (R$ 3.916,20) deverá contribuir para um fundo ­complementar. O valor a ser recebido dependerá de fatores como o desempenho financeiro do fundo. Executivo, Legislativo e Ministério Público terão um fundo conjunto, e o Judiciário terá seu próprio fundo.

Já a divulgação nominal dos salários, para cumprir a Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/11), passou a ser feita em meio a uma guerra de liminares na Justiça, pois o movimento sindical sustenta que isso afronta a privacidade garantida pela Constituição e causa insegurança não só pessoal, mas até institucional.

— Um auditor fiscal, por exemplo, fica fragilizado diante de uma grande empresa porque seu contracheque está exposto. O governo deveria preservar o sigilo por interesse estratégico — disse João Domingos.

Índice de empregos abaixo da média

Considerando União, estados e municípios, o Brasil tem hoje mais de 10 milhões de servidores nos Três Poderes, em bancos públicos, estatais, fundações e autarquias da administração pública direta e indireta. Esse total significa 10,1% dos trabalhadores formais e informais,um percentual muito abaixo da média mundial de 22%, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Na Dinamarca, os servidores públicos são 39,2% dos trabalhadores. Até nos Estados Unidos, considerados a meca da livre iniciativa capitalista, o percentual é maior que o brasileiro: 15%.

As despesas do Brasil com esse quadro representam 12% do produto interno bruto (PIB), de acordo com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. A média mundial é semelhante (11%), mas no Brasil pelo menos um terço é gasto com aposentados que não são cobertos com contribuição corrente. Em outros países, eles não constam da folha de pagamento.

Nos últimos anos, o Brasil tem demonstrado um fortalecimento do serviço público. Segundo o Ipea, entre 1995 e 2002 o crescimento médio anual era de 1,55%, mas de 2003 a 2007 passou para 3,63%, graças a concursos.

No mesmo período, verificou-se aumento de estatutários em relação a contratados pela CLT. O Ipea credita isso ao fortalecimento da democracia: “O aumento da demanda da sociedade por mais quantidade e qualidade dos serviços públicos tem impulsionado contratações para essas tarefas a partir de concursos públicos, tornando mais transparente o acesso a essas vagas”.

História: das indicações aos concursos

O Dia do Servidor foi instituído como 28 de outubro pelo então presidente Getúlio Vargas, em 1943, porque esta é a data do Decreto 1.713/39, um dos primeiros documentos do Brasil com normas sobre funcionários públicos.

Os servidores passaram a existir formalmente em 1937, quando foi criado o Conselho Federal do Serviço Público. O termo “funcionário público” foi trocado para “servidor público” em 1990, com o Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União.

Direitos e deveres estão definidos também na Constituição e nos estatutos das entidades. Antes da Carta Magna de 1988, que estabeleceu o concurso público, muitos servidores ganhavam o emprego devido a critérios políticos, de amizade ou familiares. Na década de 1990, políticas de reestruturação resultaram em demissões e terceirização, e as consequências afetaram a qualidade dos serviços. A tendência começou a ser revertida em 2003, mas os vínculos de trabalho ainda crescem mais no setor privado (58,6% de 2003 a 2010) do que na administração pública (25,2%), segundo o Ipea.

Ano passado, houve mais de 10 milhões de inscrições para concursos, estima a Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac). O que atrai é a estabilidade e a remuneração: o salário médio é 41,1% maior que na iniciativa privada (R$ 2.458 contra R$ 1.742), segundo o IBGE.


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