Exame de ordem para médicos divide opiniões em audiência pública
Da Redação | 20/11/2018, 17h43
A aplicação de um exame de ordem para médicos recém-formados, prevista no Projeto de Lei do Senado 165/2017, dividiu opiniões entre membros de instituições representativas que participaram de um debate na Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE), nesta terça-feira (20).
De autoria do senador Pedro Chaves (PSC-MS), o projeto pretende instituir a realização de uma prova de proficiência, assim como ocorre com os bacharéis em direito, que só podem advogar depois de aprovados no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
O consultor jurídico do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular, Daniel Cavalcante da Silva, disse que a entidade está preocupada com a proposta, especialmente após o anúncio da saída dos médicos cubanos do programa Mais Médicos. De acordo com Daniel, existem falhas no PLS 165/2017, “a começar pela justifica sem argumentos sólidos e sem refletir a realidade”.
— Existe uma grande carência no interior e, portanto, não existe essa proliferação indiscriminada [de escolas de medicina] citada no projeto — explicou.
Daniel Cavalcante ressaltou que não existem pedidos de autorização para cursos de medicina desde 2013. Segundo ele, o Ministério da Educação e o Ministério da Saúde têm feito chamamento público em municípios estratégicos, a fim de interiorizar os cursos de medicina, já que os médicos não têm interesse de atuar nessas regiões.
O consultor também não concorda com a afirmação de que os alunos de medicina são mal avaliados. A criação do exame, a seu ver, não tem o objetivo de aferir a qualidade do curso, mas o de criar a chamada reserva de mercado.
— As regras propostas colidem com as normas regulatórias do ensino superior. Se esse projeto, de fato, for aprovado, será objeto de discussão junto ao Supremo Tribunal Federal, porque não compete ao Conselho de Medicina dizer qual instituição é boa ou qual é má — contestou.
Penalização do estudante
A diretora executiva da Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), Hermila Tavares Vila Guedes, apontou que a avaliação da formação médica não é medida simples e considerou a denominação “exame de ordem”, sugerida no projeto, inadequada. Segundo ela, se trata de um teste de suficiência para obtenção do diploma médico, não garantindo a qualidade da formação.
— O caráter do exame de ordem penaliza o estudante. E não é o estudante que deve pagar pela má formação que teve. Deve-se focar essa avaliação no discente, questionando-se o funcionamento e a efetividade dos processos avaliativos dos cursos — observou.
Hermila defendeu que, ao invés de hospitais-escolas, as unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) sejam utilizadas como campos de prática em todas as áreas. Para ela, também é preciso rever a portaria dos contratos organizativos da prestação de serviços e parcerias ensino-saúde (Coapes), como forma de regulamentar a oferta desses campos de prática para todas as escolas.
— Todo hospital que se propõe a ser unidade de ensino pode ser regulado por meio dos Coapes e a gente precisa lembrar disso e dos aspectos ligados à gestão dos cursos, aperfeiçoando essa qualificação — ponderou.
Já o coordenador geral da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (Denem), Gustavo di Lorenzo Villas Boas, disse que é preciso entender o papel da formação médica, a função da avaliação e os critérios desse julgamento. Para ele, a aplicação do exame de ordem aborda somente aspectos cognitivos do estudante de acordo com o conteúdo aplicado, mas ignora outros pontos importantes da formação profissional.
— Quando se escolhe avaliar o estudante como a ponta do ensino, se está deixando de avaliar outras partes do processo: o que faz o estudante, o que faz o profissional e o que faz a formação médica — analisou.
Posições favoráveis
Favorável à aplicação do exame, o presidente da Associação Nacional dos Médicos Residentes (ANMR), Juracy Barbosa, lembrou que a discussão é saudável, por trazer reflexões em benefício de 91% da população que receberá esses novos médicos. Juracy, lembrou que o Brasil tem 328 escolas de medicina, ficando atrás apenas da Índia, que tem 460. Disse ainda que há unanimidade entre as entidades médicas sobre a importância e a necessidade do teste.
— De 2013 para cá, nós tivemos um aumento estratosférico, de tal maneira que perdemos o controle na formação dessas pessoas. Escolas sem hospitais, formação de médicos que nunca entraram em uma unidade de saúde e sem a devida tutoria, sem professores qualificados — considerou Juracy.
O coordenador da Comissão de Ensino Médico do Conselho Federal de Medicina (CFM), Lúcio Flávio Gonzaga Silva, declarou que o órgão também apoia integralmente a proposta e as emendas apresentadas pelo relator da matéria, o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO). Lúcio Flávio acredita que uma avaliação seriada, no quarto e sexto anos, a fim de analisar competências e atitudes, será mais eficaz do que uma prova teórica ao final do curso, aumentando a qualidade da formação dos médicos brasileiros e a assistência aos cidadãos.
— Uma avaliação formativa que acompanhe a formação do aluno no meio do seu curso, cujos resultados obrigarão a escola a melhorar seu projeto pedagógico na área ou nas áreas em que esse aluno não se sair bem — afirmou.
O projeto também recebeu apoio do Centro da Associação Médica Brasileira (AMB). Segundo o vice-presidente da entidade, José Luiz Dantas Mestrinho, a preocupação é com o aumento da quantidade ao invés da qualidade dos cursos e dos serviços oferecidos à população.
Senso comum
Uma das autoras do requerimento da audiência, a senadora Ana Amélia (PP-RS) ressaltou que é preciso avaliar e discutir o aprimoramento da qualidade de todos os serviços prestados à população. Para a parlamentar, o debate sobre o PLS 165/2017 é fundamental, porque diz respeito à vida e ao tratamento adequado que deve ser dado às pessoas.
— O importante é a gente encontrar um senso comum ou um senso médio de absorção pela sociedade, para que ela seja bem atendida e para que as escolas prestem uma educação de qualidade, onde os alunos exercitem essa profissão com a relevância social que ela tem — destacou a senadora.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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