Custo bancário e inadimplência encarecem crédito, diz presidente da Febraban

Paulo Sérgio Vasco | 03/05/2017, 20h03

O custo bancário é quatro vezes maior no Brasil do que na maioria dos países de economia relevante, e a inadimplência ainda compromete a expansão do crédito a pessoas físicas e jurídicas, disse nesta quarta-feira (3) o presidente da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Murilo Portugal, em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) sobre spreads bancários – taxa adicional de risco cobrada no mercado financeiro.

- Vinte e três por cento é lucro dos bancos, 77% são custos da inadimplência, administrativos, tributários e regulatórios – afirmou Murilo Portugal.

A inadimplência, de acordo com a Febraban, ainda é o principal fator de encarecimento na concessão de empréstimos bancários, seguida dos custos administrativos, operacionais, tributários, impostos, compulsórios e encargos fiscais que compõem o spread - de 4,4% do total de ativos de crédito, no Brasil, contra 1,1% em outros países.

- Os custos da inadimplência são elevados porque o Judiciário demora bastante a decidir, e existe certo viés na legislação e na jurisprudência em favor do devedor inadimplente, mesmo para créditos com garantia. Apenas 16% dos créditos garantidos são recuperados no Brasil. A média de outros países na recuperação de crédito de insolvência é de 69%. Além disso, o tempo médio no Brasil são quatro anos na recuperação de crédito, nos outros países é de um ano e oito meses – afirmou.

Outro fator importante que eleva o custo da inadimplência é o “descasamento” que existe entre as regras do Banco Central e as regras da legislação tributária no Brasil, um dos poucos países do mundo com tributação indireta sobre a intermediação financeira, o que pode gerar um custo adicional de 8% nos empréstimos a pessoas físicas, disse o presidente da Febraban.

Murilo Portugal afirmou ainda que os lucros bancários no Brasil “não são assim tão sensacionais”, quando comparados com a taxa de lucros das mil empresas mais rentáveis do país em 2015. Na lista, os bancos aparecem em sexto lugar, com 14,5% de retorno sobre patrimônio líquido, já incluídos os ganhos no ramo de previdência e seguros.

- Desde 2005 até 2015, os bancos flutuaram entre o quinto e o 15º lugar em termos de rentabilidade. Os dados colocam um pouco de dúvida de que a principal causa do spread elevado no Brasil é a concentração bancária e a falta de competitividade. É verdade que a concentração é alta na indústria bancária no mundo todo, mas não é mais concentrada no Brasil, onde ela é média, abaixo do Canadá, Japão, Reino Unido, França e Espanha – afirmou.

Murilo Portugal ressaltou que tanto a Febraban como os bancos associados compartilham com o objetivo de reduzir os spreads bancários, e observou que há consenso de que tanto as taxas de juros como os spreads são elevados no Brasil.

- Mas temos que ter um diagnóstico: Por que são elevados aqui? Por que os bancos estatais praticam o mesmo spread dos bancos privados? Por que os bancos estrangeiros praticam aqui spread mais elevados do que em outros países? Por que os bancos estrangeiros resolveram deixar o varejo e não conseguiram praticar aqui o custo mais baixo do que em outros países? A resposta para todas essas perguntas é que os custos da intermediação financeira no Brasil são mais elevados que a média praticada em países mais relevantes – afirmou.

Para redução do spread e dos custos administrativos, o presidente da Febraban sugeriu a adoção de contratos por meios eletrônicos remotos, a melhora no marco legal do empréstimo consignado privado, o aperfeiçoamento da Lei de Falências e a inclusão de duplicatas em registro eletrônico de ativos, entre outras medidas.

- Os bancos brasileiros são sólidos, bem provisionados e estão preparados para ampliar o financiamento à economia, na medida em que a demanda por crédito aumente, sempre com base em análise prudente de risco, que tem servido aos bancos e ao país – afirmou.

Expansão do crédito

Chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Tulio Maciel apontou a expansão do mercado de crédito nos últimos anos, que representava 25% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2001, e alcançou 50%, em 2016. No crédito imobiliário, o salto foi de 3% para 10%, no mesmo período.

- Com a expansão do credito estamos ampliando o perfil de tomadores de empréstimo, significa lidar com perfis diferenciados e com riscos variáveis. O risco está implícito em todos os contratos de certa maneira. Custos mais baixos implicam taxas mais elevadas nas outras modalidades, há um subsidio implícito nessas operações, que fica por conta dos bons pagadores – afirmou.

Maciel destacou avanços na redução da taxa de juros real – de 25% ao ano, no final dos anos 90, e hoje em torno de 4,5%. A redução, afirmou, contribuiu também para a expansão da oferta de crédito.

- A tendência clara é de recuo, e ações contribuíram para isso, como a Lei de Falências, a alienação fiduciária, o registro de gravames, o cadastro positivo, a portabilidade e outras medidas no campo da educação financeira, isso tudo serviu para reduzir a taxa de juros em termos reais – afirmou.

Representante da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Pinheiro Castelo Branco lembrou que o Brasil tem a maior taxa de juros do mundo, que alcança 32%, em um conjunto heterogêneo de operações no sistema financeiro.

- O spread bancário corresponde a 24% contra 6,2% da média mundial. Alguma coisa é diferente no Brasil. Setenta e quatro por cento do empréstimo é do spread. Nosso ponto é muito fora da curva. O custo tributário está presente até indiretamente, quando trabalhamos com custo associado das operações financeiras. O custo administrativo é menos de dez por cento. O grosso está na inadimplência. O custo final fica com os devedores, ele é socializado – afirmou.

Desenvolvimento

Professor do Instituto Brasileiro do Mercado de Capitais (Ibmec), Christiano Arrigoni Coelho ressaltou que o maior acesso ao crédito é um dos fatores mais importantes para o desenvolvimento econômico de qualquer país;

- O spread bancário, se é alto hoje, era absurdo na época do Plano Real. Passou de mais de cem por cento ao ano para 60% no final dos anos 90. A partir do ano 2000, houve redução continuada e a estabilidade macroeconômica. O spread não fica imune ao ciclo econômico recessivo de hoje, em 42% ao ano para operações de custo livre – afirmou.

Representante da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), Everton Correia defendeu a criação de uma linha de crédito que facilite a competitividade das microempresas, além de inovações na atividade bancária que favoreçam o acesso ao crédito.

Na avaliação do senador Armando Monteiro (PTB-PE), o Brasil não vai construir uma economia dinâmica se não mudar o padrão de financiamento da economia.

- O tema financiamento é algo fundamental para moldar a economia do futuro e garantir dinamismo na economia brasileira. Os spreads constituem algo muito desafiador. Os avanços institucionais não se traduziram em mudança significativa do padrão atual, há rigidez muito grande, com flutuações. No fundo, diminui-se a oferta de crédito pelo nível de recolhimento de compulsório, muito acima do normal – afirmou.

O senador José Serra (PSDB-SP), por sua vez, destacou que o spread no Brasil é cinco vezes maior que no Chile, seis vezes maior que na Argentina e sete vezes maior que na Austrália.

- A concentração é impressionante. Cinco bancos detêm 91% do mercado. Nos Estados Unidos, 48%. Não é possível que isso não tenha implicação sobre os custos. Tem que ter. Essa concentração nos leva a pensar no que fazer para estimular a entrada de capital financeiro de investimento externo na área bancária – afirmou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)