Na CDH, enquanto governo aponta deficit, aposentadoria especial tem defensores

Da Redação | 03/06/2019, 16h51

Hoje, mais da metade dos servidores estaduais têm direito a aposentadorias especiais, num contexto que influencia a formação de deficits crônicos no sistema previdenciário da maioria dos estados. Este foi o quadro apresentado por Benedito Brunca, da secretaria de Previdência do Ministério da Economia, durante audiência realizada nesta segunda-feira (3), na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH).

O senador Eduardo Girão (Pode-CE) destacou que os números apresentados são oficiais, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e chamou a atenção para alguns dos mais importantes estados do país, que nos últimos anos têm atrasado e parcelado os salários de seus servidores ativos e inativos, muitos deles na condição de segurados especiais.

— Hoje 51% dos servidores, contando as 27 unidades da Federação, têm direito a aposentadorias especiais. Curiosamente os quatro estados com maiores deficits previdenciários estão entre os que têm mais servidores nessa condição, que possibilita receber proventos acima da média nacional. No Rio de Janeiro, são 57,7% nessa situação; em Minas Gerais, 59,7%; em São Paulo, 60,4%; e no Rio Grande do Sul, 61,2%. A exceção está virando regra nos estados — alertou Girão.

Situação caótica

Brunca afirmou que o deficit previdenciário de boa parte dos estados e municípios leva a uma situação "caótica" por conta do alto índice de carreiras especiais, que correspondem às carreiras do magistério, das polícias e da área da saúde, todas com regramentos específicos. Ele disse ainda que um dos objetivos da reforma da Previdência (PEC 6/2019) é aliviar essa asfixia fiscal dos estados e municípios, não trazendo mais efeitos às aposentadorias especiais junto ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS).

— O estado do Rio Grande do Norte, uma das muitas unidades que vive um quadro gravíssimo, está com quatro folhas atrasadas. A reforma busca o equilíbrio financeiro e atuarial, possibilitando uma perspectiva de estabilidade. Parte desta perspectiva passará pela adoção do sistema de capitalização — avisou.

Aposentados diferenciados

Já no que tange às aposentadorias especiais como um todo no âmbito do RGPS, Brunca disse que estes beneficiários tem vencimentos melhores.

Hoje a média do que ganham gira em torno de R$ 3.600, contra R$ 2.266 dos que se aposentam por tempo de contribuição, R$ 1.500 dos inválidos e R$ 1.260 dos que se aposentam por idade. Além disso, este grupo específico tem se aposentado a uma idade média de 49 anos de idade, com carreiras específicas marcadas por um contingente significativo se aposentando entre 45 e 54 anos. Dados do governo ainda mostram que entre 2000 e 2018, a expectativa de vida dos aposentados especiais subiu de 67 para 79 anos de idade, fazendo com que neste mesmo período o tempo médio de pagamento dos benefícios subisse de 14 para 28 anos.

Brunca ainda criticou o alto índice de judicialização que tem havido no Brasil, ligado à concessão de aposentadorias especiais.

- A Previdência virou a salvaguarda de tudo que não foi resolvido no âmbito das relações trabalhistas. Não se confrontam as condições de trabalho, não se exige o devido ambiente adequado, não se exige o recolhimento das alíquotas adicionais de 6%, 9% ou 12%. E aí como não há estes elementos, nem laudos caracterizando efetiva exposição a agentes físicos, químicos ou biológicos, vai-se à Justiça e, sem jamais ter havido qualquer contribuição adicional, a conta é mandada para a Previdência arcar com todos os desvios de nosso mercado de trabalho - lamentou Brunca.

Pelas regras atuais, a aposentadoria especial é um benefício concedido ao cidadão que trabalha exposto a agentes nocivos à saúde, como calor ou ruído, de forma contínua e ininterrupta, em níveis de exposição acima dos limites estabelecidos em legislação própria, bem como outros critérios de risco. Por este motivo, possuem um regime diferenciado e podem se aposentar com tempo menor de trabalho e contribuição.

Capacidade humana

O presidente da Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Jorge Darze, chamou de "inaceitável" a proposta de reforma da Previdência ao prever que médicos só teriam acesso à aposentadoria integral após 40 anos de contribuições. Para ele, essas regras, caso aprovadas, provocarão achatamento de renda. Para Darze é "ilógico" condicionar o acesso à aposentadoria de diversas categorias profissionais às idades mínimas estabelecidas na PEC 6/2019, pois as regras hoje vigentes são baseadas em rigorosas pesquisas científicas, atestando o limite da capacidade humana para o exercício ótimo de determinadas atividades. Ao final, seria a sociedade a maior beneficiada pelas regras especiais, ao assegurar garantias a profissões de enorme impacto social.

— A inclusão de todo o período contributivo fará com que o acesso ao benefício seja equivalente a 70% da média. Além disso, a atividade médica vem passando por uma grande precarização, com a imposição de práticas de pejotização, reduzindo o período contributivo.

Nesse sentido, ele alertou que alguns dos estados marcados por deficits previdenciários estão há muitos anos sem contratar servidores, priorizando a terceirização, enquanto Investigações comprovam fraudes nos contratos com cooperativas de cessão de mão de obra.

Críticas à refroma

O representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), José Reginaldo Inácio, teme "conseqüências sociais trágicas" caso o governo aprove a reforma da Previdência com as diretrizes atuais. Ele registrou que o Brasil é marcado pelos mais altos índices de mortes e acidentes de trabalho no mundo, e que as regras mais restritas na concessão de benefícios e pensões poderão criar uma legião de famílias levadas à miséria.

— Entendo que, se a PEC for aprovada como está, as aposentadorias em condições especiais estarão extintas de fato, ainda que não de direito. Condicionar esses benefícios específicos a critérios de contribuição e idade mínima causará uma explosão nas aposentadorias por invalidez, aumento de acidentes, adoecimentos e mortes em ambientes de trabalho. O país é marcado hoje pela superexploração da classe trabalhadora e pela precarização nas relações trabalhistas, haverá uma quantidade imensa de trabalhadores impossibilitada de acessar a aposentadoria na condição especial, e ao mesmo tempo inapta para o trabalho — lamentou Inácio, que apresentou dados oficiais que contabilizam a morte de 983 trabalhadores em serviço em quase 270 mil acidentes de trabalho este ano.

Em nome do Conselho Nacional das Pessoas com Deficiência (Conade), a advogada Ana Claudia Mendes disse temer que, se a reforma prevalecer com as diretrizes atuais, as pessoas deficientes de baixa renda serão especialmente prejudicadas. Ela alertou que o texto cria barreiras no acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), a pensões e outros benefícios, a um grupo social já marcado por dificuldades de inclusão no mercado de trabalho e na vida social, com expectativa de vida reduzida e altos custos na aquisição de equipamentos e com despesas em saúde.

O presidente da CDH, Paulo Paim (PT-RS), garantiu durante a reunião que manterá as articulações para que nenhum artigo da reforma da Previdência torne mais difícil o acesso às aposentadorias em condições especiais.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)