A comissão parlamentar de inquérito (CPI) do Congresso que investiga redes de exploração sexual de crianças e adolescentes no Brasil foi criada em julho deste ano. À frente dos trabalhos estão a senadora Patrícia Saboya (PPS-CE) – foto –, na presidência, e a deputada Maria do Rosário (PT-RS), na relatoria. A CPI já recebeu mais de 300 denúncias e realizou diligências em 13 cidades. Em entrevista ao Jornal do Senado, Patrícia adiantou que a data para o término dos trabalhos da CPI é 13 de dezembro, prazo que pode ser prorrogado.

Que retrato a CPI já faz do problema após quase quatro meses de trabalho?

Constatamos que a demanda por "serviços sexuais" de crianças e adolescentes é mais complexa do que pensávamos, e o perfil dos clientes e exploradores é diversificado. Pessoas consideradas acima de qualquer suspeita também estão envolvidas, como políticos, juízes, promotores, líderes religiosos, policiais e outras autoridades. Além disso, a CPI já deparou com dois problemas jurídicos: morosidade da Justiça e existência de uma clientela específica que detém foros privilegiados para se defender, o que acaba dificultando a resolução dos casos.

Onde a exploração e o abuso ocorrem mais freqüentemente?

Esses são crimes que ocorrem em todo o país e são cometidos pelos mais variados personagens. É claro que, em certos locais, a exploração sexual está ligada à pobreza. No Vale do Jequitinhonha, crianças fazem programas em troca de 50 centavos. No Rio de Janeiro, temos casos em que meninas chegam a ganhar 500 dólares, ou R$ 1,99. Descobrimos que o tráfico interestadual de crianças para fins sexuais é comum e que os crimes nas regiões de fronteiras são uma realidade. Outro ponto é que muitos líderes religiosos (quer sejam da Igreja Católica, Evangélica ou de religiões afro-descendentes) usam seu poder para explorar crianças sexualmente.

Como o Parlamento pode ajudar a combater o problema?

O Congresso tem dado contribuição valiosa ao enfrentamento do problema. Em 1993, foi instalada a primeira CPI para investigar o assunto e, agora, voltamos à questão. Mas nosso papel vai além. Precisamos garantir mais recursos no Orçamento para programas de combate e prevenção e melhorar o arcabouço legal referente aos crimes sexuais.

Que outras medidas seriam eficazes?

Quanto ao atendimento das vítimas, é necessário melhorar a rede de proteção social. Crianças, suas famílias e agressores devem ser tratados por equipes multidisciplinares. Só assim é possível evitar que as vítimas e suas famílias fiquem marcadas para sempre e que os agressores voltem a cometer as mesmas atrocidades.

Quanto à prevenção, uma das estratégias são os projetos de transferência de renda vinculados à educação. É essencial incluir meninos e meninas explorados sexualmente ou em situação de risco nessas iniciativas. Mas só isso não é suficiente.

Sabemos que, em muitos casos, os programas rendem mais que o valor das bolsas. Precisamos pensar em políticas públicas capazes de tornar esses programas mais atraentes. Por que não oferecer a essas crianças e adolescentes cursos de computação e de moda, por exemplo? É importante ainda criar uma cultura entre as famílias e as crianças de valorização da educação e da cidadania.

Como o cidadão pode ajudar?

O primeiro passo é a denúncia. O governo federal tem um serviço específico para recebê-la, que é o 0800 99 0500. Além disso, as pessoas devem ficar atentas, no seu cotidiano, à proteção de crianças e adolescentes, observando, por exemplo, estabelecimentos como bares, boates, motéis e hotéis.


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