Advogada: dispositivo institucionaliza violência policial e viola direitos

Da Redação | 08/09/2015, 10h30

 

Senadores querem estrutura de segurança pública com base no direito à cidadania. Foto: Tânia Rêgo/ABr

 

A política de combate às drogas e a atuação da polícia militar foram alvo de duras críticas por vários convidados aos debates da CPI do Assassinato de Jovens.

 

A advogada Natália Damazio Pinto Ferreira, representante da Justiça Global, apontou como marco para a institucionalização da violência policial a criação em 1969, durante a ditadura militar, do dispositivo conhecido como auto de resistência.

 

— Uma das características marcantes do auto de resistência é justamente que quem fica em julgamento é a vítima, e não o fato, nem se tenta investigar a autoria do homicídio — explicou a advogada.

 

Segundo Natália, a manutenção do auto de resistência vem garantindo a violação de direitos humanos, de princípios e normas do direito penal e processual penal, sem que isso seja visto como violação dessas normas. Grande parte dos procedimentos de investigação é deixada de lado quando há homicídio por policiais em áreas de periferia. Ocorre a remoção de cadáveres sem perícia, pela prática do “falso socorro”, ou mesmo se impede o socorro às vítimas. A investigação muitas vezes é marcada por uma comunicação entre o Ministério Público e Polícia Civil, em que não se faz nenhuma diligência em si, mas fica pedindo-se mais tempo para investigação. Não há perícia oficial na cena do crime e tampouco perícia autônoma independente.

 

A advogada citou casos emblemáticos de jovens e crianças negros assassinados pela polícia em megaoperações nas favelas do Rio de Janeiro, caso do menino Gilson, de 12 anos, no Morro do Dendê, e também onde há unidades de polícia pacificadora (UPPs), com registro de 50 pessoas executadas.

 

— Seria importante levar em conta a participação direta do Estado na morte de jovens no país. A redução dos homicídios não pode ser concretizada sem que se discuta o fim do racismo, a desmilitarização da polícia e um reforço das instituições de direitos humanos — defendeu.

 

Condenação

 

Natália relatou que, recentemente, durante uma audiência pública na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), foi apontado que os autos de resistência representavam não apenas o indicativo de uma transição para o período democrático falha, como também um sintoma de racismo estruturante da sociedade brasileira.

 

O Brasil já foi condenado na CIDH por um caso de auto de resistência, que foi o assassinato do jovem Wallace de Almeida, de 18 anos, no Morro da Babilônia, Rio de Janeiro, em 1998. Ele foi executado durante uma operação policial e a família foi impedida de fazer o socorro.

 

Para Lídice da Mata, a estrutura de segurança pública brasileira precisa ser pensada com base no direito da pessoa humana, no direito à cidadania.

 

— O que nós verificamos é que acontece a morte de um policial naquele território e a polícia volta para, digamos assim, realizar sua vingança. Encontra grupos de jovens envolvidos com o tráfico de drogas e a matança se dá. E tudo sob a justificativa de que é possível ter licença para matar porque se trata de tráfico de drogas. Não é possível que nós continuemos com essa política de enfrentamento das drogas no Brasil — considera.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)