Reparação pode ser imediata em 90% dos casos de mastectomia

 

Joseana Paganine
O câncer de mama é uma espécie de fantasma que assusta toda mulher. Muitas vezes a cura envolve a mutilação do corpo naquilo que é mais simbólico da feminilidade, os seios, colocando em risco também a saúde psíquica da mulher.

 

Foi por causa disso que o Congresso Nacional aprovou e a presidente da República, Dilma Rousseff, sancionou a Lei 12.802/2013, que obriga o Sistema Único de Saúde (SUS) a fazer a cirurgia plástica reparadora da mama logo em seguida à retirada do câncer, quando houver condições médicas. A lei anterior (Lei 9.797/1999) já previa que mulheres que sofressem mutilação total ou parcial de mama (mastectomia) teriam direito a cirurgia plástica reconstrutiva, mas sem especificar o prazo em que ela deveria ser feita.

Se a reconstrução não puder acontecer imediatamente, a paciente deverá ser encaminhada para acompanhamento clínico. O projeto que deu origem à lei é de autoria da deputada licenciada Rebecca Garcia (PP-AM).

O vice-presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM) no Centro-Oeste, Rodrigo Pepe Costa, avalia que a intenção da lei é excelente. Segundo ele, em 90% dos casos de mastectomia, a reconstrução pode ser feita na mesma cirurgia de retirada do câncer.

— A reconstituição imediata da mama traz um benefício enorme para a autoestima da mulher. O estigma da mastectomia é muito grande. Há estudos que mostram que a mama é o ponto principal da feminilidade —considera.

A presidente da Associação de Mulheres Mastectomizadas de Brasília (Recomeçar), Joana Jeker, acredita que, com a obrigação legal, os hospitais vão ter de se preparar para a reconstituição. Para ela, a lei é uma grande conquista.

— Até pouco tempo atrás, não se falava em reconstrução de mama. E ter as mamas reconstruídas é um renascimento para a mulher. O impacto na autoestima, no relacionamento afetivo e na vida social é muito grande.

Realidade

De acordo com dados do Ministério da Saúde, o Brasil possui 181 serviços de saúde habilitados a fazer cirurgia reparadora de mama. Em 2012, foram realizadas pelo SUS 1.392 reconstruções mamárias, a um custo de aproximadamente ­R$ 1,15 milhão. Segundo dados da Sociedade Brasileira de Mastologia, das cerca de 20 mil mulheres que precisam fazer cirurgia de retirada das mamas, menos de 10% saem dos centros cirúrgicos com os seios reconstruídos.

 

Integrantes da Associação Recomeçar fazem manifestação em audiência pública sobre prótese mamária, realizada pelas Comissões de Assuntos Sociais e de Direitos Humanos

Segundo Rodrigo Pepe, não há estrutura nos hospitais públicos para realizar o que manda a lei. As deficiências vão da falta de centro cirúrgico à ausência de médicos qualificados. Para fazer o procedimento, é preciso ser cirurgião plástico ou mastologista com especialização em reconstrução de mama.

 

Mastologista do Hospital de Base (HBDF), o maior de Brasília, Pepe conta que, atualmente, não há cirurgiões plásticos no hospital. Na estrutura da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, a categoria está lotada em outra unidade, o Hospital Regional da Asa Norte (HRAN). Quando a mastectomia é feita por um mastologista habilitado em reconstrução, não há problema. Ele mesmo pode fazer a cirurgia reparadora. Onde não existe mastologista qualificado, o trabalho tem de ser feito em conjunto com o cirurgião plástico habilitado.

Em outras ocasiões, a dificuldade é o centro cirúrgico. Segundo Pepe, às vezes, o médico precisa escolher se ocupa a sala de cirurgia por duas horas para fazer a mastectomia e a reconstrução ou se a ocupa pelo mesmo período e faz duas mastectomias.

— É uma decisão difícil para os médicos. E se é assim na capital da República, imagine pelo Brasil afora. A diferença entre os hospitais é enorme. Há lugares completamente sem estrutura, sem médicos, sem centro cirúrgico.

O mastologista levanta outro impedimento para a realização de mais reconstruções logo após a mastectomia: o valor pago pelo SUS para os médicos e hospitais conveniados. Ele classifica de “irrisória” a quantia paga aos profissionais. Segundo o Banco de Dados do Sistema Único de Saúde ­(Datasus), o valor repassado ao hospital e à equipe profissional por uma “plástica mamária reconstrutiva ­pós-mastectomia com implante de prótese” é de R$ 315,92.

— Quem trabalha por produtividade não tem interesse em fazer a cirurgia reparadora pelo SUS por causa da baixa remuneração. O mérito da lei é levantar esses problemas — ponderou Rodrigo Pepe.

 


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