Impacto ambiental dos protetores solares causa controvérsia em audiência
Da Redação | 05/06/2019, 15h56
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) apresentou à Comissão de Assuntos Sociais (CAS) seu relatório ao PL 616/2019, que proíbe protetores solares de utilizarem 11 substâncias que, segundo pesquisas científicas, seriam tóxicas a recifes de coral e outros componentes da vida marinha. Procurando aprofundar a análise antes da votação, a CAS chamou especialistas para debaterem o projeto nesta quarta-feira (5), o Dia Mundial do Meio Ambiente.
O oceanógrafo Miguel Mies, do Instituto Oceanográfico da USP (Universidade de São Paulo), apresentou pesquisas norte-americanas e de Israel atestando que quatro dos 11 compostos citados no relatório de Zenaide Maia provocam danos severos aos recifes de corais. Quanto aos outros sete, os estudos ainda não seriam conclusivos, mas já há evidências de prejuízos a outros componentes da vida marinha.
O autor do projeto, senador Lasier Martins (Pode-RS), lembrou que os recifes de corais são os ecossistemas mais diversos dos mares por concentrarem, globalmente, a maior densidade de biodiversidade marinha. No Brasil, ocorrem desde o Amapá até o Espírito Santo.
— Uma em cada quatro espécies marinhas vive nestes recifes, incluindo 65% dos peixes. Estima-se que 500 milhões de pessoas que vivem em países em desenvolvimento têm algum tipo de dependência dos serviços ambientais oferecidos por esses ecossistemas. A saúde dos recifes afeta diretamente as pessoas. Além de proteger a biodiversidade, a proibição das substâncias tóxicas nos protetores solares permitirá que os corais continuem contribuindo economicamente com as cidades costeiras brasileiras, pois é um enorme atrativo que movimenta a indústria do turismo — disse Lasier.
O senador ainda citou uma pesquisa recente da ONU, alertando que 14 mil toneladas de protetor solar vão parar nos oceanos a cada ano, e entre 4 a 6 mil toneladas deles se acumulam em recifes de corais. Os cientistas apontam que 30% dos recifes de corais já foram degradados irreversivelmente e que, mantendo-se também o atual ritmo de aquecimento do planeta, 90% destes recifes podem sucumbir até 2050.
— Já é um consenso científico que quatro dos compostos (oxibenzona, metilparabeno, 4MBC e EHMC) provocam impactos diretos de branqueamento e mortalidade nos corais. Causam também infecções virais, danos ao DNA, desregulação endócrina e ossificação. E faço questão de reiterar que existem compostos substitutos. Não é um beco sem saída visando a proteção das pessoas contra a exposição excessiva aos raios solares. Ninguém quer as pessoas com câncer de pele, eu inclusive já perdi parentes com câncer de pele — concluiu Mies.
A importância dos protetores solares
A senadora Zenaide Maia, que também é médica, fez questão de explicitar que "não questiona em nenhum momento" a relevância e a eficácia do uso de protetores solares como estratégia para evitar o câncer de pele. Reiterou que seu foco é tratar da melhor legislação possível visando mitigar o eventual dano ambiental. Este ponto de vista foi apoiado por Lasier Martins.
A médica dermatologista Jade Martins, do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), apresentou três estudos, publicados pela revista Science of the total Environment, que concluíram que "a exposição aos protetores solares não afetam negativamente a população de corais". Como representante da Sociedade Brasileira de Dermatologia no debate, ela mostrou os artigos como uma evidência de que a questão continua a ser pesquisada mundialmente, não sendo no seu entender ainda possível chegar a conclusões definitivas, pois a revista também publicou artigos dando conta de impactos negativos dos protetores solares sobre corais.
Ou seja, para Jade Martins, o Parlamento deve portanto ponderar antes de tomar medidas que podem ter impacto social, ao restringir a oferta de protetores solares à população.
— Trabalho no Hospital das Clínicas, que é quem mais atende pacientes na América Latina, a grande maioria pessoas de baixa renda. Vejo muitos casos de câncer de pele e outras dermatoses, onde seria fundamental o uso do filtro solar, mas os pacientes não têm condições de comprar. Meu medo é que o país adote uma legislação restrita que leve ao aumento do custo e a uma menor oferta de produtos, o que piorará ainda mais a condição das pessoas de baixa renda — alertou.
Karla Brandão, da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), reforçou que estudos da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que 80% dos casos de câncer de pele verificados no mundo poderiam ter sido evitados pelo uso do protetor solar. Ela considera a questão ainda mais relevante para o Brasil, país marcado pela prevalência de altas temperaturas na maior parte do território, e onde registram-se 170 mil casos de câncer de pele por ano.
Legislação equivalente
Karla Brandão também assegurou que a indústria de filtros solares acompanha a evolução da pesquisa científica e atua constantemente visando aperfeiçoar a oferta de produtos. E mencionou que a legislação brasileira não está atrasada se comparada à dos Estados Unidos ou à da União Europeia, que, até o momento, não banem os 11 compostos presentes no projeto analisado pelo Senado. Ponto de vista semelhante foi apresentado por Itamar Falco, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que garantiu que o órgão já estuda o tema tecnicamente.
Ainda participou do debate o geólogo Werner Farkatt, do Instituto de Desenvolvimento Sustentável do Rio Grande do Norte (Idema), para quem a pesquisa já comprova efeitos nocivos dos filtros solares sobre corais e toda a cadeia biótica. Mas por outro lado, ele também entende que "a questão é complexa e merece o maior aprofundamento possível", pois uma legislação restritiva pode ser prejudicial socialmente no que diz respeito ao combate ao câncer de pele.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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