Mudanças nas regras de inelegibilidade serão votadas depois das eleições
Augusto Castro | 03/09/2024, 19h56
Após pedido do relator, senador Weverton (PDT-MA), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, decidiu adiar a votação do projeto de lei da Câmara dos Deputados que flexibiliza as regras de inelegibilidade. O PLP 192/2023 foi debatido em Plenário nesta terça-feira (3) e foi alvo de duras críticas de vários senadores, que enxergam a proposta como um enfraquecimento da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135, de 2010). A matéria retornará para votação no Plenário após as eleições municipais deste ano.
O PLP 192/2023 é de autoria da deputada federal Dani Cunha (União-RJ) e outros deputados, foi aprovada na Câmara em setembro do ano passado e teve parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado no mês passado.
O projeto altera a contagem de início e o prazo de duração, além de outras regras relacionadas à inelegibilidade. O texto unifica em oito anos o prazo em que os candidatos ficam impedidos de disputar eleições por condenação judicial, cassação ou renúncia de mandato. Pela regra atualmente em vigor, há situações em que o impedimento para disputar eleições pode ultrapassar oito anos.
A proposta determina que o período de inelegibilidade passe a ser único: oito anos contados a partir de um dos seguintes eventos:
- data da decisão que decretar a perda do mandato;
- data da eleição na qual ocorreu prática abusiva;
- data da condenação por órgão colegiado; ou
- data da renúncia ao cargo eletivo.
Para Weverton, o projeto aperfeiçoa a legislação eleitoral e confere mais objetividade e segurança jurídica ao fixar o início e o final da contagem de inelegibilidades.
— As regras previstas no PLP pretendem aperfeiçoar a legislação, especialmente no tocante ao prazo de duração de inelegibilidade, aqui igualado e limitado em todas as hipóteses, para coibir distorções que hoje ocorrem, em que políticos e detentores de mandato podem ser condenados a sanções de inelegibilidade, e incidem de forma desigual, configurando-se, assim, afronta ao princípio constitucional da isonomia.
O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) ponderou que a Lei da Ficha Limpa é fruto de anseio da população, pois foi fruto de iniciativa popular apresentada ao Congresso com mais de um milhão de assinaturas de cidadãos.
— Com a Lei da Ficha Limpa, este Congresso atendeu a um clamor popular. Ela veio para moralizar a política brasileira. Nós vamos estar passando um atestado de que estamos votando a favor daqueles que cometem delitos, de que estamos amaciando a Lei da Ficha Limpa.
Também cítico ao projeto, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) alertou que a aprovação do texto poderá beneficiar muitos políticos que já foram condenados. Ele disse que a proposta afasta a sociedade do Congresso, pois vai contra a vontade da população.
— É importante dizer isso: não é iniciativa do senador Weverton. Veio da Câmara dos Deputados. É iniciativa originária da filha do ex-deputado Eduardo Cunha, a deputada Dani Cunha. Teve seu pedido de urgência apresentado pelo deputado do PT, Zeca Dirceu, filho de Zé Dirceu, e a tramitação com toda aquela pompa e glória, muito rápida, sempre relâmpago, quase por unanimidade.
O PLP é “flagrantemente inconstitucional” na avaliação do senador Humberto Costa (PT-PE) e tem o objetivo de beneficiar pessoas específicas.
— Já se sabe qual era o objetivo lá atrás de quem apresentou essa proposta: criar as condições para que pessoas condenadas por crimes julgados pela Justiça, em última instância, possam readquirir o direito da elegibilidade.
O senador Sergio Moro (União-PR), por sua vez, ponderou que “a Lei da Ficha Limpa tem pontuais injustiças, e esse projeto corrige várias dessas injustiças”. Ele elogiou a Lei da Ficha Limpa, mas disse que ela tem brechas para ser usada de maneira injusta. Para Moro, o PLP é negativo na parte que pode beneficiar pessoas que foram condenadas por crimes contra a administração pública.
— Eu me refiro, aqui, especificamente, àqueles casos de inelegibilidade não decorrentes de uma condenação criminal, mas, sim, decorrentes de outra espécie de julgamento. Nós temos visto, infelizmente, várias injustiças sendo cometidas. Para ficar em um exemplo, foi cassado o mandato do deputado federal mais votado do Paraná, Deltan Dallagnol, sob um argumento que não convence.
Dizendo-se contrário à flexibilização “da lei mais avançada no ordenamento jurídico constitucional brasileiro”, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) também se posicionou.
— A Lei da Ficha Limpa adveio, primeiro, da vontade popular: é uma das raras leis de iniciativa popular que foram discutidas no Congresso Nacional, aprovadas nas duas Casas, que dialogou com o clamor da sociedade.
Na mesma linha, o senador Fabiano Contarato (PT-ES) se disse contrário à flexibilização da inelegibilidade.
— Quando um político desvia verba da saúde, ele está matando milhões de pessoas; quando um político desvia verba da educação, ele mata o sonho de milhões de jovens. Qual percentual da população carcerária está lá condenada por crimes contra a ordem tributária, contra o sistema financeiro, crimes de sonegação fiscal, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato? As cadeias estão lotadas de pobres, pretos, pardos, porque o Estado criminaliza a pobreza e a cor da pele. E agora nós vamos flexibilizar a Lei da Ficha Limpa, que foi um avanço da população brasileira?
O senador Marcos Rogério (PL-RO) disse que é defensor da Lei da Ficha Limpa, mas acredita que ela pode ser aperfeiçoada pois tem “pontos que são exagerados”.
— A lei foi feita dentro de uma visão e o que se vê hoje é a eternização do impedimento para que alguém participe do pleito eleitoral, às vezes, pessoas que foram condenadas de forma injusta. Mas eu acho que esse não é o momento para a gente discutir esse tema. Nós estamos no meio de uma eleição municipal.
Para o senador Dr. Hiran (PP-RR), o objetivo da proposta é impedir que pessoas fiquem inelegíveis muito além dos oito anos.
— Aqui não se trata de eleger a impunidade de ninguém. Nós estamos aqui para reconhecer que alguém que ficou inelegível por oito anos fique inelegível por oito anos; não por 12, não por 14, não por 18. (...) ao final dos oito anos, vocês sabem quem vai julgar esses políticos eventualmente condenados? Será o povo. É o povo que nos traz para cá e que nos tira daqui.
Entre os que debateram o projeto também estão os senadores Carlos Portinho (PL-RJ), Rodrigo Cunha (Podemos-AL), Otto Alencar (PSD-BA), Jorge Seif (PL-SC), Jaime Bagattoli (PL-RO), Esperidião Amin (PP-SC), Magno Malta (PL-ES), Izalci Lucas (PL-DF), Astronauta Marcos Pontes (PL-SP).
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
MAIS NOTÍCIAS SOBRE: